Continuemos contemplando a solene da Ascensão do Senhor. No Credo professamos: “Subiu aos Céus; está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso, donde há de vir a julgar os vivos e os mortos e o Seu Reino não terá fim”. Que significa este mistério da nossa fé?
Primeiramente, é muito importante observar que a Ascensão é celebrada no Tempo da Páscoa, aquele período que, no dizer de São Jerônimo, é todo ele como se fosse o dia da Páscoa. Então, a Ascensão é aspecto integrante do mistério pascal, é uma das facetas da Páscoa do Senhor.
Mas, o que significa afirmar que o Senhor Jesus subiu aos Céus e está sentado à direita do Pai?
Ele não somente ressuscitou, mas, por Sua Cruz e Ressurreição, foi glorificado e, na Sua natureza humana, foi totalmente divinizado e constituído Senhor do Céu e da terra, Senhor de todas as coisas: “Deus O constituiu Senhor e Cristo, este Jesus a Quem vós crucificastes” (At 2,36).
Afirmar que Jesus Cristo está na Glória do Pai – “Céus”, no plural, significa o próprio Deus, a intimidade do Deus Triuno: é aí que Se encontra agora o homem Jesus ressuscitado – é afirmar que Ele é Senhor de todo o universo, de toda a criação, da história humana e de nossas vidas. Ele, porque Se fez homem, porque entrou no nosso mundo, porque entrou na história humana é, agora, glorificado, Cabeça e Juiz do nosso mundo e da nossa história. A Ascensão é a verdadeira festa de Cristo Rei!
Há um belíssimo texto em Ap 4,1 – 5,10 que exprime de modo impressionante tudo isso. Vejamos alguns pontos dele:
“Depois disso, tive uma visão: havia uma porta aberta no Céu” (4,1). Depois da Morte e Ressurreição do Cristo há, no Céu, uma porta aberta e o homem pode agora contemplar, na fé, o mistério do desígnio de Deus: Cristo nos abriu o caminho, Ele mesmo é o Caminho para a Casa do Pai.
“Havia um trono no Céu, e no trono, Alguém sentado...” (4,2). Trata-se do Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. O mundo - por mais maluco que pareça -, a nossa vida - por mais conflituosa que seja -, não caminham sem rumo: há Alguém no trono, há Alguém que tudo dirige e tudo conduz com sabedoria e suavidade: há um Deus no Céu!
“Diante do trono ardiam sete lâmpadas de fogo: são os sete Espíritos de Deus” (4,5). Os sete Espíritos são o Espírito Santo; sete significa riqueza, plenitude, perfeição. Lâmpadas de fogo, fogo que ilumina, purifica e transfigura – eis a ação do Espírito Santo! Ele ilumina o nosso mundo, revelando e sustentando o bem e trazendo às claras o mal e o pecado, que serão queimados e destruídos.
“Vi depois, na mão direita Daquele que estava sentado no trono, um livro escrito por dentro e por fora e selado com sete selos” (5,1). Este livro selado contém o sentido da história humana e da nossa história pessoal: nossa vida está nas mãos de Deus.
“Vi, então, um Anjo poderoso, proclamando em alta voz: ‘Quem é digno de abrir o livro, rompendo seus selos?’ Mas ninguém no Céu, nem na terra ou sob a terra era capaz de abrir nem de ler o livro” (5,2-4). São palavras impressionantes. Neste mundo, enquanto durar nossa história, há tantas sombras: injustiças, mortes, opressões, infidelidades... Qual o sentido de tudo isso? Qual o sentido da vida? Qual o sentido de história humana e da nossa história? Amor, ódio, vida, morte, alegria, miséria, tristeza, projetos: para onde vai tudo isso? Que é o homem? Qual o seu destino? Ninguém é capaz de desvendar cabalmente o mistério da existência... Quantas vezes somente podemos sentir o gosto amargo de perguntar pela dor do mundo e da vida sem encontrar a resposta...
“Eu chorava muito, porque ninguém foi considerado digno de abrir nem de ler o livro. Um dos Anciãos, porém, consolou-me: ‘Não chores! Eis que o Leão da tribo de Judá, o Rebento de Davi, venceu para poder abrir o livro e seus sete selos’” (5,4-5). Aqui, Cristo é apresentado: Ele é o Leão de Judá, o Rebento de Davi (leão forte, frágil como um rebento, manso como um cordeiro!), que venceu o pecado e a morte e pode dar sentido à história humana, com suas lágrimas e alegrias.
“Vi um Cordeiro de pé, como que imolado. Tinha sete chifres e sete olhos, que são os sete Espíritos de Deus... Ele veio então receber o livro da mão direita Daquele que está sentado no trono” (5,6-7). A imagem é fantástica: o Cordeiro está imolado, foi imolado por nós, permanece num estado de contínua imolação; mas, ao mesmo tempo, de modo paradoxal, está de pé; é Vencedor, é Aquele que triunfou sobre o pecado e a morte! Seus sete chifres representam a plenitude do poder e da força e os sete olhos representam a plenitude do Espírito, que tudo perscruta e julga todas as coisas. Ele recebe do Deus que está sentado no trono o poder de discernir a história humana, de julgar todas as coisas.
“Digno és Tu de receber o livro e de abrir seus selos, pois foste imolado e, por Teu sangue, resgataste para Deus homens de toda tribo, língua, povo e nação” (5,9). Eis o motivo pelo qual Ele é digno de nos julgar: porque Se comprometeu conosco, conosco conviveu, experimentando a dureza de nossa existência e por nós morreu, amando-nos até o fim. Ele pode nos julgar: conhece-nos e ama-nos; Seu juízo é juízo de amor – só quem ama conhece de verdade e julga em profundidade!
A Ascensão do Senhor coloca-nos diante dessa maravilhosa realidade! Quando olhamos em torno a nós um mundo secularizado, descrente e incerto entre o cinismo e o desespero, quando vemos a situação da Igreja e suas tribulações internas e externas, sentimo-nos, às vezes, confusos e até desanimados na fé. Não temamos: nossa existência caminha para o Cristo, nosso mundo caminha para o Cristo; Ele, imolado por nós, é Aquele que tem em Suas mãos a nossa vida! A Ele, a Igreja se confia, Nele espera e Nele deposita a esperança de sua vida. A todos os Seus discípulos e a cada um de nós, Ele diz: “No mundo tereis tribulações, mas tende coragem: Eu venci o mundo!” (Jo 16,33)
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