quinta-feira, 20 de junho de 2019

O inestimável dom de uma Presença de amor

Nesta quinta-feira celebramos Corpus Christi. Eis alguns pensamentos, inspirados em textos do Magistério eclesial, para nos preparar para a Solenidade do Corpo do Senhor.
A presença do Cristo Jesus no sacramento da Eucaristia foi querida por Ele próprio para permanecer junto do homem e oferecer-Se como seu alimento, seu companheiro, seu sustento e também para manter-Se no seio da Igreja. No mistério admirável da Presença eucarística, cumpre-se a promessa do Senhor: “Eu estou convosco todos os dias até o fim dos tempos!” (Mt 28,20) A resposta do homem a tão grande dom é a fé na presença real e substancial do Senhor nas espécies eucarísticas.

De todas as dimensões da Eucaristia, aquela que é central e põe à prova a nossa fé é o mistério da presença real do Senhor nas espécies consagradas.
Com toda a tradição da Igreja, acreditamos que, sob o pão e o vinho, está realmente presente Jesus, nosso Senhor e Deus. Essa presença chama-se “real”, não por exclusão, como se as outras formas de presença não fossem reais, mas por antonomásia, por excelência, já que por ela se torna substancialmente presente Cristo completo na realidade do Seu Corpo e do Seu Sangue. Por isso, a fé pede-nos para estar diante da Eucaristia com a consciência de estar na presença do próprio Cristo presente de modo tão real quanto está nos Céus, no seio da Santa, Indivisa e Consubstancial Trindade.
Esta presença do Senhor possui um significado que ultrapassa, e muito, o de puro simbolismo. A Eucaristia é mistério de presença, mediante o qual se realiza de modo excelso e surpreendente a promessa que Jesus fez de ficar conosco. É necessário, portanto, evitar aquelas afirmações que se fazem contrárias à transubstanciação e à presença real, entendendo-as num sentido apenas simbólico, bem como comportamentos e atitudes concretas que revelem implicitamente essa convicção errônea. Por vezes tem-se a impressão que, na liturgia, alguns, sobretudo sacerdotes, se comportam como animadores, mais preocupados em chamar a atenção do público para a sua pessoa, do que ser servos de Cristo, chamados a levar os fieis à união com o Senhor. Tudo isto obviamente tem reflexos negativos no Povo de Deus, que corre assim o risco de ficar confuso na compreensão e na fé da presença real de Cristo no Sacramento.

Na Tradição da Igreja criou-se uma verdadeira e própria linguagem dos gestos litúrgicos, orientada a exprimir retamente a fé na presença real de Cristo na Eucaristia, tais como a cuidadosa purificação dos vasos sagrados depois da comunhão ou quando caem no chão as Espécies eucarísticas, a genuflexão diante do sacrário, o uso da bandeja na distribuição da comunhão, a substituição regular das hóstias conservadas no sacrário, a colocação da chave do sacrário em lugar seguro, a postura respeitosa e o recolhimento do celebrante em consonância com o caráter transcendente e divino do Sacramento. Omitir ou descurar tais sinais sagrados, que contêm e indicam um significado mais profundo e vasto que o seu aspecto exterior, esvaziaria o sentido sagrado da Eucaristia e a consciência profunda que a Igreja sempre teve da presença real do Cristo no Sacramento do altar.

Em todos os sacramentos, Jesus Cristo atua através de sinais sensíveis que, sem mudarem de natureza, adquirem uma capacidade transitória de santificação. Na Eucaristia, contudo, Ele está presente com o Seu Corpo e Sangue, Alma e Divindade, dando ao homem toda a Sua Pessoa e a Sua Vida.
No Antigo Testamento, o Senhor Deus, através dos Seus enviados, indicava a Sua presença na nuvem (shekhinà), no tabernáculo, no Templo. Com o Novo Testamento, na plenitude do tempo, veio habitar entre os homens no Verbo feito carne (cf. Jo 1,14), tornando-Se realmente Emanuel (cf. Mt 1,23); falou por meio do Filho, Seu herdeiro (cf. Hb 1,1-2). São Paulo, para fazer compreender o que acontece na comunhão da Eucaristia, afirma: “Aquele que se une ao Senhor constitui com Ele um só espírito” (1Cor 6,17), numa nova Vida que promana do Espírito Santo. Diz São João Crisóstomo: “Quando estás para abeirar-te da sagrada Mesa, acredita que nela está presente o Senhor de todos”. Por isso, a adoração é inseparável da Comunhão.
Desde as origens, a Igreja repete solenemente os gestos do Senhor, decompondo-os para meditá-los um a um, como a procurar aprofundar, num esforço constante e renovado, o significado dos mesmos: a apresentação dos dons, a consagração, a fração e a distribuição da Comunhão. Por isso, as palavras ‘Tomai e comei’ não incluem o gesto simultâneo da fração da hóstia; nesse caso, deveria seguir de imediato a comunhão. Invés, nesse momento altamente místico, a Liturgia convida o celebrante a inclinar-se e a proferir as palavras com voz clara, mas não alta, para se favorecer a contemplação, como faz o Bispo na Quinta-Feira Santa, quando sopra sobre o crisma. O celebrante “nas suas atitudes como na forma de proferir as palavras divinas, procurará sugerir aos fieis a presença viva de Cristo”. Nesse momento, de fato, realiza-se o Sacrifício sacramental.

Nos primeiros séculos, antes da consagração dirigia-se ao Pai uma invocação, acompanhada do gesto das mãos estendidas (epíclesi), pedindo o envio do Espírito Santo para santificar e transformar o pão e o vinho no Corpo e Sangue do Senhor. O fundamento dessa oração encontra-se nas palavras que o Senhor proferiu após a instituição do mistério: “Quando vier o Paráclito, Ele dará testemunho de Mim e vos recordará tudo o que Eu vos disse. Ele Me glorificará” (Jo 15,26; 14,26; 16,14). Os grandes doutores cristãos da antiguidade acharam por bem unir a invocação do Espírito às palavras da instituição, para que o sinal sacramental se realizasse. As palavras do Senhor são, de fato, Espírito e vida (cf. Jo 6,63). Cristo atua juntamente com o Espírito Santo, mas mantém-Se o único que consagra a Eucaristia e concede o mesmo Espírito. Como observa Santo Ambrósio: “que dizer da bênção dada pelo próprio Deus, em que operam as mesmas palavras do Senhor e Salvador? Sendo este sacramento que recebes realizado com a palavra de Cristo não poderá a palavra de Cristo, que pôde criar do nada o que não existia, mudar as coisas que são naquilo que não eram? Certamente não é menos difícil dar às coisas uma existência do que mudá-las noutras. É o mesmo Senhor Jesus que diz: ‘Isto é o Meu Corpo’. Antes da bênção das celestiais palavras, a palavra designava um determinado elemento; depois da consagração, passa a designar o Corpo e o Sangue de Cristo. É Ele mesmo que o chama Seu Sangue. Antes da consagração, tem um outro nome; depois da consagração, chama-se Sangue. E tu dizes: ‘Amém’, ou seja, ‘Assim é’”.

Dos documentos antigos da Igreja aprendemos que a Comunhão não se toma, mas se recebe, como símbolo do que ela significa, ou seja, Dom recebido em atitude de adoração. Recomenda-se, pois, uma verdadeira devoção ao aproximar-se da Comunhão. São Francisco de Assis ardia “de amor em todas as fibras do seu ser pelo sacramento do Corpo do Senhor, cheio de incomensurável maravilha perante tão benévola bondade e generosíssima caridade. Comungava com tanta devoção a ponto de tornar devotos também os outros”. E Cabasilas, místico oriental, convida a ter presente que, “ao comungar uma carne e um sangue humano, recebemos na alma Deus: corpo de Deus, não menos que de homem; sangue e alma de Deus, mente e vontade de Deus, não menos que de homem”. A realidade do Corpo de Cristo é a Sua Pessoa e a Sua Vida, mistério e verdade salvífica, que se devem abraçar com a fé e a razão.


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