sexta-feira, 31 de maio de 2019

O sonho de Deus para o amor humano

Meu Irmão, leia o Evangelho segundo Mateus, lá em 19,1-15... Aí, Nosso Senhor diz algumas coisas que o mundo de hoje não engole e muitos cristãos não mais compreendem. Ei-las:

1. Ele veio para fazer novas todas as coisas, restaurando-as da velhice do pecado e reconduzindo o plano original de Deus ao seu lugar. Por isso mesmo, Ele Se refere ao “princípio”, quando “o Criador os fez homem e mulher”.

2. Isto quer dizer que Deus criou o ser humano aberto e necessitado dos outros. Homem algum pode viver fechado em si, isolado. Desde o princípio o Senhor decretou que “não e bom que o homem esteja só”. Só conseguiremos ser felizes se existirmos em comunhão com Deus, com os outros, com a criação.

3. A mais intensa forma de comunhão é aquela conjugal entre um homem e uma mulher:“Desde o princípio o Criador os fez homem e mulher”. Deus sonhou com o amor humano assim, heterossexual, entre homem e mulher. A Escritura e a perene Tradição da Igreja são claríssimas: a homossexualidade de modo algum faz parte do plano de Deus para a humanidade. Respeitam-se as pessoas homossexuais, respeita-se o modo como escolham viver, mas jamais um cristão poderá fazer apologia da homossexualidade ou, pior ainda, das relações homossexuais.

4. A relação conjugal homem-mulher deve ser vivida sob a marca da perenidade. Jesus nosso Senhor de modo algum admite o divórcio entre os Seus discípulos. Para Ele, é adultério, sem apelação! Os casais cristãos são chamados a crescer no amor, a aprender a amar, a colocar seu amor debaixo da Cruz de Cristo. Amor que não suporta a Cruz não é amor!

5. O Senhor deixa claro que a relação homem-mulher e a vida conjugal não podem ser vividas de um modo arbitrário qualquer. A família é sagrada, pois é parte do plano de Deus para a humanidade. Família é um homem e uma mulher vivendo juntos no amor e em plena comunhão de corpo e alma, abertos para a geração de vidas humanas, na fidelidade e indissolubilidade. O homem não tem o direito nem o poder de mudar isso.

Se formos realmente cristãos, coloquemo-nos debaixo do senhorio de Cristo; aceitemos Sua palavra. Para isso, Ele nos convida a um coração de criança, pois somente aquele que acolhe o Reino dos Céus como uma criança poderá compreender estas coisas. Só assim entraremos no Reino que o Senhor nosso veio trazer! Simples assim, claro assim, nos dias de hoje, escandaloso assim!


quarta-feira, 29 de maio de 2019

O Ressuscitado transfigura todas as coisas

Estamos ainda nas festas pascais! Cremos que o Filho de Deus, feito homem, como nós, foi transfigurado por uma Glória que não vem de nós, mas é obra do Pai, que sobre Ele derramou a plenitude do Espírito: Aquela Glória, daquele homem como nós - homem do nosso barro humano, tão quebradiço -, aquela Glória não é deste mundo, não vem daqui debaixo...

Contemplando o Cristo Senhor glorioso, deveríamos compreender o motivo fundamental, definitivo para sermos cristãos: somente Jesus nos dá o que tanto procuramos: a novidade que supera a velhice deste mundo e desta vida, a novidade que vem de fora, vem do Infinito, vem de Deus e renova a nossa vida cansada de tantas novidadezinhas fajutas, novidades que cedo cedo tornam-se passado caduco... 

Somente Jesus é a Novidade, é o Novo, que nos abre um novo sentido para viver; somente Jesus nos pode trazer e conceder o Infinito, a glória de uma vida com um sentido pleno e uma plenitude duradoura. Por isso cremos Nele.

Para nós, pouco importa se o consideram um sábio, ou um revolucionário, ou um comunista(!), ou um humanista, ou qualquer outro –ista que inventem... Ele não é nada disto! Ele é o Filho eterno do eterno Pai, feito homem por nós, por nós entregue à morte de cruz, e glorificado pelo Pai, com um Nome – de Senhor! – acima de todo o nome!
Isto mesmo! Cremos Nele, amamo-Lo somente porque Ele vem de Deus, Ele trazem Si, na Sua pobre natureza humana igual à nossa, o gosto da Eternidade: “O Verbo Se fez carne e habitou entre nós e (na pobreza de Sua carne, que é a nossa) nós vimos a Sua Glória” (Jo 1,14), Glória que Ele dá a todo aquele que Nele crê, no seu Nome é batizado e recebe Seu Corpo e Sangue na Eucaristia.

Olhe o mundo, caro Irmão: relativismo, corrupção, guerra, solidão, frustrações, impiedade, vazio, mentira, dor, velhice, morte... Olhe o Ressuscitado: ali está o que Deus nos concede em Cristo; ali está o nosso Futuro; ali, a nossa Salvação, que supera os estreitos limites do que o homem pode produzir... Nenhuma indústria humana poderá nos dá a plenitude de vida que procuramos.
Que o nosso olhar se dirija a Jesus e Nele se mantenha. Assim, teremos verdadeiramente uma Novidade – a única! – para anunciar e comunicar ao mundo!


Ao Ressuscitado, Amigo dos Homens, com amor e admiração!

Texto de Liturgia bizantina:

Aquele que quis ser por nós crucificado na carne,
Padeceu, foi sepultado e ressuscitou dentre os mortos.
A Ele cantamos e clamamos:
Ó Cristo, firma a Tua Igreja na verdadeira fé
E, na Tua bondade e amor pelos homens,
Pacifica a nossa vida!

Rei do céu e da terra, Tu, que o universo não pode conter,
No Teu amor pelos homens quiseste sofrer a Cruz.
Quando desceste à Profundezas, o Inferno ficou desolado,
Mas as almas dos justos Te receberam com alegria.
Ao ver-Te nos Infernos, ó Deus criador, Adão ressuscita!
Verdadeira maravilha!
Como pôde experimentar a morte, Aquele que é nossa Vida?
Mas Ele quis fazerSsua luz brilhar sobre o universo,
Que eleva a voz para cantar:
Ressuscitado dentre os mortos, Senhor, glória a Ti!

Apesar dos selos colocados sobre a tumba
E dos soldados guardando Teu corpo imaculado,
Tu ressuscitaste ao Terceiro Dia,
Dando a Vida ao mundo, ó Deus salvador,
E do alto dos Céus, os Anjos Te cantam como à Fonte da Vida:
Glória à Tua Ressurreição, ó Cristo!
Glória ao Teu Reino!
Glória à Tua obra de salvação, Senhor, Amigo dos homens!

Cravado na Cruz, ó Caminho universal,
E contado entre os mortos, ó Senhor imortal,
Ao Terceiro Dia Tu ressuscitaste, ó Salvador,
Para erguer Adão da poeira do sepulcro.
Os poderes dos Céus também Te aclamam, ó fonte da Vida:
Glória a Tua divina Paixão, ó Cristo!
Glória à Tua Ressurreição!
Glória à Tua condescendência, ó único Amigo dos homens!



sábado, 25 de maio de 2019

Homilia para o VI Domingo da Páscoa - ano c

At 15,1-2.22-29
Sl 66
Ap 21,10-14.22-23
Jo 14,23-29

No Domingo passado, vimos, na Palavra de Deus, que a Igreja é fruto da Páscoa do Senhor, que ela nasceu do lado do Cristo morto e ressuscitado, que ela vive e continua a nascer da água do Batismo e do sangue da Eucaristia, que o Senhor, na Sua fidelidade, haverá de levá-la à plenitude, que até lá, a Igreja deve ser sinal vivo do Reino de Deus entre as provações da história e deve viver no amor – herança que o Senhor nos deixou...

No Domingo presente, a Palavra de Deus continua a nos falar da Igreja, dessa Comunidade do Ressuscitado, Comunidade que peregrina já há dois mil anos na história humana, como um Povo tão pobre, tão débil, humanamente falando, mas também tão rico e tão forte pela presença do Ressuscitado entre nós.

É ainda o Apocalipse que nos apresenta, de modo belíssimo, a glória da Jerusalém celeste, Esposa do Cordeiro, nossa Mãe católica: “Mostrou-me a Cidade Santa, Jerusalém, descendo do Céu, de junto de Deus, brilhando com a Glória de Deus” – Esta Jerusalém gloriosa é a Igreja! Ela não nasce do povo, não nasce de um projeto humano; não nasce nem vive das nossas reuniões e decisões pastorais; ela nasce do coração do Pai, que, através do Filho Jesus, doador do Espírito, nos chamou, nos reuniu, nos salvou e fez de nós um novo Povo, uma nova Cidade, uma nova Aliança, início de uma nova humanidade. A Igreja é a verdadeira Jerusalém, a verdadeira Cidade de Deus, que desce do Céu e que é santificada pelo sangue do Cordeiro e, um dia, será totalmente transfigurada na Glória de Deus. Não na sua própria glória, mas na de Deus, aquela Glória que já brilha na face do Cristo ressuscitado!

Ela é a herança e a realização plena do antigo Povo de Israel, ela é a plenitude do Povo de Israel, é o Israel da Nova Aliança. Por isso, “nas suas portas estavam escritos os nomes das doze tribos de Israel”. Mas, a Igreja é mais que Israel: ela é aberta a todos os povos, suas portas são abertas para todos os lados: “havia três portas do lado do oriente, três portas do lado norte, três portas do lado sul e três portas do lado do ocidente”. A nova Jerusalém é católica, é aberta a todos, aberta em todas as direções, pois nela todos os povos, todas as culturas, convertendo-se ao Cristo nosso Deus e Senhor, terão abrigo.
A Igreja não é simplesmente uma continuação do antigo Israel e a Nova Aliança não é simplesmente uma continuação da antiga! Não somos judeus! Em Cristo, tudo foi renovado: “Eis que Eu faço novas todas as coisas!” (Ap 21,5). Se a Igreja tem nas suas portas os nomes das doze tribos de Israel, tem, por outro lado, como alicerce, o Doze Apóstolos do Cordeiro: “A muralha da cidade tinha doze alicerces, e sobre eles estavam escritos os nomes dos doze apóstolos do Cordeiro”. Isso aparece muito claramente na primeira leitura da Missa de hoje: os apóstolos, assistidos pelo Espírito Santo, decidiram que os cristãos vindos do paganismo não necessitavam tornar-se judeus, não precisavam cumprir a Lei de Moisés! Os cristãos não são uma seita judaica! É interessante como os Apóstolos, ao tomarem uma decisão tão importante, tinham consciência de que eram assistidos pelo Espírito do Cristo ressuscitado: “Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós...” - foi o que eles disseram... É o que a Igreja ainda hoje diz, quando os Bispos, sucessores dos apóstolos, decidem algo sobre a fé, em comunhão com o Sucessor de Pedro, ensinam e explicam, de acordo com a Tradição perene e ininterrupta, a fé católica e apostólica. A Igreja sabe e experimente que o seu Esposo ressuscitado não a abandona; não a abandonará jamais! 
Recordemos a promessa de Jesus no Evangelho de hoje: “O Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em Meu Nome, Ele vos ensinará tudo e vos recordará o que Eu vos tenho dito”. Este Espírito Santo santifica continuamente a Igreja, guia-a, sustenta-a, vivifica-a, orienta-a! Ele é a própria Vida divina do Ressuscitado em nós, seja pessoalmente, seja como comunidade de fé. Por isso Jesus nosso Senhor olha para nós e pode dizer com toda verdade e segurança e com toda eficácia: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou! Não se perturbe nem se intimide o vosso coração. Ouvistes o que Eu vos disse: ‘Vou e voltarei a vós!’” – É verdade: o Ressuscitado permanece conosco na potência do Seu Espírito! Não precisamos ter medo, não precisamos nos sentir sozinhos, confusos, abandonados: na potência do Espírito, o Cristo estará sempre conosco!

É por isso que o Autor sagrado afirma ainda: ”Não vi nenhum templo na cidade, pois o seu Templo é o próprio Senhor, o Deus Todo-poderoso, e o Cordeiro. A cidade não precisa de sol, nem de luz que a iluminem, pois a Glória de Deus é a sua luz e a sua lâmpada é o Cordeiro”. Que imagens, irmãos amados! A Igreja, nova Jerusalém está toda imersa em Deus e no Seu Cristo. Ela mesma é Templo de Deus no Espírito Santo! Ela vive na luz do Cristo, apesar de caminhar nas trevas deste mundo! Para o mundo, que somente pode enxergar a Igreja na sua realidade exterior, ela é apenas mais uma instituição, entre tantas do mundo. Mas, para nós, que cremos, para nós somos Igreja viva, para nós que dela nascemos e nela vivemos, para nós que nos nutrimos de seus sacramentos, ela é muito mais, ela é este admirável mistério de fé! É isto que queremos dizer quando dizemos: “Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica”. Renovemos nossa fé na Igreja e mergulhemos cada vez mais no seu mistério, pois é aí, é aqui, que podemos viver na nossa vida o mistério e a salvação do Cristo, nosso Deus, que é bendito e santo, vivo e eterno pelos séculos dos séculos. Amém.


quarta-feira, 22 de maio de 2019

Cristo, razão e esperança da Igreja

Ouvi hoje alguém comentando que muitos cristãos andam desanimados: o tema insistente, obsessivo sobre os tristes e vergonhosos escândalos de pedofilia, como se esta prática hedionda e inaceitável acontecesse somente ou principalmente com os ministros da Igreja católica e se desse somente no seu seio... Em última análise, o objetivo é acuar a Igreja: se ela abrir a boca sobre qualquer tema de moral verdadeiramente cristã, o grito, a acusação, o dedo em riste estão prontos: “Calada, Igreja pedófila!” Eis o exagero feito mentira e a mentira feita arma de intimidação e deslegitimação.
Mas, não só os escândalos da pedofilia; apontaram-se-me outros motivos de desânimos:  o esfriamento da fé de muitos, a banalização da santa doutrina recebida dos Apóstolos, a relativização da moral, a mundanização no pensamento de tantos católicos, leigos e pastores...

Lembrei-me dos cristãos da Igreja dos inícios: de fora, perseguições do Império Romano; de dentro, as divisões e as decepções com irmãos que, perseguidos, renegavam a fé...

Isto mesmo: a Igreja sempre viverá em meio a tribulações, a fracassos, a perseguições e escândalos. Nunca será na terra o que terá somente no Céu: a paz da fidelidade perene de seus filhos e do gozo eterno da Glória...

Mas, escutando essas histórias, pensei numa coisa: Os verdadeiros católicos não são católicos por causa da Igreja, mas por causa do Cristo fidelíssimo, que nos amou até a Cruz e nos deu a Sua Igreja como Mãe e canal de Sua graça. Certamente, que os escândalos, a crise de fé de tantos padres e religiosos, o mau exemplo de quem deveria ser presença viva de Cristo – tudo isto nos entristece; no entanto, se compreendermos bem o que é a Igreja, se tivermos os olhos e o coração fixos no Cristo, então todas essas realidades negativas em nada tirarão a nossa paz.

Precisamos – isto sim – compreender que a Igreja não existe por si mesma e não é santa por si mesma, mas tudo recebe do Cristo. Precisamos levar a sério que é Cristo quem atrai os Seus e agindo por Sua graça operosa os congrega e os mantém firmes na fé. Não somos nós quem seguramos o povo e não somos os astros “pop stars” e interessantes, que mantêm as pessoas na Igreja... Tudo isto é um grosseiro e triste erro, é bobagem e presunção humana! Por que tantos ministros sagrados se sentem na obrigação de serem astros, de serem adaptáveis a tudo quanto é mundano, é modismo, é discurso de pensamento dominante, na ilusão de que isso atrai?
É Cristo o Astro único, é Cristo Quem atrai, é Cristo a Novidade, é Cristo Quem nos mantém fieis, é Cristo – e só Cristo – a alegria perene do nosso coração. Aliás é bom ter bem presente: quem entra na Igreja ou nela permanece por outro motivo que não Cristo, perde tempo e não está verdadeiramente na Igreja!

Angustia-me muito – mais que qualquer escândalo – ver tantos membros do clero e tantos teólogos preocupados em serem agradáveis às pessoas, atraentes e simpáticos ao mundo, gente de “boa pinta”, interessante e simpática...
Recordo de Pedro, de Paulo, de João, de Madre Teresa, de Frei Damião, de Dulce dos Pobres... Certamente, nunca procuraram ser atraentes, mas docemente, benignamente fieis!
Não somos nós quem atraímos! Não temos de ser boa gente e engraçadinhos para atrair! É Cristo Quem atrai, é Cristo o centro! A nós, basta deixar que Cristo de tal modo impregne a nossa vida que quem nos vir, veja Cristo em nós: como exigente bondade, como amor que se dá, como responsabilidade que não esconde nem omite o essencial!
Tantos pregam a secularização para atrair o povo e a mundanização da Igreja, na ilusão de se fazerem simpáticos e compreendidos; assim, criticam todo sinal do sagrado, todo distintivo religioso, vendo aí sinais de clericalismo, prepotência, mascaramento ou afastamento do povo... Desprezam tudo aquilo que ajuda a mostrar a identidade católica, a alegria da consagração e o gosto de ser diferente do mundo... Pensam que com isso estão aproximando as pessoas e se fazendo compreender pelo mundo atual... Pura bobagem ideológica e ultrapassada! O mundo grita por sinais de Deus, por marcas do eterno, por reflexos do sagrado, por gente que não tenha medo de crer, viver e testemunhar o Infinito que renova esta terra!

O que afasta o povo é uma Igreja que não dá Cristo; o que esmorece a fé são padres e religiosos que querem ser protagonistas, ao invés de darem lugar ao Cristo, único Senhor e Astro; o que cansa as pessoas são homilias que falam de tudo, mas não falam pura e simplesmente de Cristo, de Seu amor, de Sua beleza, de Seu perdão e salvação; o que torna a Igreja sem graça é o moralismo ideológico, que confunde o Reino com modelos ideológicos de sociedade, que só sabe falar em questões sociais, como se Cristo fosse revolucionário social e a Sua Esposa, uma ONG.
A Igreja não existe para si, mas para um Outro! Não deve se colocar no centro, mas deixar que Cristo seja o centro! A função da Igreja, sua razão de ser é pura e simplesmente provocar o encontro das pessoas com Jesus! Nossa questão não é pensar no que atrai o povo, mas anunciar Jesus, pura e simplesmente, com toda fidelidade, simplicidade, amor e mansidão... O resto é graça, é ação do Senhor, é misericórdia de Deus...


Oração inoportuna no meio da noite


(Deve ser rezada em voz baixa, bem baixinha, para não incomodar os irmãos que dormem...)

Senhor,
Quanta fome de Ti,
ainda hoje - talvez mais que nunca...
E Teus discípulos falam tanto de tudo e tão pouquinho de Ti...

Mandaste-nos anunciar o Teu Nome
e nos embriagamos falando de ideias,
deste-nos a Sagrada missão de anunciar o Reino que trouxeste
e o revestimos com a capa de mil ideologias, nossas, até ateias, que nada têm de Ti...

Deste-nos um Evangelho fascinante:
doce, duro, suave, cheio de misericórdia, repleto de radicalismo,
exigente de conversão...
E em nome dele, desfigurado por nós, defendemos o que Tu condenas,
condescendemos com o que Tu rejeitas claramente...
Tornamos complicada para tantos, incompreensível,
a Tua Palavra tão clara, direta, luminosa...

O Teu sim sim, não não, hoje, é avaliado pelos Teus
como insensibilidade, intransigência, integrismo...
Em nome de um tal deus politicamente correto
tantos, tantos dos Teus,
procurando os aplausos e aceitação do mundo,
garimpando comodidade e acolhimento nos salões dos que Te odeiam,
tornaram-se evangelicamente incorretos...

Senhor,
Jesus, Cristo de Deus,
o que estamos fazendo do legado que nos confiaste
na força potente do Teu Espírito?!
Senhor, por Teu amor!
Estamos nos tornando luz que não ilumina,
sal que não salga!

Senhor,
o mundo precisa de Ti,
tem absoluta necessidade da força iluminadora do Teu Evangelho santíssimo;
os corações têm sede da água vivificante da Tua graça,
a humanidade, sabendo ou não, padece pela falta dos Teus sacramentos!

Senhor, Tu nos queres simples, discípulos,
apaixonados por Ti, por Ti, pela Tua Pessoa divina,
pelos Teus traços humanos, tão iguais aos nossos
e tão reveladores do Pai!

Senhor, Tu nunca imaginaste os Teus servos
doutores de tudo
e analfabetos de Ti, do que realmente importa!
Tu nunca nos pensaste falando de tudo, opinando sobre tudo, metidos em tudo, com teorias belas e ocas sobre tudo
e tão pobres de Ti,
tão secos e frios para falar do Teu amor...

Quanta filosofia e quão pouca escuta da Tua Palavra!
Quanta teologia “científica” e quão pouco conhecimento de Ti e do que Te agrada!
Quantas palavras sobre amor, justiça, solidariedade e quão pouco amor real, pequeno, cotidiano, sacrificado, ascético, somente por amor de Ti!
Quantos projetos e técnicas e análises e programas e encontros e treinos de pastoral e missão
e quão parco ardor e entusiasmo nascidos do silêncio contemplativo, da luta pela santidade por Teu amor, do desejo sincero de Te fazer conhecido, amado, seguido, vivido, celebrado,
simplesmente porque és o Deus Salvador, única esperança e Vida para o mundo!

Tu és o mais urgente!
Tu és a maior novidade!
Tu és o único caminho!
Tu és a salvação e a solução!
Tu és a Vida, nesta vida e na outra!

Senhor, perdoa-nos!
Senhor, tem piedade dos Teus cansados e confusos discípulos deste início de terceiro milênio!

Sustenta a Tua Igreja! Livra-a dos males internos e externos
e volta para Ti o nosso coração, ó Tu, 
nosso Deus Salvador, que nos convertes. Amém.


A propósito de Jo 14,27-31a

O Senhor Jesus dá aos Seus discípulos o shalom de Deus: a paz da reconciliação com o Senhor Deus, o Eterno. Esta paz, a humanidade perdera com o pecado; somente na Cruz pascal do Senhor ela poderia ser recuperada: "O castigo que nos dá o shalom caiu sobre Ele; pelas Suas chagas fomos curados" (Is 53,5b). 

A paz que o Senhor dá aos Seus discípulos é fruto direto da ação do Seu Espírito: “Shalom, paz a vós! Recebei o Espírito Santo!” (Jo 20,19.22), disse o Senhor e continua a dizer continuamente à Sua Igreja, sobretudo na Eucaristia, quando comungamos com o Seu Corpo imolado e ressuscitado, no qual foi realizada a nossa paz, fruto da reconciliação com Deus (cf. Ef 2,13s.16)!

A paz que Cristo nos concede nada tem a ver com a paz do mundo: “Não vo-la dou como o mundo a dá!”
A paz de Cristo brota do nosso interior; é fruto único e exclusivo da ação profunda do Santo Espírito de Cristo em nós e brota da nossa união com o Cristo Salvador. Assim, mesmo na dor, na perseguição, nas provações exteriores e interiores, o cristão experimentará a paz!
Quanto à paz do mundo, depende das situações externas, é efêmera e jamais atinge as raízes do nosso ser: paz provisória, superficial, parcial, insuficiente, inconsistente...

A paz do cristão brota da experiência profunda e contínua da presença do Senhor entre nós, no âmago da vida da Sua Igreja: “Eu vou, mas voltarei a vós” na potência do Santo Espírito, no dom dos sacramentos cheios de Espírito Santo!
Este Espírito de paz brota do Pai que é fonte de tudo na Trindade Santa – por isso o Senhor diz que o Pai é maior que Ele, no sentido de que o Pai é Sua Fonte bendita, absoluta e primordial: “Se me amásseis, ficaríeis alegres porque vou para o Pai, pois o Pai é Minha fonte” – é este o sentido correto e profundo desta afirmação!
Brotando do Pai, o Espírito é eterna e totalmente derramado no Filho, que é gerado pelo Pai; do Filho, o Espírito transborda para fora da Trindade, numa explosão de Amor que tudo cria, sustenta e santifica!
É este Espírito de Amor, derramado eternamente sobre o Filho que, no tempo do nosso mundo, foi derramado de modo pleno sobre a humanidade de Jesus, ressuscitando-O dentre os mortos. Este Espírito de Amor, Espírito de Paz, Espírito-Amor, Espírito-Paz, o Senhor derrama sobre os Seus discípulos. Dizer “deixo-vos a Minha Paz” e dizer “deixo-vos o Meu Espírito” são a mesma coisa!

É este Espírito Quem convencerá o mundo, e sobretudo os cristãos, da veracidade do senhorio de Cristo Jesus! É Neste Espírito que o Senhor desmascarará o mundo e o seu Príncipe, que nada poderá contra o Senhor totalmente entregue ao Pai na Cruz e totalmente elevado em Glória na Ressurreição (cf. Jo 16,7-11)! Para o IV Evangelho, a Cruz e a Ressurreição são momentos da mesma Glória de Cristo: entregando-Se totalmente à morte em sacrifício, Ele revelou ao mundo o Seu amor pelo Pai e, ressuscitado, o Pai manifestou no Filho toda a Sua Glória (cf. Jo 12,28; 17,1), fonte de reconciliação e paz para toda a criação! E tudo isto se torna presente realmente no Altar da Eucaristia: no Seu Corpo imolado e ressuscitado está a nossa paz, a paz da Igreja, a paz da humanidade, a paz de toda a criação (cf. Ef 2,13-18)! Efetivamente, “grande é o Mistério da piedade!” (1Tm 3,16)


terça-feira, 21 de maio de 2019

A propósito de Jo 14,21-26

A Liturgia destas últimas semanas da Páscoa coloca-nos à Mesa da Última Ceia com o Senhor Jesus Cristo, o Ressuscitado que foi e continua imolado por nós. É a Eucaristia, bendito banquete sacrifical, o lugar absolutamente privilegiado para escutar o Senhor e com Ele nos encontrarmos (cf. 1Cor 11,26).

Na perícope desta segunda-feira da V semana pascal, o Senhor afirma que se alguém tem os Seus mandamentos, isto é, se os guarda, é porque O ama, é impelido pelo Espírito Santo; afinal, “o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito que nos foi dado” (Rm 5,5).
É o Espírito de Amor do Cristo que, em nós, faz-nos amá-Lo e, amorosamente, guardar os Seus mandamentos, que, no Amor, não são pesados (cf. 1Jo 5,3)! Esse Espírito de Amor não somente estabelece a comunhão profunda de Vida entre o crente e Jesus nosso Senhor, como também a comunhão com o Pai. Assim, como o Pai ama o Filho e a Ele Se dá no Espírito, assim também, o Filho, dando-nos o Seu Espírito, coloca-nos em comunhão com Ele e, através Dele, nesse mesmo Espírito, em comunhão com o Pai.

Como o amor é fonte de intimidade e de conhecimento, todo discípulo que realmente se deixa inundar e conduzir pelo Espírito do Amor de Cristo, não somente guarda os Seus mandamentos como também, mais e mais, vai conhecendo o Senhor, com um amor de comunhão, de revelação, de intimidade. Por isso mesmo, o mundo jamais poderá conhecer verdadeiramente o Cristo Jesus (cf. Jo 1,10; 17,25)! É ilusão de muitos cristãos, infelizmente, procurar e esperar do mundo compreensão, aplauso, aprovação! Nada disto! Nada disto (cf. 1Cor 1,15-25)!
O mundo em si mesmo não conhece nem reconhece a Palavra do Senhor, o mundo não O ama, o mundo é fechado para o Espírito do Ressuscitado (cf. 1Cor 2,12-16; 1Jo 5,19)!

Meus Irmãos, nunca esqueçamos: o Evangelho brotado do Coração de Cristo não é óbvio, não é de fácil acolhimento: ele gera rupturas, coloca em crise, exige conversão, demanda perseverança e combates espiritual, renúncia e capacidade de sofrer por amor! Ouvir o Senhor Jesus Cristo dá trabalho, tira-nos de nossa paz cômoda e feita sob medida (cf. Mc 1,14s; Lc 13,3ss.22-30; At 14,22)! 
Somente guiados pelo Espírito de Amor é que podemos dizer verdadeiramente, com o amor e com a obediência da fé, que “Jesus é o Senhor” da nossa vida. Sem o Espírito, somente poderemos dizer “anátema seja Jesus”, (cf. 1Cor 12,1-3) pois é impossível, para nós, sozinhos, guardar o Seus mandamentos e neles viver!

Rezemos! Imploremos ao Senhor o dom contínuo do Seu Espírito que nos é dado de modo perene nos sacramentos da Igreja, sobretudo na Eucaristia (cf. 1Jo 5,5-9a; Jo 6,51-63). Que este rio de água viva de graça, sempre o mesmo e sempre novo, nos renove (cf. Jo 4,13-14), nos converta, abra-nos os olhos, dê-nos sabedoria e docilidade de coração, a cada um de nós e à inteira Igreja, Esposa do Cordeiro e nossa Mãe católica!



sábado, 18 de maio de 2019

Homilia para o V Domingo da Páscoa - ano c

At 14,21b-27
Sl 144
Ap 21,1-5a
Jo 13,31-33a.34s

Durante todo o Tempo pascal a Igreja nos faz contemplar o Ressuscitado e o fruto da Sua obra: o dom do Espírito, a nossa santificação, os sacramentos que nascem do Seu lado aberto, a Igreja, Sua Esposa, desposada por Ele no leito nupcial da Cruz...
Hoje, precisamente, é para a Igreja, comunidade nascida da Morte e Ressurreição de Cristo, que a Palavra de Deus orienta o nosso olhar.

Primeiramente, é necessário que se diga sem arrodeios: Cristo sonhou com a Igreja, a amou e fundou-a. A Igreja, portanto, é obra do Cristo, foi por Ele fundada e a Ele pertence! Ela não se pertence a si mesma, não se pode fundar a si própria, não pode estabelecer ela própria a sua verdade. Tudo nela deve referir-se a Cristo, de Cristo depender, em Cristo viver e a Ele deve conduzir! Mas, há mais: não é muito preciso, não é muito exato dizer que Cristo “fundou” a Igreja. Não! Isto seria ainda pouco, muito pouco! A fundação da Igreja não terminou ainda: Cristo continua fundando, Cristo funda-a ainda hoje, ainda agora, nesta Eucaristia sagrada! Continuamente, o Cordeiro de pé como que imolado (cf. Ap 5,6), Cabeça da Igreja que é o Seu Corpo (cf. Cl 1,18), funda, renova, sustenta, santifica, Sua dileta Esposa pela Palavra e pelos sacramentos: “Cristo amou a Igreja e Se entregou por ela, a fim de purificá-la com o banho da água e santificá-la pela Palavra, para apresentá-la a Si mesmo a Igreja, gloriosa, sem mancha nem ruga, ou coisa semelhante, mas santa e irrepreensível!” (Ef 5,25-27). São afirmações impressionantes, belas, profundas:

(1) Cristo amou a Sua Igreja e, por ela, morreu e ressuscitou;

(2) pela Sua Morte e Ressurreição, de amor infinito, Ele purifica continuamente a Sua Igreja, santifica-a totalmente, sem desfalecer. Por isso a Igreja é santa, será sempre santa e não poderá jamais perder tal santidade, apesar das infidelidades de seus membros!

(3) Este processo de contínua fundação e santificação da Igreja em Cristo dá-se pelo “banho da água”– símbolo do Batismo e dos sacramentos em geral – e pela “Palavra”– símbolo da pregação do Evangelho. Então, Cristo continua fundando, sustentando, renovando, edificando a Sua Igreja neste mundo pela Palavra e pelos sacramentos, sobretudo o Batismo e a Eucaristia.

A Igreja não se pertence: ela é de Cristo! E, como esposa de Cristo, é nossa Mãe: ela nos gerou para Cristo no Batismo, para Cristo ela nos alimenta na Eucaristia e de Cristo ela nos fala na sua pregação! Ela é a nossa Mãe católica, desposada pelo Cordeiro imolado na Sua Páscoa, como diz o Apocalipse: “estão para realizar-se as núpcias do Cordeiro e Sua Esposa já está pronta: concederam-lhe vestir-se com linho puro, resplandecente!” (19,7s).

Pois bem, esta Igreja, tão amada por Cristo, tão nossa Mãe, deve caminhar neste mundo nas dores de parto. Temos um exemplo disso na primeira leitura da Missa de hoje. Paulo e Barnabé vão animando as comunidades, “encorajando os discípulos a permaneceram firmes na fé”, pois “é preciso que passemos por muitos sofrimentos para entrar no Reino de Deus”. Assim caminha o Povo de Deus, Comunidade fundada por Cristo e vivificada pelo Seu Espírito: entre as tribulações do mundo e as consolações de Deus.
Muitas vezes, a Igreja enfrentará dificuldades por parte de seus inimigos externos – aqueles que a perseguem direta ou veladamente, aqueles que desejam o seu fim e, vendo-a com antipatia, trabalham para difamá-la. Mas, também, muitas vezes, a provação vem de dentro da própria Igreja: das fraquezas de seus membros, das infidelidades à doutrina católica e apostólica “uma vez por todas confiada aos santos” (Jd 3), dos escândalos provocados pela humana fraqueza daqueles que deveriam dar exemplo de uma vida nova em Cristo Jesus. Se é verdade que isto não fere a santidade da Igreja - porque essa santidade vem de Cristo e não de nós -, por outro lado, é verdade também que nossos escândalos e maus exemplos, nossas ambiguidades e falta de obediência à norma da fé, atrapalham e muito a credibilidade do nosso anúncio do Evangelho e a credibilidade do próprio Evangelho como força que renova a humanidade!

Infelizmente, enquanto o mundo for mundo, enquanto a Igreja estiver a caminho, experimentará em si a debilidade de seus membros. Assim, foi no grupo dos Doze, assim, nas Igrejas diocesanas do Novo Testamento, assim no tempo que se chama hoje. É interessante que o Evangelho hodierno começa com Judas, o nosso irmão, que traiu o Senhor, saindo do Cenáculo, saindo do grupo dos Doze, saindo da Comunidade dos discípulos:“Depois que Judas saiu do cenáculo”...– são as primeiras palavras do Evangelho... E, no entanto, apesar da fraqueza de Judas e dos Doze, apesar da nossa fraqueza, Jesus continua nos amando e crendo em nós: “Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como Eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. Nisto todos conhecerão que sois Meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros”. Não tenhamos medo, não desanimemos, não nos escandalizemos: o Senhor está conosco, ama-nos, porque somos o Seu rebanho, as Suas ovelhas, a Sua Igreja. Ama-nos e derramou sobre nós o Seu amor e Sua força que é o Espírito Santo!

Se agora vivemos entre tribulações e desafios externos e internos, nossa esperança é firmemente alicerçada em Cristo. Nele, venceremos, Nele, a Mãe católica, um dia, triunfará, totalmente glorificada e tendo em seu regaço materno toda a humanidade. Ouçamos – é comovente:

“Vi um novo céu e uma nova terra... O primeiro céu e a primeira terra passaram e o mar já não existe” – o Senhor nos promete um mundo renovado, sem a marca do pecado, simbolizado pelo mar.
“Vi a Cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus, vestida qual esposa enfeitada para o seu marido”. - É a Igreja, totalmente renovada pela graça de Cristo, totalmente Esposa, numa eterna aliança de amor, realizada na Páscoa e consumada no fim dos tempos!
“Esta é a morada de Deus entre os homens. Deus vai morar no meio deles. Eles serão Seu povo, e o próprio Deus estará com eles”. - A Igreja é o “lugar”, o “espaço” onde o Reino acontece visivelmente: Deus, em Cristo, habita no nosso meio e será sempre “Deus-com-eles”, Deus-conosco, Emanuel!
“Deus enxugará toda lágrima dos seus olhos. A morte não existirá mais, e não haverá mais luto, nem choro, nem dor, nem morte, porque passou o que havia antes. Aquele que está sentado no trono disse: ‘Eis que Eu faço novas todas as coisas’”.

Caríssimos, olhai para mim, olhai-vos uns para os outros! Somos o rosto da Igreja, o cheiro da Igreja, a fisionomia da Igreja, a fraqueza e a força, a fidelidade e a infidelidade, a glória e a vergonha da Igreja! Tão pobre, tão frágil, tão deste mundo, mas também tão destinada à glória, tão divina, tão santa, tão católica, tão de Cristo! Coragem! Vivamos profundamente nossa vida de Igreja; é o único modo de ser cristão como Cristo sonhou! Soframos Glória! Como diz o Apocalipse, “estas palavras são dignas de fé e verdadeiras”. Amém.


A propósito de Jo 14,7-14

Somente Jesus nosso Senhor é o acesso para um mais profundo conhecimento de Deus. Ele veio do Pai, Ele é o Filho amado, que vive eternamente no seio do Pai e, no Amor, que é o Santo Espírito, é um só com o Pai, na perfeito e inenarrável unidade!  Pois bem, reconhecer Jesus nosso Senhor como o Filho eterno do Pai, que estava com Ele e Nele antes que o mundo existisse, desde toda a Eternidade, é conhecer também o verdadeiro Deus. Israel sabia que Deus é Um, que Deus é o Eterno, o Santo. Mas, Israel nunca imaginou que Deus é, essencialmente, Pai: o Eterno Pai do Eterno Filho na Eterna comunhão fecunda do Espírito de Amor! Somente reconhecendo Jesus Cristo como o Amado do Pai, Aquele que o Pai consagrou e enviou ao mundo, pode-se saber e experimentar e contemplar que o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó é essencialmente o Pai Eterno, um só com o Eterno Filho na comunhão do Eterno e Santo e Vivificante Espírito! “Se Me conhecêsseis, conheceríeis também o Meu Pai”,saberíeis que o vosso Deus é o Meu Pai!

Por isso, “quem Me viu, viu o Pai: Eu estou no Pai e o Pai está em Mim!” Eis por que somos cristãos, eis por que adoramos o Cristo Jesus, eis por que a Ele e por Ele damos a vida: Ele é o Deus verdadeiro vindo do Deus verdadeiro! Somente Nele o mundo e tudo quanto nele existe – e nós mesmos – tem existência e consistência!

E todo aquele que crê no Cristo de Deus e Nele é batizado, recebe o Seu Espírito. Este Espírito divino e divinizante, habitando em nós permanentemente, dá-nos a graça de continuar a obra de Cristo, Nele e por Ele fazendo mil coisas, mais abrangentes, criativas do que aquelas que Ele mesmo fez nos dias em que esteve entre nós! Não porque sejamos maiores que Ele, mas porque é Ele mesmo, ressuscitado, glorificado, Senhor de tudo, que, no Seu Espírito, age em nós e em nós glorifica o Seu Nome e o nome do Pai! Isto mesmo: no Espírito que o Filho glorificado recebeu do Pai e derrama continuamente sobre a Igreja pelos sacramentos, o Cristo Jesus continua agindo e realizando a Sua missão de Enviado do Pai, até que este mundo chegue ao seu termo, a história entre na Glória, o tempo desemboque na Eternidade e Deus o Pai, através do Filho Senhor, na potência do Espírito Vivo e Vivificante, seja tudo em todos. Então, o Reino estará consumado, e nós, plenos, e o mundo totalmente plenificado! Maranathá! Passe este mundo e venha a Tua graça! Bem, Senhor Jesus!


sexta-feira, 17 de maio de 2019

A propósito de Jo 14,1-6

No mundo, em meio às incertezas e vicissitudes próprias da existência, o cristão não deveria se deixar tomar pela perturbação em seu coração: o nosso Senhor está conosco e vai guiando a Sua Igreja e cada um de nós para o destino que nos preparou: o Coração do Pai, pronto para dar guarida a todos.

Sim, nosso destino, o destino de toda a humanidade e de toda a criação é o Pai. Ele é o Destino absoluto! Não chegar a Deus é frustrar-se, é fracassar radicalmente na existência, tornando a vida uma grande mentira, um insuportável absurdo. 

Mas, qual o caminho para se chegar a Deus, saudade do nosso coração, anelo da nossa alma?
O Caminho único, exclusivo, suficiente, reto, é Jesus nosso Senhor! Quaisquer propostas, quaisquer vielas, quaisquer desvios ou atalhos que afastem desse Caminho, nos colocarão a perder, destruirão a nossa existência! Nunca esqueçamos: o Caminho é Jesus nosso Senhor! Só Ele!

Ele é o Caminho porque somente Ele é a nossa Verdade. Viver Nele é viver naquilo para que fomos criados, é viver autenticamente, é viver verdadeiramente. Afastar-se dessa Verdade é viver uma ilusão, uma mentira, é fazer da vida uma realidade inautêntica, sem verdadeira consistência, privada de sentido mais profundo.

Ele é também a Vida, a nossa Vida, Vida plena, Vida divina, Vida eterna! Somente Jesus nosso Senhor pode nos dar aquela Vida de que nosso coração tem fome e sede; Vida que nada nem ninguém pode nos obter, porque não provém deste mundo, mas do próprio Deus Vivo e Vivificante!

Não tenhamos medo: Ele, o nosso Senhor, é fiel, Ele está no Pai, Ele nos conduz ao Pai, Ele nos fará participantes em plenitude da Glória do Pai! Nele, nossa vida tem sentido, nosso caminhar neste mundo tem direção!
Vamos, levantemo-nos, mantenhamos os olhos fixos em Cristo, o Autor e Consumador da nossa fé (cf. Hb 12,2). A Ele a glória para sempre!


Em Cristo, a possibilidade de uma vida realmente nova

Tome, Irmão, a Palavra das Escrituras: Cl 2,12-14. Aí, São Paulo faz três afirmações de profunda penetração teológica:

1. “Com Cristo fostes sepultados no Batismo; com Ele também fostes ressuscitados por meio da fé no Poder de Deus, que ressuscitou a Cristo dentre os mortos”.

Nunca será demais repetir e incutir no coração do Povo de Deus que os sacramentos não são simples cerimônias. Sacramento não é mágica, não são cerimônias privadas, festas sentimentais de família, celebrações íntimas e emotivas!

Ele são os sagrados mistérios, que realizam em cada cristão e na Igreja toda o mistério do próprio Cristo Jesus: celebrando-os, recebemos de modo próprio a cada um deles, o Espírito do Cristo imolado e ressuscitado, que nos dá a Sua Vida e nos configura a Ele, nosso Salvador e modelo.
É o caso do Batismo, de que fala o Apóstolo aqui: realmente por obra do “Poder de Deus” (que é o Espírito Santo), fomos realmente sepultados com Cristo e com Ele, ressuscitados.
Primeiro cremos (“por meio da fé”, diz São Paulo). Crendo, pedimos o Batismo, que nos dá o Santo Espírito, simbolizado e transmitido pela água batismal.
O que esse Espírito faz em nós? Faz-nos participantes primeiramente da Morte de Cristo, mergulha-nos na Sua Morte:

a. O homem velho começa a morrer em nós, pois a presença do Espírito abre-nos para Deus, corrigindo o fechamento próprio da nossa natureza pecadora.

b. As mortes (contradições e negatividades) da vida, vamos, então, vivenciando-as em união com Cristo, vamos morrendo com Ele, fazendo de tudo isso uma participação na Sua Morte redentora e sacerdotal.

c. Mas também, com Ele, tudo isso vai se tornando vida nova, modo de viver que já nos prepara para a Vida eterna. É um mistério estupendo: já neste mundo, desde o Batismo, a Páscoa de Cristo vai acontecendo em nós, fazendo seu caminho na nossa vida – e isto é uma realidade enorme na nossa pobre existência: nosso viver se torna viver com Cristo, viver por Cristo, viver em Cristo, realmente!

2. “Ora, vós estáveis mortos por causa dos vossos pecados, e vossos corpos não tinham recebido a circuncisão, até que Deus vos trouxe para a Vida, junto com Cristo, e a todos nós perdoou os pecados”.

É a confirmação do que afirmei logo acima: estávamos numa vida de morte, pois o pecado, a vida sem Deus nos mata ao tirar o verdadeiro sentido da existência: sem Deus, o homem não tem consistência e a vida padece de falta de um sentido mais profundo, que lhe dê um sentido global. Viver longe de Deus é viver na ilusão, na superficialidade, na morte.
Quando São Paulo diz que nossos corpos não tinham recebido a circuncisão, ele recorda que os efésios, como também nós, não sendo judeus, não tínhamos a graça de ser Povo da Aliança. Ora, com Cristo, o importante não é mais ser judeu ou grego, escravo ou livre: o que importa é, pela fé, aderir a Cristo e Nele ser batizados, sendo Nele mortos e ressuscitados!

3. “Existia contra nós uma conta a ser paga, mas Ele a cancelou, apesar das obrigações legais, e a eliminou, pregando-a na Cruz”.

O Apóstolo recorda a gravidade da situação humana: havia contra nós uma sentença de morte; “éramos, por natureza, filhos da ira” (Ef 2,3) e de Deus, éramos “inimigos, pelo pensamento e pelas obras más” (Cl 1,21) e a “ira de Deus”permanecia sobre nós (cf. Jo 3,36). Cristo rasgou esta sentença de morte na Sua bendita e salvífica Cruz!

Hoje, por infelicidade, há uma grande tendência a esquecer isso. A ideologia do relativismo, do politicamente correto e do multiculturalismo tende a enganar, insinuando que a humanidade é boazinha e tudo que ela produz é bom; cego e pervertido seria quem não vê a bondade da nossa cultura, tão livre, espontânea e cheia de boas intenções... Ora, isso é falso e contrário à concepção cristã! A humanidade, criada boa e essencialmente boa, é, no entanto, ferida, pervertida e, sozinha, não se encontra nem encontra o caminho; a humanidade é um poço de contradições (cf. Rm 7,14-25)... Somente em Cristo o homem encontra o perdão dos pecados e a paz com Deus, somente em Cristo o homem recebe a Vida eterna (cf. Jo 17,3; Ef 1,7)! Não há salvação possível fora de Cristo e Cristo é o único Salvador que Deus deu à humanidade: crer Nele e a Ele aderir é o caminho que Deus sonhou e deseja para todo homem que vem a este mundo (cf. Jo 1,9; 17,3; At 4,12)!

Medite sobre estas palavras do santo Apóstolo. Que cresça sempre mais nossa fé, nosso amor, nossa adesão total e incondicional ao Cristo, nosso Deus Salvador!


quinta-feira, 16 de maio de 2019

A propósito de Jo 13,16-20

Jesus Cristo é o único Senhor; Jesus Cristo é o único Mestre. Na Igreja não há outros senhores ou mestres. Qualquer um que seja líder, pastor do rebanho ou mestre do Evangelho, deve, fielmente, transmitir o que recebeu do Senhor pela Tradição escrita ou oral, presente na vida da Igreja por ação do Santo Espírito de Cristo. Na Igreja, o verdadeiro mestre em Cristo, o verdadeiro pastor no Cristo Bom Pastor, deve sempre poder exclamar: “Lembro-vos, irmãos, o Evangelho que vos anunciei, que recebestes, no qual permaneceis firmes e pelo qual sois salvos, se o guardais como vo-lo anunciei; doutro modo teríeis acreditado em vão. Transmiti-vos, em primeiro lugar, aquilo que eu mesmo recebi!” (1Cor 15,1-3a).

Nenhum cristão está acima de Cristo; nenhum cristão está no mesmo nível de Cristo! Interessante que o nosso Salvador, naquela última Ceia, tenha dito estas coisas e, no mesmo instante, tenha também feito referência ao discípulo que, mesmo sendo chamado e, sentando-se à Sua Mesa, comendo com Ele, O traíra, levantando contra o seu Mestre o calcanhar da ingratidão...

Sim, é bem possível dizer-se cristão e trair o Senhor; é possível ser pastor da Igreja e se esquecer que o discípulo não é maior que o Mestre nem o enviado, maior que Aquele que o enviara... E tudo isto fere, gera escândalos, traz sofrimentos, denigre a vida da Igreja...
Uma coisa é certa: aquele que se coloca fora do seguimento do Mestre, alienando-se do caminho que Ele traçou, não pode ser recebido como um Seu enviado! Somente é verdadeiramente enviado aquele discípulo que se comporta segundo o Mestre e fala o que Dele ouviu e aprendeu, bebendo na perene Tradição de fé e de vida da santa Igreja, Corpo de Cristo e Templo do Santo Espírito, Tradição esta presente nas Escrituras e na existência mesma da Igreja, geração após geração...

Mas, não devemos nunca nos assustar: “Desde agora vos digo isto, antes de acontecer, a fim de que, quando acontecer, creiais que Eu Sou”.