sábado, 27 de outubro de 2018

Homilia para o XXX Domingo Comum - ano b

Jr 31,7-9
Sl 125
Hb 5,1-6
Mc 10,46-52

Comecemos nossa meditação da Palavra de Deus com a primeira leitura. Muitas vezes, na sua história, o Povo de Deus experimentou a escravidão, o exílio e a opressão. Muitas vezes, Israel experimentou-se como um nada e viu-se numa escuridão tremenda. Parecia que o povo iria acabar-se! Assim, por exemplo, em 721 aC, quando os assírios varreram do mapa o Reino do Norte, o Reino de Israel e, em 597 e 586 aC, quando os israelitas do Reino de Judá foram levados para o exílio em Babilônia. É quase um escândalo, mas é verdade: a história do Povo de Deus é uma história de dor e de angústia!
Pois bem, é no meio de tal angústia e escuridão que o Profeta fala hoje e diz palavras de esperança, de ânimo e de alegria: “Exultai de alegria, aclamai a primeira entre as nações! Eis que os trarei do país do Norte e os reunirei desde as extremidades da terra”. No meio da desgraça, Deus consola o Seu Povo: irá salvá-lo, reuni-lo, fazê-lo reviver.
Mas, quem é esse Povo? No que se tornou? Quem somos nós, Povo de Deus? “Entre eles há cegos e aleijados, mulheres grávidas e parturientes. Eles chegarão entre lágrimas e Eu os receberei entre preces, Eu os conduzirei por torrentes d’água por um caminho reto onde não tropeçarão... Tornei-Me um pai para Israel e Efraim é o Meu primogênito”.
O Israel que vai experimentar a salvação de Deus é um povo pobre, capenga, humilde, um povo que não conta nada aos olhos do mundo! Como não recordar as palavras de São Paulo aos coríntios? “Vede quem sois, irmãos, vós que recebestes o chamado de Deus; não há entre vós muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de família prestigiosa. Mas o que é loucura no mundo, Deus o escolheu para confundir os sábios; e, o que é fraqueza no mundo, Deus o escolheu para confundir o que é forte; e o que no mundo é vil e desprezado, o que não é, Deus escolheu para reduzir a nada o que é” (1Cor 1,26-28).

Quando pensamos na nossa civilização atual, nos nossos valores, exaltando a eficiência, a riqueza, o conforto, o bem-estar, o vigor e forma física, a saúde, o que é grande e faz sucesso... Como os critérios de Deus são diferentes! Israel é imagem da Igreja e é imagem de cada um de nós, membro do Povo de Deus da nova Aliança. À medida que descobrirmos nossas pobrezas pessoais e eclesiais, podemos também ter certeza que o Senhor não nos abandona: Ele nos chama, Ele nos reúne, Ele nos salva: “Entre eles há cegos e aleijados, mulheres grávidas e parturientes”, gente fraca, gente sem força, gente incapaz de se defender, gente tida como nada, como tola, como fraca... Mas, Deus é nossa defesa: defesa da Igreja, defesa de cada um de nós! Se caminharmos, muitas vezes, chorando, semeando com lágrimas o caminho de nosso seguimento de Cristo, haveremos de voltar cantando, na força e na graça do Senhor: “Mudai a nossa sorte, ó Senhor, como torrentes no deserto. Os que lançam as sementes entre lágrimas, ceifarão com alegria. Chorando de tristeza sairão, espalhando suas sementes; cantando de alegria voltarão, carregando os seus feixes”. Somente pode experimentar isso aqueles que sabem e experimentam que são pobres diante de Deus, aqueles que sentem sua própria fraqueza! Esta é a experiência que o cristão deve fazer sempre na sua vida, seja pessoalmente, seja como Igreja! Somos pobres, mas Deus é nossa riqueza; somos fracos, mas Deus é nossa força!

Agora podemos deter-nos no Evangelho de hoje, que mostra de modo maravilhoso essa experiência cristã de ser salvo por Deus em Jesus Cristo. Jesus está saindo de Jericó, já está perto de Jerusalém, onde morrerá. Uma multidão o acompanha: barulho, empurra-empurra, aglomeração, aperreio... À beira do caminho, havia um cego mendigo... Ele era ninguém, nem nome tinha... Marcos só diz que era o “bar-Timeu”, o filho de Timeu... Cego, incapaz de caminhar sozinho, esmolando, sentado à margem do caminho de Jericó e da vida. Este cego é a humanidade; este cego é cada um de nós! Mas, ele ouve o rumor, a confusão no caminho e quando ouviu dizer que Jesus estava passando, não perde tempo; é a chance de sua vida! Ele grita alto: “Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!” Repreendem o cego, mas ele grita com voz mais forte! Ele sabe que é a chance da sua vida. Santo Agostinho dizia: “Eu temo o Cristo que passa”... É preciso não perder a chance, é preciso gritar... não deixar o Cristo passar em vão no caminho da nossa existência!

O grito do cego é já um grito de fé. Chamando Jesus “filho de Davi”, o Bartimeu está dizendo que crê que Jesus é o messias: “Filho de Davi, tem piedade de mim!” Repreendem o cego, como o mundo quer nos repreender, quer nos impedir e ridicularizar quando nos reconhecemos cegos, pobres e coxos e gritamos por Jesus: “Filho de Davi, tem piedade de mim!” Mas o cego insiste; grita mais alto ainda! Então, apesar da distância, apesar da multidão, apesar do empurra-empurra, Jesus escuta o clamor do cego! Como não recordar, comovidos, as palavras do salmo 129? “Das profundezas eu clamo a Vós, Senhor; escutai a minha súplica!” Ninguém grita pelo Senhor do fundo da sua miséria e fica sem ser ouvido! “Então, Jesus parou e disse: ‘Chamai-o’. O cego jogou o manto, deu um pulo e foi até Jesus”.Cego esperto, esse: não perde tempo, dá um pulo, deixa tudo, desembaraça-se do manto e corre para Jesus! Ele segue o conselho do Autor da Carta aos Hebreus: “Também nós, rejeitando todo fardo e o pecado que nos envolve, corramos com perseverança para a corrida que nos é proposta, com os olhos fixos Naquele que é o Autor e Realizador da fé, Jesus” (12,1s). Quem dera, fizéssemos assim também: largássemos tudo, deixássemos nossas tralhas e bagulhos, nossos apegos e quinquilharias e corrêssemos para Jesus!

E Jesus? Que delicadeza! Não vai logo curando, como esses curadores de televisão, os falsos profetas dos meios de comunicação! O Senhor deseja encontrar as pessoas, ouvi-las, com todo respeito: “O que queres que Eu te faça?”O pedido do cego é comovente; é o nosso pedido: “’Mestre, que eu veja!’ Jesus disse: ‘Vai, a tua fé te curou’”. Este deve ser o nosso pedido, mas, para isso é necessário ter a humildade de se reconhecer cego, pobre, necessitado! “Senhor, eu sou o cego do caminho! Cura-me, eu Te quero ver!”

O cego foi curado “e seguia Jesus pelo caminho”. Curado, iluminado por Jesus, agora seguia Jesus como discípulo, caminhando com Ele para Jerusalém, para com Ele morrer e com Ele ressuscitar. Esta é a nossa vocação, este deve ser o nosso itinerário, a nossa experiência de fé!

“Senhor, Tua Igreja, peregrina no mundo, é um povo de pobres, de frágeis seres humanos. Mas confiamos em Ti! Não queremos colocar nossas força ou esperança no nosso prestígio, ou nas riquezas ou nos amigos poderosos o nos elogios e aplausos do mundo. Não!
Tu somente és nossa força! Salva-nos, Senhor! Reúne-nos, Senhor! Ilumina-nos, Senhor! Dá-nos a graça de reconhecer que somente na Tua Luz poderemos ver a luz! O mundo chama luz, sabedoria e esperteza a coisas que são inaceitáveis aos Teus olhos! Senhor, abre nossos olhos para caminharmos na Tua Luz até a Cruz, até a Ressurreição, até a Vida. Senhor, arranca-nos da nossa cegueira; as trevas, atualmente, são tão densas. Amém”.


sábado, 20 de outubro de 2018

Homilia para o XXIX Domingo Comum - ano b

Is 53,10-11
Sl 32
Hb 4,14-16
Mc 10,35-45

Comecemos observando o Evangelho.
Notemos como os dois irmãos, Tiago e João, se dirigem a Jesus: “Queremos que faças o que vamos pedir”.I sto não é modo de pedir nada ao Senhor, isto não é modo de rezar! Aqui não há humildade, não há abertura para procurar a vontade do Senhor a nosso respeito, mas somente o interesse cego de realizar nossa vontade! Quanta loucura e presunção! Muitas vezes, é assim também que rezamos, com esse tom, com essa atitude!

Recordemos a palavra do Apóstolo: “Não sabemos o que pedir como convém” (Rm 8,26). Somos tão frágeis, tão incapazes de compreender os desígnios de Deus, que nossos pedidos muitas e muitas vezes não são segundo o coração do Senhor e, portanto, não são para o nosso bem! 
Como, então, pedir de acordo com a vontade do Senhor? Escutemos ainda São Paulo: “O Espírito socorre a nossa fraqueza. O próprio Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis” (Rm 8,26). Eis! É somente quando nos deixamos guiar pelo Santo Espírito do Cristo, que compreendemos as coisas de Deus e pediremos segundo Deus! Nunca compreenderá o desígnio de Deus, quem não pede segundo Deus e nunca pedirá segundo Deus, quem não se deixa guiar pelo Espírito de Deus! Aqueles dois não pediam segundo Deus, não suplicavam segundo o Reino, mas segundo seus interesses: queriam glória, queriam honra, queriam os primeiros lugares, queriam seus interesses, de acordo com sua lógica e modo de pensar!

A resposta de Jesus demonstra o Seu desgosto: “Vós não sabeis o que pedis!” E o Senhor completa com um desafio – que é para os dois irmãos e para todos nós, caros irmãos e irmãs: “Podeis beber o cálice que Eu vou beber? Podeis ser batizados com o batismo com que vou ser batizado?”
De que cálice, de que batismoJesus está falando? Do Seu sofrimento, do Seu caminho de dor e humilhação, pelo qual Ele entrará no Reino e o Reino virá a nós: “O Senhor quis macerá-Lo com sofrimentos. Oferecendo Sua vida em expiação, Ele terá descendência duradoura e fará cumprir com êxito a vontade do Senhor. Por esta vida de sofrimento, alcançará a luz e uma ciência perfeita. Meu Servo, o justo, fará justos inúmeros homens, carregando sobre si suas culpas”.
Este é o caminho de Jesus: fazer-Se servo humilde e causa de nossa salvação. Isso os discípulos não compreendiam nem nós compreendemos! Também a nós o Senhor convida a participar do Seu batismo e do Seu cálice.

Escutemos mais uma vez, são Paulo: “Não sabeis que todos os que fomos batizados em Cristo Jesus, é na Sua morte que fomos batizados? Pelo batismo nós fomos sepultados com Ele na morte para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela Glória do Pai, assim também nós vivamos Vida nova. Porque se nos tornamos uma só coisa com Ele por uma morte semelhante à Sua, seremos uma coisa só com Ele também por uma ressurreição semelhante à Sua” (Rm 6,3-5).
Podeis ser batizados no Meu batismo? Estais dispostos a mergulhar vossa vida no Meu caminho de morte e ressurreição, morrendo para vós mesmos e buscando a vontade do Pai de todo o coração? Eis o que é ser batizado em Cristo! E nós o fomos! O desafio agora é viver o Batismo no qual fomos batizados, tornando-nos, em Cristo, criaturas novas, abertas para a vontade do Pai, como Jesus. E, não somente ser batizado no batismo de Jesus, mas também beber o cálice de Jesus: “Todas as vezes que comeis desse pão e bebeis desse cálice, anunciais a morte do Senhor até que Ele venha” (1Cor 11,26); “O cálice de bênção que abençoamos não é comunhão com o Sangue de Cristo?” (1Cor 10,16).
Vejam só: comungar na Eucaristia é aprofundar aquilo que já começamos a viver no Batismo: fazer da vida uma vida em comunhão com o Senhor na Sua Morte e Ressurreição! Não se pode nem sonhar em ser cristão pensando num caminho diferente, num modo diverso de viver! Tiago e João não tinham compreendido isso; os Doze também não compreenderam; nós, tampouco, compreendemos!

Observem ainda como os dois irmãos são presunçosos: quando Jesus pergunta: “Podeis beber o cálice? Podeis ser batizados?” Eles respondem: “Podemos!” Na ânsia pelos primeiros lugares, no desejo de obterem o que pedem, prometem aquilo que somente com a graça de Deus seriam capazes de prometer! A mesma lógica nossa, nosso mesmo procedimento, tantas vezes! Como Pedro, que, mais tarde dirá: “Darei a minha vida por Ti” (Jo 13,37); e de modo tão presunçoso quanto o dos dois irmãos, exclamará: “Ainda que todos se escandalizem, eu não o farei!” (Mc 14,29). Pobre Pedro, pobres Tiago e João, pobres de nós! Sem a graça de Deus em Cristo, que poderemos? Vamos nos escandalizar, vamos fugir da Cruz, vamos descrer no Senhor, vamos abandonar o caminho! Como não compreendemos a estrada de Jesus! Tudo é graça! Por isso Jesus diz que, ainda que eles bebam o Seu cálice e sejam mergulhados no Seu Batismo, ainda assim, será graça de Deus conceder os primeiros lugares... Não podemos cobrar nada de Deus: “É para aqueles a quem foi reservado!”

Finalmente, a atitude dos outros Doze, que também buscavam o primeiro lugar e se revoltam contra os dois irmãos! E Jesus chama os Doze e nos chama também a nós, e fala-nos do mundo, com seus jogos de poder, sua ganância, sua hipocrisia e sua mentira e nos diz: “Entre vós, não deverá ser assim: quem quiser ser grande, seja vosso servo; quem quiser ser o primeiro, seja o escravo de todos. Porque o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a Sua vida como resgate para muitos”.
Aqui está o modelo do caminho cristão: o Cristo, totalmente abandonado à vontade do Pai, totalmente disponível, totalmente pobre... Ele é o modelo de como devemos viver entre nós e em relação ao Pai: no serviço mútuo, na disponibilidade, na confiança no Pai, no abandono ao Seu desígnio a nosso respeito. Somente Jesus poderia rezar com toda a liberdade: “Pai, não o que Eu quero, mas o que Tu queres!” (Mc 14,36).

Olhando nossa fraqueza, nossa pouca disponibilidade, olhando quanto na vida buscamos nossos interesses e nossas vantagens, não desanimemos! Sigamos o conselho do Autor da Carta aos Hebreus: “Temos um Sumo-sacerdote eminente, que entrou no Céu, Jesus, o Filho de Deus. Por isso, permaneçamos firmes na fé que professamos! Temos um Sumo-sacerdote capaz de Se compadecer de nossas fraquezas, pois Ele mesmo foi provado em tudo como nós!”
Confiemos no Senhor e supliquemos que Ele converta o nosso coração, dando-nos Seus sentimentos, Suas atitudes de doação, serviço e humildade, Sua confiança no Pai e, finalmente, a graça de participar daquela Glória que, no Céu, Ele tem com o Pai e o Espírito Santo. Amém.


sábado, 13 de outubro de 2018

Homilia para o XXVIII Domingo Comum - ano b

Sb 7,7-11
Sl 89
Hb 4,12-13
Mc 10,17-30

Caríssimos, antes de mais nada, fixemos nosso olhar em Jesus nosso Senhor: Ele é a Sabedoria de Deus, como diz São Paulo (cf. 1Cor 1,24.30). Ele é aquela Sabedoria bendita e preciosa de que fala a primeira leitura de hoje. Sim, caríssimos no Senhor: encontrar Jesus, nosso Senhor, vale mais que os cetros e tronos; em comparação com essa bendita Sabedoria, saída do Pai no ventre da Virgem, as riquezas são sem valor porque Ela é a grande riqueza de nossa existência. Por isso, vale a pena amar nosso Jesus, Sabedoria de Deus, mais que a saúde e a beleza; vale a pena possuí-Lo mais que a luz, pois o esplendor que Ele irradia não se apaga.
– Sim, Senhor bendito, os que Te amam brilham como o sol, como o sol ao amanhecer!
Tu és a luz do mundo, o esplendor do Pai, a claridade de nossos olhos, a Sabedoria que dá sentido à nossa vida! Contigo todos os bens desta vida nos são dados; sem Ti nada é verdadeiramente bom, nada durável, nada encherá verdadeiramente o nosso coração!
Bendito seja Tu, Senhor Jesus, Sabedoria eterna, saída da boca do Pai para dar luz e sentido ao universo!

Jesus é também a Palavra do Pai, Palavra viva, definitiva, eterna. A Palavra de Deus, caríssimos, não é primeiramente a Bíblia. A Palavra de Deus por excelência não é um livro, mas uma Pessoa: é Jesus: “No princípio era a Palavra e a Palavra estava com Deus e a Palavra era Deus. Tudo foi feito por Ela e sem Ela nada foi feito de tudo quanto existe. E a Palavra Se fez carne e habitou entre nós!” (Jo 1,1-2.14)
Eis, portanto: a Bíblia é a Palavra de Deussomente porque dá testemunho de Jesus, o Verbo do Pai – e não de qualquer Jesus, mas do Jesus crido, adorado, testemunhado e anunciado pela Igreja católica, fundada pelo próprio Cristo e por Ele sustentada na Sua Palavra pela força do Espírito Santo da Verdade, que conduz sempre a Igreja à verdade plena! Fora disso, a Bíblia já não é Palavra de Deus, mas confusão e caminho para o erro! Voltemos, pois, o olhar para Cristo: Ele é “a Palavra de Deus, viva e eficaz e mais cortante que qualquer espada de dois gumes. Ela julga os pensamentos e as intenções do coração”. Isso nós sabemos, irmãos; isso experimentamos quando tantas vezes somos questionados pelo Senhor Jesus, que penetra até o íntimo de nós, com Sua verdade, com Sua exigência, com os projetos que tem a nosso respeito. Cristo é esta Palavra viva e definitiva de Deus: “E não há criatura que possa ocultar-se diante Dela. Tudo está nu e descoberto aos Seus olhos, e é a Ela que devemos prestar contas”.Por isso mesmo, o Senhor é o critério de nossa existência: quem Nele crê tem a Vida; quem não crê não conhecerá nunca o verdadeiro e pleno sentido da vida!
– Bendito sejas Tu, Senhor Jesus, Palavra e Verdade do Pai!
Dá-nos a graça de vivermos em Ti, de compreendermos que Tu és a nossa Vida e que somente em Ti nossa existência será realmente plena de sentido e atingirá o fim para que fomos criados.
A Ti a glória, ó Cristo, Sabedoria e Palavra do Pai!
A Ti o nosso amor, nossa adoração, nossa ilimitada entrega e confiança,
a Ti a nossa vida toda inteira, ó Cristo nosso Deus!

Agora, amados em Cristo, podemos compreender o Evangelho deste hoje. Pensemos bem: A pergunta que este alguém faz a Jesus, não é aquela mesma que nós tantas vezes fazemos? Não é a pergunta definitiva da nossa existência? “Bom Mestre, que devo fazer de bom para ganhar a Vida eterna?”- Eis Senhor, qual dos caminhos da vida seguir? Qual me levará para mais longe ou para mais perto de Ti? Dize-me, Mestre Bom!

A resposta de Jesus surpreende: “Por que Me chamas de bom? Só Deus é o Bom!”É verdade: só o Pai é o Bom, é a fonte eterna de toda bondade, como só o Pai é o Santo, e a fonte de toda Santidade. E, no entanto, o próprio Senhor afirma: “Tudo que o Pai tem é Meu. Eu e o Pai somos um. Quem Me vê, vê o Pai!”Por isso mesmo, sem medo, podemos dizer todos os domingos: “Só Vós sois o Santo, só Vós o Senhor, só Vós o Altíssimo, Jesus Cristo, com o Espírito Santo na glória de Deus Pai!” Sim, meus caros, Jesus é Bom porque vem do Pai, porque tudo recebeu do Pai e participa plenamente da plenitude de plena bondade que é o Pai!

Mas, “tu conheces os mandamentos!”– Jesus é prático, meus caros: indica ao alguém que vem a Ele os mandamentos; e notem bem: os mandamentos da segunda tábua, aqueles que falam do amor e do respeito pelo próximo!
Vede, amados no Senhor, como o seguimento a Jesus exige atitudes muito concretas na nossa vida! Aquele lá, que buscava a vida respondeu feliz: “Mestre, tudo isso tenho observado desde a minha juventude!”Meus irmãos, nesta resposta há uma coisa boa e outra ruim. A coisa boa é que esse homem é realmente observante da Lei de Deus; a coisa ruim é que ele parece satisfeito consigo mesmo; prece que, para ele, a religião consiste em fazer, em observar normas. Pronto. Fazendo isso, tudo bem! Notai, caríssimos, que também aquele fariseu que rezava no Templo estava satisfeito porque cumpria todos os preceitos; e os cumpria mais da conta! Ah, meus irmãos, que para o Senhor isso não basta!
O Senhor é exigente, o Senhor olha o coração, o Senhor, Palavra “tão penetrante como espada de dois gumes”, quer saber de nossas intenções, de nosso amor, e não Se contenta com nada menos que nosso coração e nossa vida! “Jesus olhou para ele com amor, e disse: ‘Só uma coisa te falta: vai, vende tudo que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no Céu. Depois vem e segue-Me!”Meus irmãos, como Jesus é bonito, como é sábio, como é exigente, como vai direto ao ponto! 
Primeiro, vede como olha aquele lá: com amor, com aquele amor eterno com que nos amou e reservou para nós o Seu amor! Nunca esqueçamos: Suas exigências são exigências de amor! Na verdade, o Senhor deseja fazer aquele homem passar de uma religião de simples fazer coisas e cumprir preceitos para uma religião de amar de verdade: “Vai, vende tudo que és, moço! Vai, deixa-te a ti mesmo, rapaz; larga essa preocupação contigo! Deixa-te vendendo tudo; abre-te para os outros, repartindo teus bens e teu amor e, depois, estarás pronto de verdade para experimentar o quanto Eu sou o Bom: “Vem e segue-Me!”Tu Me chamaste de Bom sem saber o que isso queria dizer... Vem comigo, deixa tudo por Mim e verás de verdade que Eu sou o Bom, o teu Bem, todo Bem, o sumo Bem! Serás livre, mocinho; encontrarás a Vida em abundância! Deixa-te por Mim e tu me encontrarás e, encontrando-Me, encontrarás a própria Vida!

Mas, não! Esse risco aquele lá não queria correr. Queria uma religião arrumadinha, que lhe oferecesse garantias; uma religiãozinha burguesa, na qual se serve a Deus para servir-se de Deus... Arriscar tudo por esse Mestre de Nazaré? Deixar e deixar-se? Era demais! “Quando ele ouviu isso, ficou abatido, foi embora cheio de tristeza porque era muito rico”.
Vede, meus irmãos, como nós somos! Vede qual a nossa tentação! Esse homem era rico de bens materiais, rico de apego a si próprio, rico de se buscar a si mesmo, mas pobre de amor a Deus e pobre de generosidade para com os outros; pobre de sonhos, pobre de ideal, pobre de generosidade, pobre de grandeza interior... Ele queria ser aquilo que Cristo abomina: um cristão burguês, acomodado na vidinha medíocre, de fácil moral e fáceis compromissos, cristãos que rastejam como vermes quando deveriam voar alto como as águias... Eis o resultado: “foi embora cheio de tristeza porque era muito rico”.

Daí a dura constatação de Jesus: “Como é difícil para os ricos entrar no Reino de Deus! É mais fácil um camelo passar pelo buraco da agulha do que um rico entrar no Reino de Deus!’ A palavra é clara: é mais fácil um camelo passar pela agulha fininha, que um rico entrar no Reino! E por quê? Porque a riqueza – seja qual for ela – tende a nos apegar, a nos fechar, a nos fazer pensar que nos bastamos! Somente quem for pobre de coração pode entrar no Reino, pois só quem é pobre deixa que Deus reine de verdade na sua vida! E como é difícil para nós, tão fáceis de sermos iludidos, compreender isso! Desapeguemo-nos, caríssimos, de nós mesmos; deixemo-nos para poder encontrar a vida verdadeira. Nunca será digno de Jesus quem não tiver a coragem de tudo deixar por Jesus: “Quem tiver deixado tudo por causa de Mim e do Evangelho, receberá cem vezes mais agora, durante esta vida, com perseguições e, no futuro, a Vida eterna”.

Os apóstolos não compreenderam isso – como também muitas vezes nós não compreendemos e não compreendem de modo algum aqueles que falam em seguir Jesus só para ter lucro. Basta ver na televisão os falsos pregadores, de falsos evangelhos, que não passam da velhice pecaminosa disfarçada. Basta pensar na maldita teologia da prosperidade: “serve a Deus e ficarás rico!”
Caros, quem deixa para receber, nada deixou; quem deixa esperando recompensas, nunca amou; quem segue o Senhor pensando em pagamentos, nunca compreendeu a Palavra!
– Senhor, Sabedoria e Palavra do Pai, nosso Tudo e nossa Vida,
só Tu és nosso caminho,
só Tu, nosso destino,
só Tu nossa eterna recompensa.
Nada nos falta se temos a Ti!
Ensina-nos a nos deixar e a deixar tudo para só a Ti possuir, pois tendo a Ti, teremos tudo, mas para chegar a ter tudo é preciso que de tudo nos desapeguemos...
Cristo Santo, nosso Bem, a Ti a glória para sempre. Amém.


sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Oração à Padroeira

Do nosso rio nas águas,
por pescadores pescada,
tu apareces, ó Virgem,
“Aparecida” chamada.

Mui justo é, Mãe, celebrar
os benefícios que há tanto
pelo Brasil desdobrado
vai espalhando o teu manto.

Por isso de áurea coroa 
a tua fronte cingimos:
concede, Virgem sagrada,
as graças que hoje pedimos!

A ti mãos postas erguemos;
estende mais o teu véu,
preserva a todos da mácula,
conduze todos ao céu.

Ao que no trono Se assenta,
louvor e glória convém,
pois Uno e Trino governa
a terá e o céu também.


sábado, 6 de outubro de 2018

Homilia para o XXVII Domingo Comum - ano b

Gn 2,18-24

Sl 127
Hb 2,9-11
Mc 10,2-16

Neste domingo, a Palavra de Deus trata do matrimônio e de sua indissolubilidade. Eis aqui um tema que se tornou tabu nos tempos atuais e, por isso mesmo, precisa ser tratado com toda clareza pelos cristãos... Afinal, se o Evangelho não for sal e luz, para que serve?

Comecemos com o plano de Deus, descrito no Gênesis de modo figurado, como as parábolas que Jesus contava. São textos que não devem ser tomados ao pé da letra! Se lermos com atenção, perceberemos algo muito belo: Deus, à medida que vai criando, vê que tudo é bom... Ao criar o ser humano, vê que “era muito bom” (Gn 1,31).
Mas, há algo na criação que o Senhor Deus viu que não era bom: “Não é bom que o homem esteja só”. Se o ser humano é imagem do Deus-Trindade, ele não foi criado para a solidão, mas deve viver em relação com outros: “Vou dar-lhe uma auxiliar que lhe seja semelhante”. Notemos os detalhes tão belos da criação da mulher:

(1) “O Senhor Deus fez cair um sono profundo sobre Adão”. Por quê? Para ficar claro que o homem não participou da criação da mulher; esta é tão obra de Deus quanto aquele.

(2) “Tirou-lhe uma das costelas e fechou o lugar com carne. Da costela tirada de Adão, o Senhor Deus formou a mulher”. A imagem é bela:tirada do lado do homem, como companheira e igual!

(3) “E Adão exclamou: ‘Desta  vez sim, é osso de meus ossos e carne da minha carne!’”É a primeira vez que o homem falou, na Bíblia! E sua palavra foi uma declaração de amor; não a Deus, mas à mulher que o Senhor Deus lhe dera de presente: osso de meus ossos, carne de minha carne, parte de mim, cara metade, outro lado do meu coração!

(4) E, finalmente, o preceito de Deus, inscrito no íntimo do coração humano pelo próprio Criador: “O homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne”.
Pronto! Esta é o sonho de Deus para o amor humano!

Já aqui há três observações a serem feitas:

(a) O laço de amor entre o homem e a mulher é superior a qualquer outro laço, inclusive aquele que liga pais e filhos: o homem e a mulher deixarão pai e mãe para ir ao encontro de sua esposa, de seu esposo.

(b) Esta união, no sonho original de Deus, envolve a pessoa toda, corpo e alma: “serão uma só carne”. É uma união completa, abrangente, total: serão um só coração, um só sonho, uma só conta bancária, uma só casa, um só futuro, um só destino!

(c) A relação matrimonial, no sonho de Deus, é uma relação entre um homem e uma mulher. Por isso mesmo, jamais os cristãos poderão equiparar a união entre homossexuais ao matrimônio! O respeito às pessoas homossexuais é dever de todos nós; o respeito pela consciência dessas pessoas, que têm o direito de dar o rumo que acharem justo às suas vidas, é obrigação nossa, é gesto de amor que Jesus espera de seus discípulos. Mas, equiparar a relação matrimonial a qualquer outra relação afetiva, sobretudo homossexual, nunca!

Por fidelidade a Cristo, nunca! Por respeito ao plano de Deus, jamais! Hoje, no Direito, há uma forte corrente aqui no Brasil, que considera como sendo família qualquer união simplesmente afetiva: não importa se a união é entre marido e mulher, entre amigos ou entre duas pessoas do mesmo sexo. Para nós cristãos, tal concepção é inaceitável! A família, para nós, não é uma realidade simplesmente natural, mas tem sua raiz no próprio plano de Deus. A família é uma realidade também teológica! É preciso escutar o que Deus tem a dizer sobre a família! O problema é que nossa sociedade já não é cristã; é pagã e pensa e age como pagã; é atéia e age como se Deus não existisse... Nossa sociedade acha que o homem é a medida de todas as coisas, o senhor do bem e do mal, do certo e do errado. Isso é absolutamente inaceitável para o cristão!
Agora podemos compreender a palavra de Jesus no Evangelho! Naquele tempo havia o divórcio... E Jesus, que é tão misericordioso, condena sua prática: “Foi por causa da dureza do vosso coração que Moisés”permitiu o divórcio! “No entanto, no princípio da criação Deus os fez homem e mulher... Já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não separe!”
É uma palavra que parece dura, e os próprios discípulos tiveram dificuldades em compreender, como muitíssimos a têm hoje em dia.

Compreendamos! Jesus veio para reconduzir este mundo ferido pelo pecado ao plano original de Deus. Ora, o sonho de Deus para o amor conjugal é que ele seja uma entrega total e plena, no amor indissolúvel, fiel e fecundo. Este é o ideal que Jesus aponta aos Seus discípulos, é o ideal para o qual os discípulos deverão caminhar sempre! Na perspectiva de Jesus, o divórcio é contrário ao plano de Deus para o amor humano! Por isso mesmo, o matrimônio abraçado por um cristão e uma cristã, no Senhor Jesus, é indissolúvel! Aqui é preciso deixar claro que a Igreja não tem autoridade para ensinar ou fazer diferente! Seria trair o Senhor! Surgem, no entanto, algumas questões sérias e graves:

(1) Como prometer amor por toda a vida, se nosso coração é inconstante? Primeiramente, é necessário recordar que o matrimônio cristão somente pode ser abraçado na fé, sabendo os esposos que jamais a graça de Cristo lhes faltará. Com toda certeza, o Senhor haverá de conduzir os esposos no caminho do amor. Isto, no entanto, de modo algum, dispensa os esposos de cultivarem esse amor, com o diálogo, os gestos de carinho e de perdão, de compreensão e de atenção. Amor não é só sentimento: o amor não nasce de repente, não é fatal, não é cego, nem morre de repente. O amor pode e deve ser cultivado, cuidado. Como dizia São João da Cruz: “Onde não há amor, semeia amor e colherás amor”. A grande ilusão do mundo atual é pensar que o amor se reduz a sentimento, que não precisa ser cuidado nem cultivado! Confunde-se amor com paixão!

(2) Como fazer uma aliança para sempre, se esta depende não só de mim, mas também da outra pessoa? A questão é séria e, para nós, cristãos, deve ser pensada na fé. O matrimônio entre cristãos é sinal, é sacramento, do amor entre Cristo e a Igreja. São Paulo explica este mistério de modo belíssimo no capítulo quinto da Carta aos Efésios: marido e mulher devem se amar como Cristo e a Igreja (cf. Ef 5,21-32). Ora, este amor foi selado na Cruz e na Ressurreição; é amor pascal, amor que envolve morte e vida! A indissolubilidade não deveria ser vista como um fardo, mas como uma proposta de um Deus que crê no homem que criou; um Deus que nunca brinca com o amor, um Deus que aposta na nossa capacidade, quando aberta à Sua graça! Ora, este amor-doação matrimonial, imagem daquele outro, entre Cristo e a Igreja, certamente terá a marca da Cruz. As dificuldades conjugais, para o cristão, têm o nome de cruz, cruz que, assumida com amor e por amor, é transformada em alegria e plenitude de ressurreição. Aqui não se trata somente de palavras bonitas, mas de uma realidade impressionante: quem capitula, quem desiste ante as dificuldades, nunca plantará um amor no sentido cristão! A presença de Cristo na união conjugal não exclui as crises, as dificuldades, a incompatibilidade de temperamentos e até mesmo os erros na escolha do cônjuge! Mas tudo isso, por quanto doloroso possa ser, pode se tornar, em Cristo, um modo libertador e eficaz de participar com generosidade e desapego da cruz do Senhor e caminho de felicidade! “Loucura! Insanidade! Demência!” – dirá o mundo! Mas, a linguagem da cruz é loucura para o mundo! A sabedoria da Cruz é tolice para o mundo! Nunca esqueçamos isso! Mas, para quem crê, é poder de Deus e sabedoria de Deus! (cf. 1Cor 1,18; 3,18-20). O problema é que as pessoas casam como os cristãos, mas não creem nem vivem como os cristãos! Que fique bem assentado: o sonho de Deus em Cristo para o matrimônio é a indissolubilidade!

(3) E os nossos irmãos e irmãs que fracassaram na aliança conjugal e estão numa nova união? É uma situação dolorosa. Se são cristãos de verdade, esta realidade é primeiramente difícil para eles. Não nos compete julgar suas intenções e sua história! Compete-nos respeitá-los e acolhê-los com espírito fraterno, ajudando-os a viver esta nova união do melhor modo possível, caminhando sempre mais para uma mais completa doação ao Senhor. Isto, no entanto, não significa aprovação da separação nem da nova união. Mas, simplesmente, respeito pela história, pela consciência e pelo mistério da vida e das opções de cada irmão e de cada irmã. Estejamos atentos que tantos irmãos que vivem esta dolorosa situação têm um sincero amor ao Senhor e verdadeira doação à Igreja! Aqui, vale muito recordar a palavra do Senhor: “Quem estiver sem pecado, que atire a primeira pedra!” (Jo 8,7). Cuidado, irmãos: não coloquemos fardos na vida dos outros: “Carregai o fardo uns dos outros e assim cumprireis a Lei de Cristo!” (Gl 6,2)

Que o Senhor socorra as famílias e fortaleça no amor os esposos cristãos, fazendo-os simples como as crianças, capazes de acolher a proposta do Cristo para o matrimônio e que, nas dificuldades, recordem-se que Cristo, Autor da nossa salvação, também foi levado à consumação passando pelos sofrimentos. Que nossos sofrimentos, unidos aos Dele, sejam semente e penhor de Vida eterna. Amém.

"Vem, amada Minha!"

terça-feira, 2 de outubro de 2018

Ruminando a Palavra de Deus do XXVI Domingo Comum.b (parte II)

Nm 11,25.
O Senhor Deus tomou do Espírito que repousava sobre Moisés e colocou nos setenta anciãos.
Que Espírito é este? É o Espírito Santo de Deus! É o Espírito do próprio Cristo!
Como é possível ser Espírito de Cristo, se Moisés viveu antes de Cristo?
Mistério: na história de Israel, na Antiga Aliança, tudo caminha para o Cristo, tudo é guiado para Cristo: Ele é o “Cordeiro sem defeito e sem mácula, conhecido antes da fundação do mundo” (1Pd 1,20). Como a Igreja canta no Credo: o Espírito de Cristo falou pelos profetas!

1Pd 1,10-11.
Impressionante! A Escritura afirma que os profetas anunciaram a salvação e testemunharam os sofrimentos de Cristo porque o Espírito do Cristo Jesus falava neles!
Sim! Nos planos de Deus, o Cristo está presente desde o início, desde o princípio, quando Deus criou o céu e a terra, e o Santo Espírito do Cristo imolado e ressuscitado, o Cordeiro vitorioso, que já Se encontra fora dos tempos e acima de todos os tempos,
esse Espírito Santo preenche todos os tempos
e para Cristo direciona todas as épocas e todos os acontecimentos da Antiga Aliança!

Nm 11,25.
O Senhor Deus tomou do Espírito que repousava em Moisés e derramou-O sobre os setenta anciãos.
O Espírito que repousava em Moisés e foi repartido sobre os setenta anciãos sem se dividir! Dado aos setenta sem diminuir em Moisés!
Espírito repartido, mas não dividido,
Espírito multiplicado, mas não diminuído!
O mesmo Espírito, o único Espírito, esparramado, participado por muitos!
Espírito de unidade! Espírito de diversidade!
Espírito único e múltiplo!
Um só Espírito, pousando sobre muitos:
unidade firme, indestrutível!
Diversidade rica, maravilhosa! (cf. At 2,3-4; 1Cor 12,4-7)

At 2,33.
Ainda hoje é assim, na Igreja, no Povo conquistado por Cristo: o mesmo Espírito que ungiu o Senhor Jesus na Ressurreição esparrama-Se,
generoso,
pleno,
abundante,
superabundante,
Dom de Deus,
sem medida,
da Cabeça por sobre todos os membros do Corpo, sobre todos os membros da Igreja!

Nm 11,25.
O Espírito pousou sobre cada um deles e, então profetizaram!
Profetizaram: falaram em nome de Deus, cantaram os louvores de Deus, disseram palavras da parte de Deus, proclamaram a ação de Deus, embriagados pelo Espírito de Deus, mais do que por vinho: “Não vos embriagueis com vinho, mas buscai a plenitude do Espírito!” (Ef 5,18)
Espírito de profecia!
Espírito que proclama continuamente, por tantas bocas, em tantas línguas, em linguagens diversas, as maravilhas de Deus, a vontade de Deus, o desígnio de Deus
e tudo renova na vida do Povo Santo, no caminho da Igreja!
Por isso a Igreja de Cristo é dos apóstolos, mas é também dos profetas: “Aqueles que Deus estabeleceu na Igreja são, em primeiro lugar, apóstolos; em segundo lugar, profetas!” (1Cor 12,28).
Quem são os profetas?
Aqueles que, embriagados pelo Espírito que procede do Cristo, falam, sonham, inventam, guiados pela Força de Deus!
Aqueles que com a boca, com os gestos, com o modo de viver, meio doidos, meio embriagados, proclamam por todos os poros da existência que o Senhor Jesus é o Cristo, o Senhor, Vivo, Vivificante, Ressuscitado, Ressuscitante, único Salvador da humanidade: “Todo Espírito que não confessa Jesus, não é de Deus!” (1Jo 4,3).
Profeta, na Igreja, é quem proclama Jesus, o Senhor do Cristo de Deus!
Profeta é quem, acalentado pelo Espírito, sonha Jesus, o Senhor,
Profeta é quem, inebriado pelo Espírito, faz loucuras por amor do Senhor,
Profeta é quem, inspirado pelo Espírito, inventa, cria, embriagado no amor do Senhor,
Profeta é quem, elevado pelo Espírito, já vê na terra, o Céu,
Quem fala, ainda na terra, as coisas do Céu, para a glorificação do Cristo de Deus, o Senhor Jesus!
Triste da Igreja se tivesse a prudência e discernimento dos sucessores dos Apóstolos e padecesse da falta da loucura  criativa e meio indisciplinada dos profetas;
Pobre da Igreja na qual os sucessores dos Apóstolos tivessem medo e desconfiança das surpresas vindas dos profetas;
Triste daqueles que pensassem em proclamar a perenidade do Cristo sem a novidade dinâmica e criativa do Espírito que age nos profetas do Ungido de Deus, Jesus, nosso Senhor!

Toda esta riqueza, evocada nos dois primeiros versículos da primeira leitura da Missa...
Bendita seja a Palavra do Senhor!


segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Ruminando a Palavra do XXVI Domingo Comum.b

Nm 11,24.
Moisés colocou os anciãos ao redor da Tenda de Reunião. A Tenda: ela era o lugar de encontro do Deus vivo com o Seu Povo eleito, Israel.

Sobre a Tenda descia a Nuvem, a Shekinah, a santa Presença de Deus. Essa Presença é o próprio Espírito de Deus, Sua Santidade, Sua Glória, Seu Poder, Sua Força, Sua Energia, Sua Vitalidade.

A Tenda e a Nuvem. O lugar do encontro e a Força, a Vida divina.

Jo 1,14.
O Verbo, a Palavra de Deus, Seu Pensamento, fez-Se carne, fez-se matéria, entrou no mundo e habitou entre nós, armou a Sua tenda entre nós. Jesus nosso Senhor é o local de encontro entre Deus e o homem, entre o Divino e o “mundano”, entre a Eternidade e o tempo, entre a Glória e a história: “O Verbo Se fez carne e armou Sua tenda entre nós!”

Nm 11,25.
O Senhor desceu na Nuvem! A Nuvem, imagem do Santo Espírito, Presença, Shekinah potente e exuberante de Deus, o Santo! O Espírito de Deus desceu sobre a Tenda, pairou na Tenda, habitou na Tenda!
Depois, invadiu, preencheu o Templo, pairou no Templo, habitou no Templo: 1Rs 8,10-13.
O Templo, como a Tenda de Reunião tornou-se lugar do encontro com Deus, habitação do Espírito de Deus.

Mas, tudo isto, a Tenda e o Templo, eram figuras, preparação, profecia, mistério!

Jo 2,19.
O verdadeiro Templo é o Verbo encarnado. Ele é o lugar em que habita o Espírito do Deus de Israel. Ele, ressuscitado, com Sua humanidade glorificada, é a Tenda eterna, o Templo indestrutível, a habitação perene da Glória de Deus. A Tenda de Reunião do deserto passou, o Templo de Jerusalém foi destruído e não mais será reerguido.
Eram sagrados porque eram figura do Santo, profecia do Santo, antecipação do Santo!

Cl 2,9.
Sim! Nele, no Ressuscitado, Naquele cuja humanidade é, agora, plena, replena, repleta de Espírito, “Nele habita, corporalmente toda a Plenitude da Divindade”: a infinita superabundância do Espírito: Santidade de Deus, Poder de Deus, Presença de Deus, Glória de Deus, Força de Deus, Vida de Deus!

Tudo já está misteriosamente, prefigurado, presente naquela Tenda, naquela Nuvem, da primeira leitura da Missa deste Domingo...

Bendito sejas Tu, Senhor, nosso Deus,
Que tudo foste preparando para que,
na plenitude dos tempos,
o Teu bendito Filho Jesus, nosso Senhor,
nos desse todo bem e toda graça!

A Ti a glória para sempre!


Para pensar... E seu voto está implicado nesta realidade!


Em essência, o grande desafio do mundo ocidental - e também do Brasil, que faz parte deste mundo -, se não quiser se perder de vez, perdendo o rumo de sua consciência e de seu coração, é reconhecer novamente o ser humano como estruturalmente aberto para Deus.

Não basta pensar nos problemas econômicos e sociais! Há mais, muito mais em jogo: o que é o ser humano, qual o sentido da sua existência, qual o seu caminho neste mundo e o seu destino no tempo e na eternidade!
Sem atenção a estas questões, todas as outras - inclusive as questões sociais, econômicas, políticas... - ficarão distorcidas e deformadas, podendo mesmo matar o ser humano pessoal e socialmente! Em outras palavras: uma sociedade que caminha sem Deus ou contra Deus caminha para a destruição, para a necrose de todos os seus tecidos! O homem sem Deus perece! Uma sociedade sem Deus definha! Uma cultura sem Deus ou contra Deus se estiola!

Portanto, a racionalidade ocidental tem que reconhecer que não pode abarcar o sentido último e global da realidade toda nem reduzir o todo a questões sociais, econômicas ou de bem-estar; não pode abarcar o sentido último e global da realidade toda nem com as ciências da natureza, nem com a filosofia, nem com as ciências sociais. Nem todas estas instâncias poderão jamais chegar ao cerne da questão do sentido mesmo da existência! Também a incrível habilidade científica e tecnológica não deveria engabelar o Ocidente, dando-lhe a ilusão de tudo poder e de satisfazer o coração humano empanturrando-se de bem-estar. Tudo que conseguiremos assim é a destruição do coração e do planeta!

O homo sapiens (homem que pensa) e o homo faber (homem que produz ciência e tecnologia) têm que ser também homo fidelis (homem que crê, que é fiel a Deus e constrói uma sociedade e uma cultura abertas ao Infinito). Não esqueçamos as dramáticas palavras de Miguel de Unamuno, ateu que procurava Deus:
“Sofro eu a Tua custa, Deus não existente,
pois se Tu existisses, eu existiria também de verdade”.

Ou Deus e o homem, ou nem Deus nem o homem!

Que Brasil queremos? Que sociedade desejamos? Que tipo de escola, de formação, de humanismo? Perguntas tremendas... Respostas concretas no voto!