domingo, 29 de julho de 2018

Um Deus que cria a partir de pobres pães de cevada

A Palavra de Deus é sempre consolo para quem dela se aproxima com fé, com um coração crente, humilde e pobre. Ela é como a sarça ardente: crepita o fogo do Santo Espírito, sem se consumir jamais. E de dentro dela, o Senhor sempre nos chama, e chama-nos pelo nome, como chamou Moisés.

Pode-se estudar exegese, pode-se fazer curso sobre as Escrituras, pode-se fazer doutorado em ciências bíblicas, mas somente compreenderá a Palavra de Deus quem dela se aproxima com humildade, com fé, com um coração que escuta! Quem não se aproxima assim do texto santo, somente encontrará literatura antiga... Mas, nunca, nunca, nunca beberá da fonte viva e vivificante que é a Palavra do Deus vivo!

Escrevo isto para comentar o texto que serve de primeira leitura para este XVII Domingo Comum, Ano B: 2Rs 4,42-44.

Estamos no século IX antes de Cristo, no Reino do Norte, Reino de Israel, no tempo do Profeta Eliseu... Nesta época, existiam em Israel várias confrarias de profetas: viviam em comum e profetizavam de modo meio primitivo, meio exótico: dançavam, cantavam e entravam em transe... Falavam, então, em nome do Senhor...  Eram pobres e muito religiosos... O povo os venerava, os respeitava e também, por vezes os discriminava, porque eram esquisitões, exóticos: uns “videntes” meio malucos... Mais tarde, no século  VIII aC, Amós dirá a Amasias: “Não sou profeta nem filho de profetas” (cf. Am 7,14), isto é, não pertenço a confraria, a irmandade de profetas...

Pois bem: chega um homem onde estava Eliseu. Esse alguém é de Baal-Salisa, localidade próxima de Gilgal, onde se encontrava o profeta (cf. 4,38). Não se assuste com o nome baal... Ele significa simplesmente “senhor” e, por aqueles tempos, poderia até ser aplicado ao Deus de Israel...

Era um tempo de fome, este no qual esses fatos se deram... Eliseu estava com os irmãos profetas... Eram muitos os que ali se encontravam: os membros da irmandade, amigos dos profetas, devotos, talvez parentes... Mais de cem pessoas... Eram gente pobre, do povo...

O homem de Baal-Salisa trouxe pães feitos de cevada, das primícias da colheita daquele ano... Vinte pães... O pão de cevada é a comida dos pobres, dos camponeses... Pão bom mesmo era o pão de trigo... Esse pão de cevada é feito a nossa vida, é feito as nossas obras: pesem os nossos esforços, nossa vida é parca, é pobre e o que fazemos muitas vezes é tão misturado com intenções que não são tão puras como deveriam... Mas, como esses pães, são fruto do nosso esforço e da nossa boa vontade...

Eliseu manda o homem alimentar cerca de cem pessoas com apenas vinte pães... “Como hei de servir isto para cem pessoas?” O homem tem juízo; o profeta não sabe calcular... Pelo menos, não calcula com a lógica humana, com a medida humana, segundo as humanas possibilidades... Profeta não tem juízo mesmo! “Oferece a esta gente para que coma, pois assim falou o Senhor: ‘Comerão e ainda sobrará!’” Isto será sempre uma guerra, uma tensão: a nossa medida e a medida de Deus, a lógica do Senhor e a lógica humana, as possibilidades na perspectiva nossa e aquelas outras, segundo a perspectiva de Deus! O profeta é meio maluco porque vê sempre da perspectiva de Deus, tão difícil de ser compreendida por nós!

Pois bem, o homem “serviu-lhes, eles comeram e ainda sobrou, segundo a palavra do Senhor!” A Palavra do Senhor é potente, é criadora, faz acontecer: onde não há nada, ela suscita, ela faz a vida brotar!

Assim, naquela reunião esquisita, de gente mais esquisita ainda, a partir de alguns pães de pobres, a Palavra criadora de Deus mostrou sua fecundidade, que sacia a fome e sustenta a vida!

Quem dera que com nossos pobres pães de cevada confiássemos em Deus... O Senhor faria por nós maravilhas; Ele nos revelaria a Sua presença e o esplendor da Sua Face bendita!


sábado, 28 de julho de 2018

Homilia para o XVII Domingo Comum - Ano B

2Rs 4,42-44
Sl 144
Ef 4,1-6
Jo 6,1-15

Salta à vista o tema do pão na liturgia de hoje: ele aparece claramente na primeira leitura e no Evangelho e, de modo implícito, está presente também no salmo.
Na tradição bíblia, o pão recorda duas coisas importantíssimas. Lembra-nos, primeiramente, que não somos autossuficientes, não possuímos a vida de modo absoluto: devemos sempre renová-la, lutar por ela. O homem não se basta a si próprio; precisa do pão de cada dia. E aqui, um segundo importante aspecto: o homem não pode, sozinho, prover-se de pão: é Deus quem faz a chuva cair, quem torna o solo fecundo, quem dá vigor à semente. Assim, a vida humana está continuamente na dependência do Senhor. Portanto, meus caros, todos necessitamos do pão nosso de cada dia – e este é dom de Deus. “O que tens tu, ó homem, que não tenhas recebido? E, se recebeste, do que, então, te glorias?”

Desse modo, caríssimos irmãos em Cristo, Jesus, ao multiplicar os pães, apresenta-Se como aquele que dá Vida, que nos sacia com o sentido da existência – sim, porque não há vida de verdade para quem vive sem saber o sentido do viver! – Dá-nos, Jesus a vida física, a vida saudável, mas dá-nos, mais que tudo, a razão verdadeira de viver uma vida que valha a pena! Dá-nos, enfim a Vida que é Tua, a Vida divina, a Vida eterna, Vida imperecível!

Mas, acompanhemos com mais detalhes a narrativa do Quarto Evangelho. Jesus, num lugar deserto, estando próxima a Páscoa, Festa dos judeus, manda o povo sentar-se sobre a relva verde, toma uns pães e uns peixes, dá graças, parte, e os distribui, multiplicando os pães e os peixes. Todos comeram e ficaram saciados. Não aparece no Evangelho deste Domingo, mas sabemos, pela continuação do texto de São João, que o povo, após o milagre, foi à procura do Senhor e Ele recriminou duramente a multidão: “Vós Me procurais não porque vistes os sinais, mas porque comestes pão e ficastes saciados!”
Que sinal o povo deveria ter visto?
Recordemos que no final do trecho que escutamos no texto que foi proclamado hoje o povo exclama: “Este é verdadeiramente o Profeta que devia vir ao mundo”. Eis: o povo até que começou a discernir o sentido do milagre de Jesus; mas, logo depois, fascinado simplesmente pelo pão material, pelas necessidades de cada dia, esquece o sinal. Insistimos na pergunta: que sinal?
Primeiro, que Jesus é o Novo Moisés, aquele profeta que o próprio Moisés havia anunciado em Dt 11,18: “O Senhor Deus suscitará no vosso meio um profeta como eu”. Pois bem: como Moisés, Jesus reúne o povo num lugar deserto, como Moisés, sacia o povo com o pão... Mas, Jesus é mais que Moisés: Ele é o Deus-Pastor que faz o rebanho repousar em verdes pastagens (“Havia muita relva naquele lugar... Jesus mandou que o povo se sentasse...”) e lhe prepara uma mesa. Era isso que o povo deveria ter compreendido; foi isso que não compreendeu...

E nós, compreendemos os sinais de Cristo em nossa vida? Somos capazes de descortinar o sentido dos Seus gestos, seja na alegria seja na tristeza, seja na luz seja na treva? Os gestos de Jesus na multiplicação dos pães é também prenúncio da Eucaristia. Os quatro gestos por Ele realizados – tomou o pão, deu graças, partiu e deu – são os gestos da Última Ceia e de todas as ceias que celebram o Sacrifício eucarístico do Senhor:

na apresentação das ofertas tomamos o pão,
na grande oração eucarística (do prefácio à doxologia – “Por Cristo, com Cristo...”) damos graças,
no “Cordeiro de Deus” partimos
e na comunhão distribuímos.

Eis a Missa: o tornar-se presente dos gestos salvíficos do Senhor, dado em sacrifício e recebido em comunhão.

Vivendo intensamente esse Mistério, nos tornamos realmente membros do Corpo de Cristo, que é a Igreja. Cumprem-se em nós, de modo real, as palavras do Apóstolo: “Há um só Corpo e um só Espírito, como também é uma só a esperança a que fostes chamados. Há um só Senhor, uma só fé, um só Batismo, um só Deus e Pai de todos, que reina sobre todos, age por meio de todos e permanece em todos”.
Eis, caríssimos! Que o bendito Pão do Céu, neste sinal tão pobre e humilde do pão e do vinho eucarísticos, nos faça compreender e acolher a constante presença do Senhor entre nós e nos dê a graça de vivermos de verdade a vida de Igreja, sendo um sinal Seu no meio do mundo. Amém. 



sexta-feira, 27 de julho de 2018

A vida: imenso dom de um Amor sem fim

Recentemente li que muitas mulheres estão congelando seus óvulos até que encontrem seu parceiro ideal ou até que se realizem profissionalmente. Então, sim, engravidarão.
É o ser humano que, tornando-se seu próprio deus, dono de si mesmo sem de si mesmo ser dono, termina por vilipendiar o próprio ser humano. Para quem crê, todos os seres merecem nosso respeito e, de modo particular, o ser humano, imagem de Deus!

A vida é dom de Deus, que tudo criou livremente por amor. Explicar os mecanismos do seu aparecimento, desde as formas mais simples até aquelas mais complexas, é tarefa das ciências.
O que a fé nos diz é que toda vida tem sua origem em Deus, é dom de Deus e somente Ele é o Senhor da vida. Por isso, mesmo diante das criaturas mais simples, o homem deve ter uma atitude de respeito, de veneração. Não podemos fazer o que bem entendemos com o mundo, que não é simples natureza, mas é criação, resultado de um Amor eterno que, do nada, tudo chamou à existência. Somos os mordomos, os guardiões, não os donos. É verdade que o homem é a principal das criaturas deste mundo visível, mas não é seu senhor absoluto... Aqui se radica a intuição fundamental para uma sadia ecologia cristã. O homem tem o direito de usar a criação, pode alimentar-se de vegetais e animais... Mas, não pode abusar, não pode desperdiçar nem tiranizar... "Tudo o que se move e possui vida vos servirá de alimento; tudo isso Eu vos dou, como vos dei a verdura das plantas. Mas, pedirei contas do sangue de cada um de vós: Eu pedirei conta da alma da vida do homem!" (Gn 9,3ss)

O homem é imagem de Deus, tem uma dignidade imensa, inalienável. Ele não é simplesmente um ser em meio aos outros! Só ele é imagem do Criador: seu coração é aberto para o infinito, tem sede do transcendente; o núcleo do seu coração abriga sua consciência, que tem uma dignidade inalienável! Por isso o homem não pode ser manipulado, vilipendiado, coisificado: “Eu pedirei contas da vida do homem. Porque à imagem de Deus o homem foi criado” (Gn 9,5.6).

É pecado gravíssimo tudo quanto atentar contra a imagem de Deus: o aborto, a manipulação genética, a fecundação in vitro, as experiências com embriões para obter células-tronco, a eutanásia, a situação de pobreza que denigre a dignidade humana, o consumo de drogas, o desrespeito ao corpo humano pela prostituição, a imoralidade, o adultério, a fornicação... O homem é sagrado, absolutamente sagrado! E isto somente fica claro de modo absoluto e sem apelo quando reconhecemos um Deus criador! Caso contrário, todo discurso sobre dignidade humana e direitos do homem fica gravemente relativizado e manipulável pelo próprio homem...

Infelizmente, na nossa sociedade que se quer tão humana, vemos, na verdade, o ser humano ser vilipendiado na sua dignidade de imagem de Deus, na singularidade da sua existência, no desrespeito e dessacralização do seu corpo, do seu amor, da sua família, da sua sexualidade, da sua dor, da sua concepção, da sua morte... Sem Deus, o homem não passa de um ser qualquer, diferente dos outros apenas por um acidente, uma peça da natureza maluca chamada racionalidade, consciência, que já não é um dom, mas um peso, um absurdo, uma peça de mal gosto! Assim,  em pleno século XXI, é preciso dizer novamente, com serenidade e força: somente à luz de um Criador, somente afirmando Deus, o homem pode perceber sua real dignidade, seu valor único e inegociável, E não só a humanidade, mas cada homem, cada pessoa, independente de qualquer outras considerações! É humano, é imagem de Deus, é sagrado, do momento misterioso, sublime e solene da concepção no ventre materno até o último suspiro, quando se deixa este mundo! Simples assim; verdadeiro assim; sublime assim; humano assim, divino assim!


quarta-feira, 25 de julho de 2018

As Santas Escrituras segundo a fé da Igreja de Cristo

Amigo, vai aqui um pouco de catequese para que nossas ideias sejam realmente católicas, fieis à constante Tradição Apostólica presente na Igreja de Cristo: 

A Bíblia não é um livro único; é uma coleção de 73 escritos, produzidos num arco de cerca de 1.300 anos.
Neles, nesses livros, está contida a Palavra de Deus, porque foi o próprio Espírito do Senhor quem, misteriosamente, como só Ele sabe fazer, inspirou tudo quanto os autores sagrados escreveram.
É um incrível e admirável mistério: por trás das palavras humanas dos autores daqueles textos está a Palavra única do próprio Deus!
As palavras da Sagrada Escritura são tão humanas: há erros gramaticais, erros de história, erros de ciência; há o modo de escrever próprio de cada autor humano e até mesmo o seu modo de pensar, limitado pelo tempo e a cultura a que pertenceram, pode ser descoberto naqueles dizeres tão humanos... Na grande maioria dos casos, nem mesmo os autores sagrados imaginavam que o que estavam escrevendo eram textos inspirados pelo Senhor...

Foi o Povo de Israel, no tempo da Antiga Aliança e, depois, nestes tempos da Nova e eterna Aliança, foi a Igreja católica, inspirada pelo Espírito do Cristo Senhor, que permanece nela e a conduz sempre mais à verdade plena (cf. Jo 16,12-15; 1Tm 3,15), quem foi discernindo quais escritos eram inspirados por Deus e quais não eram...
Este trabalho de discernimento de quais eram os livros inspirados por Deus, dentre os tantos que os cristãos escreveram no período apostólico, foi feito pela santa Igreja a partir do século II, século após século, e foi autoritativamente determinado no Concílio de Trento. E a Igreja, Esposa do Cristo,  fez tal discernimento serenamente, pois sabe muito bem que o seu Senhor não a abandona (cf. Mt 16,19; 18,18; 28,19-20; Jo 14,18).

Só a Igreja tem a autoridade de fazer esse discernimento; e ela o fez, com a autoridade que o Senhor mesmo lhe concedeu e a assistência divina do Espírito Santo que Cristo Jesus lhe garantiu.
De modo geral, seguiram-se os seguintes critérios: eram inspirados pelo Espírito de Deus (1) os escritos tidos como ligados diretamente à Tradição Apostólica, mais especificamente,  os escritos considerados de origem direta ou indireta de um Apóstolo e (2) os escritos proclamados na Liturgia sobretudo das grandes Igrejas da Antiguidade, de modo especial Roma, Alexandria e Antioquia e as demais Igrejas apostólicas, isto é, as comunidades fundadas diretamente pelos Apóstolos ou seus auxiliares, os varões apostólicos.
Foi assim que a santa Mãe católica, com o instinto de fé que o Cristo Senhor lhe concede na força do Santo Espírito, fez este discernimento tanto dos livros do Antigo quanto do Novo Testamento. Por isso mesmo, alguns livros do Antigo Testamento que os judeus não consideram inspirados por Deus - e isto por motivo nacionalista e por polêmica com os cristãos -, a Igreja desde cedo os utilizou e os considerou como sendo Palavra de Deus, sendo vários deles citados no Novo Testamento direta ou indiretamente.

Mas, que se esteja bem atento: Deus não Se revelou primeiramente na Bíblia! Revelou-Se na história do povo de Israel e, na plenitude dos tempos, revelou-Se de modo pleno na Pessoa de Jesus Cristo, o próprio Filho eterno feito carne, feito homem.
A Palavra de Deus por excelência não é a Bíblia; é Jesus Cristo, o Verbo, a Palavra que Se fez carne e habitou entre nós!
A Bíblia nos traz o testemunho dessa revelação: ela pode ser chamada Palavra de Deus somente porque nos traz a Palavra que é Jesus; de modo que nas palavras da Bíblia, encontramos a Palavra de Deus e esta Palavra é o nosso bendito Salvador, Jesus Cristo, o Verbo eterno feito carne!
Do Gênesis ao Apocalipse, a mensagem última das Escrituras Sagradas é sempre Jesus: Jesus prometido, preparado e anunciado no Antigo Testamento; Jesus aparecido, entregue, contemplado, aprofundado, adorado e proclamado no Novo Testamento. Toda a Escritura santa é uma pedagogia para o Cristo, todas as palavras das Escrituras condensam-se em Cristo, toda e cada passagem da Escritura em Cristo encontra sua clareza, seu sentido último.  Como diziam os medievais, Cristo é a Palavra abreviada, concisa, desdobrada nas palavras das santas Escrituras. Como dizia Santo Elredo de Rieval: “Jesus é a Palavra breve, mas que diz tudo e tudo leva à perfeição sobre a terra, ponde fim à Lei e aos profetas com o duplo mandamento do amor”.  São João da Cruz, num de seus escritos, assim imagina o Pai nos falando: “Já te disse todas as coisas em Minha Palavra; põe os olhos unicamente Nele; porque Nele tenho dito e revelado tudo, e Nele encontrarás ainda mais do que desejas saber. Este é o Meu Filho amado: escutai-O”.

Assim sendo, não cremos na Bíblia; cremos em Jesus e só a Ele adoramos! Temos as Escrituras por revelação do Senhor precisamente por causa de Jesus, porque Ele disse que elas dão testemunho Dele:“Vós perscrutais as Escrituras porque julgais ter nelas a Vida eterna; ora, são elas que dão testemunho de Mim!” (cf. Jo 5,39)
Não amamos Jesus por causa da Bíblia; amamos a Bíblia por causa de Jesus! Como também não cremos na Igreja por causa da Bíblia, mas cremos que a Bíblia é Palavra de Deus porque a Igreja nos ensinou assim! Cremos na Igreja por causa de Jesus e consideramos as Escrituras como Palavra de Deus por causa da Igreja!

Jesus Cristo! Ele o centro, é Ele a Palavra única do Pai!
Quando escutamos, quando lemos as Escrituras e nelas meditamos, em última análise é Jesus mesmo que procuramos, é a Ele que encontramos, com Sua salvação, Sua Vida, Sua plenitude, aquela da qual recebemos graça sobre graça! No século XII, o grande teólogo Hugo de São Vítor exclamava: “Toda a divina Escritura constitui um único livro e este único livro é Cristo, porque toda a Escritura fala de Cristo e encontra em Cristo o seu cumprimento”.
Por isso, no caminho de Emaús, em cada Missa e até mesmo a cada vez que entramos em contado com a Sagrada Escritura, Corpo verbal do Senhor imolado e ressuscitado, Jesus mesmo nos fala Dele e nos revela no texto sagrado tudo quanto diz respeito a Ele e ao plano de salvação do Pai que Ele, o Filho amado, veio realizar. Deste modo, quem frequenta a Escritura e em cada parte dela não encontra o Cristo, não a compreende, tendo o entendimento encoberto por um véu que impede de saborear o sentido último desses textos sagrados.

Assim é que a Igreja, impelida pelo Santo Espírito, escutando as Escrituras cheias do Santo Paráclito, escuta o próprio Deus que nos fala em Jesus, o Verbo único e eterno, e tudo quanto ali está escrito torna-se uma Palavra viva para nós, tudo quanto Deus revelou na história do Seu Povo e maximamente em Jesus Cristo, torna-se presente na vida da Igreja, sobretudo nos sacramentos, e na nossa, que somos membros do Seu Corpo.

Pensando bem, é impressionante pensar que Deus nos fala: fala à Sua Igreja, fala a cada um de nós, na Sua Palavra que é Jesus Cristo Senhor nosso (cf. Hb 1,1-2)!

Mas, a Escritura somente pode ser compreendida retamente quando acolhida, lida, ouvida na Tradição Apostólica, conservada íntegra na Igreja católica pela ação do Santo Espírito. O próprio Novo Testamento todo não é senão a Tradição Apostólica colocada por escrito e nela interpretada continuamente pela Igreja santa e apostólica e católica! Até mesmo o Antigo Testamento, somente à luz do Cristo anunciado segundo a Tradição dos Apóstolos, chega ao seu sentido pleno!
É uma reciprocidade bendita e impressionante, uma circularidade admirável: a Tradição Apostólica, presente na Igreja, interpreta retamente as Escrituras, que fora dela, seriam texto disponível a qualquer arbitrariedade de intérpretes aleatórios e, por outro lado, as Santas Escrituras ancoram e fundamentam a Tradição viva, sempre presente, de geração em geração, na vida da Igreja! Dito com outras palavras: a Tradição Apostólica é o ar, é o ambiente, é o meio vital no qual as Escrituras são vivas e retamente interpretadas (na Igreja santa católica e apostólica as Escrituras estão em casa!) e as Escrituras são o ancoradouro e o critério para que a Igreja bem interprete de modo vivo e dinâmico, sempre progressivo (cf. Jo 16,12-15), a Tradição  Apostólica, que nos testemunha continuamente a fé transmitida uma vez por todas aos santos (cf. Jd 3).

Alguns têm a ilusão de interpretar as Escrituras de modo neutro, ao pé da letra, fora de uma tradição! É uma triste ilusão, uma estreita cegueira, uma ingenuidade tremenda! Os textos sagrados sempre são interpretados por nós a partir de ideias e valores que já trazemos, nossos e do grupo no qual estado inseridos! É totalmente impossível fugir disto!
A questão é que quem lê e escuta e guarda a Palavra Santa na comunhão da Igreja una, santa, católica e apostólica, guarda as Escrituras no seu autêntico sentido, garantido pelo Espírito de Cristo, que não permite que a Igreja erre na sua fé (cf. Mt 16,19; Jo 16,12-15; 1Tm 3,15). Quem foge dessa Tradição Apostólica, lê e interpreta a Palavra a partir de tradições humanas, de mestres que inventaram escolas de interpretação de sua própria cabeça e, portanto, fora do seu ambiente natural, que é a Igreja católica e apostólica. Assim, abendona-se a Tradição Apostólica e cai-se nas tradições deste ou daquele grupo, cada um interpretando do seu modo e achando que está fazendo "A Interpretação"! Por exemplo: a percepção torta de que só a fé salva, de que as obras não contam para a salvação, a insistência anacrônica na guarda do sábado, a proibição de transfusão de sangue, o litígio ultrapassado e estulto por causa de imagens, a grave negação do Batismo de crianças, a falta de consciência do significado sacramental e sacrifical da Eucaristia... Tudo isto deriva de interpretações que têm fundamento não no texto bíblico, mas em tradições humanas já determinadas de como o texto deve ser lido! Em outras palavras: consciente ou inconscientemente, esta gente lê o texto com um “pre-texto” inventado por mestres humanos, fundadores de tradições humanas; e, ingenuamente, acham que estão interpretando com toda a fidelidade! ! Tanto são tradições prévias à leitura do Texto Santo que, nesses grupos religiosos, se alguém interpretar o texto de modo diverso daquele que o grupo determina, é obrigado a deixar o grupo, porque não está interpretando a Escritura segundo a TRADIÇÃO daquele grupo!

Mais uma coisa: a Escritura Sagrada revela o Rosto do Senhor e desvela Seu amor divino a quem a escuta com um coração fiel e humilde.
O curioso, o soberbo, o descuidado, nada encontrará a não ser uma coleção de textos antigos, do passado... No entanto, quando escutamos e lemos essas Santas Palavras - que trazem a Palavra que é Jesus Cristo Senhor - em docilidade ao Santo Espírito e em comunhão com a santa Igreja, então, a Escritura torna-se doce como o mel, luminosa como o sol do meio-dia, profunda como o céu, vivificante no Santo Espírito e cortante como espada de dois gumes. 

Mas, atenção: a Escritura não foi dada a cada pessoa de modo privado, individual... Como nela mesma está escrito: ela não se presta a interpretações privadas (cf. 2Pd 1,19-21)! A Sagrada Escritura foi dada à Igreja e somente é Palavra viva na vida da Igreja Povo de Deus! Ouvir ou ler a Escritura fora da mente e do coração da Igreja é ser condenado a não colher seu sentido unitário e profundo.
Ela é como um álbum e família, o álbum da nossa família, pois os textos foram escritos por nossos Pais na fé tanto os do Antigo Povo quanto os primeiros membros da santa Igreja. Assim, alguém estranho à família pode pegar as mesmas fotos, olhá-las, saber os lugares e as situações documentados nas fotografias... Mas, somente quem é da família sentirá o coração vibrar, somente quem vivenciou aquelas histórias, com aquelas tonalidades e acentuações pode realmente compreender o sentido das fotos...
É assim com a Bíblia: nascida na Igreja, confiada à Igreja para guardá-la fielmente, ouvi-la atentamente, meditá-la piedosamente, amá-la fervorosamente, celebrá-la na Eucaristia (Palavra feita carne na Carne de Cristo) e levá-la ao mundo como anúncio e testemunho de Jesus Salvador, somente na Igreja pode ser colhida em todo o seu sentido e verdade. Fora da Igreja, a Escritura é palavra feita pedaços, às vezes, feita confusão, é texto submetido ao capricho de mil pretextos, que o desvirtua e faz esconder mais que revelar o verdadeiro rosto de Jesus.

Para terminar, o desafio: Experimente! Tome a Escritura (pode ser a leitura da Missa de cada dia), escute-a com o coração, medite-a com amor e procure ouvir o que o Senhor diz à Igreja e a você. Sua vida encher-se-á de nova luz – aquela luz que é o próprio Cristo, Palavra viva e vivificante do Pai!

Imagem relacionada

domingo, 22 de julho de 2018

O altíssimo preço de escolhas erradas...

Muitos católicos, iludidos, apoiaram politicamente partidos e grupos com ideologias secularistas, anti-cristãs e ateias pensando que a utopia de uma sociedade sem classes e igualitária desses grupos justificaria tal opção.
Triste e desastroso engano...

O resultado na nossa América Latina é claro:
Corrupção institucionalizada e defendida cega e metodicamente por verdadeiros devotos de corruptos e quadrilheiros, como no Brasil e na Argentina,
Narcoditadura cruel, como na Venezuela e na Bolívia,
Ditadura sanguinária, como na Nicarágua...


Em várias desses países, a Igreja está pagando um preço alto...


E a pobre América Latina condenada a viver assim, no atraso, no populismo, no estatismo mais retrógrado, no capitalismo da pior qualidade, parido do compadrio entre governos corruptos e empresariado parasitário...
E os latino-americanos continuamos à procura de pais dos pobres, benfeitores do povo, salvadores da pátria...

Precisamos de justiça social, precisamos de políticas públicas decentes e consistentes, precisamos de liberdade de iniciativa para os negócios, precisamos de desburocratização, precisamos de um estado a serviço do cidadão, precisamos de quem defenda os valores mais basilares da nossa sociedade, precisamos de governantes que respeitem e valorizem nossas raizes cristãs e católicas, precisamos de instituições fortes, precisamos de um estado mais enxuto e eficaz, precisamos de líderes políticos mais comprometidos de modo responsável com o bem comum...

Rezemos pelo nosso pobre Brasil,
Rezemos pela Venezuela,
Rezemos pela Nicarágua...
Rezemos pela Igreja nestes países...


Aprendamos a amarga lição que a história nos tem dado...

sábado, 21 de julho de 2018

Homilia para o XVI Domingo Comum - ano B

Jr 23,1-6
Sl 22
Ef 2,13-18
Mc 6,30-34

Se pensarmos bem, caríssimos em Cristo, tudo quanto a Igreja tem para dizer ao mundo é Jesus: Ele é a Palavra viva do Pai, Ele é o Salvador e a Salvação, é a Ele que a Igreja dirige continuamente o olhar e o coração, para contemplá-Lo, escutá-Lo e Nele beber das fontes da Vida e da paz! Triste da Igreja se viver falando de si mesma, preocupada consigo mesma, planejando a si própria! Jesus: Ele é que realmente importa! E a Igreja somente é importante por causa Dele! Pois bem: é de Jesus que a Palavra santa hoje nos fala – de Jesus Bom Pastor!

Em Israel, pastores do povo eram seus dirigentes: reis, aristocracia, sacerdotes, escribas, profetas. Infelizmente, de modo frequente, esses eram pastores maus e infiéis, pois não faziam o que era de se esperar de quem apascenta: não amavam o rebanho, dele não cuidavam, com ele não se preocupavam, não os conduzindo nos caminhos da Aliança com o Senhor Deus. Dos maus pastores, Santo Agostinho dizia que procuram somente o leite e a lã das ovelhas, sem com elas se preocuparem. O leite simboliza os bens materiais; a lã, o prestígio e os aplausos. Não proclamam a verdade de Deus, não dizem as exigências da Aliança, não defendem o rebanho dos erros, dos lobos, dos perigos no deserto da vida... 

Na nova Aliança, os pastores do Povo de Deus, que é a Igreja, são os ministros de Cristo: Bispos, padres e diáconos. A eles também o Senhor repreende neste hoje e a eles exorta a que se convertam e sejam pastores de verdade. Mas, quem é pastor de verdade na Igreja? Quem se deixa plasmar pelo verdadeiro Pastor, pelo único Pastor, Aquele que é a própria justiça, a própria santidade de Deus: “Este é o nome com que O chamarão: ‘Senhor, nossa Justiça’”. Falamos de Jesus Cristo. Ele é a justiça, isto é, a salvação de Deus para nós! Ele é o caminho, Ele é a verdade, Ele nos revela em profundidade o sentido da vida! Nas angústias, olhemos para Ele e encontraremos a paz; nas trevas, voltemo-nos para Ele e a luz brilhará no nosso coração e na nossa mente; nas incertezas, escutemo-Lo e discerniremos o que o Senhor Deus espera de nós; na morte, a Ele nos abandonemos e seremos ressuscitados em glória!

Ante os maus pastores da Israel, que infestaram todo o tempo do Antigo Testamento, o Senhor prometeu, da Casa de Davi, um novo Pastor, o Pastor por excelência: “Eis que virão dias em que farei nascer um Descendente de Davi; reinará e será sábio, fará valer a justiça e a retidão na terra”. Aqui Deus fala do Messias; e esse Messias é a própria presença de Deus apascentando o Seu Povo: “Eu reunirei o resto de Minhas ovelhas de todos os países para onde forem expulsas, e as farei voltar a seus campos, e elas se reproduzirão e multiplicarão”. Eis, portanto: um messias, presença do próprio Deus, Pastor do Seu povo, cuidador do Seu rebanho... É precisamente assim que o Evangelho de hoje nos apresenta Jesus: “Ao desembarcar, Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor. Começou, pois, a ensinar-lhes muitas coisas”. Que imagem sublime, que cena tão doce! Jesus cansado, pensando em algo tão humano, tão legítimo: um dia de descanso em companhia dos Doze. E quando chega ao local escolhido para o merecido repouso, lá estava a multidão cansada e acabrunhada, sedenta de luz, sedenta de vida, sedenta de verdes pastagens, desorientada, como ovelhas sem pastor... E Jesus, Bom Pastor, esquece de Si mesmo, deixa de lado Seu cansaço e, cheio de compaixão, vai cuidar das ovelhas... Por isso mesmo, Ele é o Pastor por excelência, o Belo, Perfeito, Pleno Pastor! Ele ama o rebanho, preocupa-Se com ele, dele Se compadece e por Ele vai dando, derramando, diariamente, a própria vida. Nunca se viu Jesus poupar-Se, nunca se testemunhou Jesus fazendo um milagre em benefício próprio, nunca se apanhou o Senhor buscando algum favor para Si. Não! Toda a Sua vida foi vida vivida para o rebanho por amor ao Pai, vida dada, vida doada, entregue de modo total, até a morte e morte de cruz. Tem razão São Paulo, quando diz aos Efésios, na segunda leitura de hoje: “Agora, em Cristo, vós que outrora estáveis longe, vos tornastes próximos, pelo sangue de Cristo. Ele, de fato é a nossa paz!”
Eis, caríssimos! O Bom Pastor, entregando a vida pela humanidade, nos atraiu, abrindo um novo caminho, suscitando uma nova esperança para judeus e pagãos, reunindo-os todos no Seu aconchego, no Seu Coração de Pastor, dando-nos a paz e fazendo de nós a Sua Igreja!

Igreja aqui reunida, em torno deste Altar, tu nasceste da dedicação do teu Pastor; tu és fruto da Sua vida entregue amorosa e dolorosamente! O Apóstolo afirma, de modo profundo e comovente que Cristo “quis reconciliá-los, judeus e pagãos, com Deus, ambos em um só corpo, por meio da Cruz; assim Ele destruiu em Si mesmo a inimizade”. Prestai bem atenção: na carne de Cristo, no corpo ferido de Cristo, na vida dilacerada de Cristo, deu-se a nossa Paz, isto é, a reconciliação com Deus e, em Deus, dos homens entre si! – Ó Senhor Jesus, que Tu mesmo, de corpo e alma, de sonho e de dor és o nosso repouso, és nossa segurança! Tu mesmo és a nossa Paz, o shalomde Deus para nós! E quão alto foi o preço dessa Paz! E tudo isso para que, no Teu Santo Espírito, tivéssemos acesso Àquele a Quem Tu chamas de Pai, fonte de toda vida!

Caríssimos, tanto para nós, pastores, quanto para vós, ovelhas, o exemplo de Cristo é motivo de questionamento e chamado à conversão.
Para nós, pastores, é forte apelo a que sejamos como ele, sejamos presença Dele no meio do rebanho, tendo Seus sentimentos, Suas atitudes, participando de Sua entrega total. Pastores que não apascentam em Cristo, que não vivem a vida de Cristo na carne de sua vida, não são pastores de fato; são maus pastores, ladrões e salteadores, como aqueles do Antigo Testamento.
E para vós, ovelhas, que apelos o Bom Pastor hoje vos faz? Ele que Se deu todo a vós como pastor, vos convida a que vos entregueis totalmente a Ele como ovelhas. Como a ovelha do Salmo da Missa de hoje, que confia totalmente no seu Pastor, ainda mesmo que passe pelo vale tenebroso, porque sabe que o Pastor é fiel, que o Pastor haverá de defendê-la, assim também nós, ovelhas do Seu pasto, confiemo-nos ao Senhor, sigamo-Lo, Nele coloquemos a nossa existência. E que Ele, cheio de amor e misericórdia, nos conduza às campinas verdejantes, nos faça descansar, restaure nossas forças, guie-nos no caminho mais seguro, nos prepare a mesa eucarística, unja-nos com o suave óleo do Seu Espírito, faça transbordar a taça da nossa exultação e nos dê habitação na Sua Casa pelos tempos infinitos. Amém.

Resultado de imagem para o cristo bom pastor

sábado, 14 de julho de 2018

Em Cristo, o amor gratuito

Num mundo no qual tudo é pago, tudo gira em torno do lucro, tudo tem a preocupação do retorno econômico e do interesse - até nas seitas por aí afora, o dízimo é a chave de entrada no céu -, o Senhor Se revela graciosamente!

Quem dera, o mundo compreendesse esse amor apaixonado de Deus que se manifesta em Jesus!
Quem dera que a humanidade dos nossos dias se reconhecesse faminta e sedenta!
Quem dera se deixasse interpelar: “Por que gastar dinheiro com outra coisa que não é pão, desperdiçar o salário senão com satisfação completa? Ouvi-Me com atenção e alimentai-vos bem! Inclinai vosso ouvido e vinde a Mim, ouvi e tereis Vida!” (55,2s)

Infelizmente, o nosso é um mundo cansado, desencantado, mas também autossuficiente, prepotente, que pensa sozinho, do seu modo, poder se saciar e viver de verdade!
Também nós, nas nossas pobrezas, tanta vez fugimos do Senhor, ao invés de correr para Ele, nosso Poço, nossa Água, nosso Pão, nosso Refrigério, nosso Consolo, nossa Vida plena de sentido e Eternidade!

E, no entanto, nós, cristãos, sabemos que em Cristo Jesus encontra-se a Vida, encontra-se o verdadeiro caminho, o verdadeiro sentido da nossa existência e do mundo! Portanto, “quem nos separará do amor de Cristo? Tribulação? Angústia? Perseguição? Fome? Nudez? Perigo? Espada? Em tudo isso somos mais que vencedores, graças Àquele que nos amou!” (Rm 8,35ss) É por essa experiência do amor tão terno e presente do Senhor Jesus na nossa vida que somos cristãos! Deixemo-nos, pois, saciar pelo Senhor e experimentaremos que “nem a morte, nem a vida, nem o presente nem o futuro, nem outra criatura qualquer, será capaz de nos separar do amor de Deus por nós, manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor!”

Compreendamos bem: a verdadeira Boa-Nova para o mundo atual é esta: o amor terno e próximo de Deus, manifestado em Jesus Cristo! Mas, somente poderemos ser testemunhas de tal amor se nós mesmos nos deixarmos tocar e envolver pela ternura do Cristo! Atendamos, portanto, ao Seu convite de ir gratuitamente a Ele, apesar de nossas pobrezas! Deixemos que Ele nos alimente e sacie de Vida e de paz!
Resultado de imagem para o amor grautio de cristo

sexta-feira, 13 de julho de 2018

O desígnio salvífico de Deus rezado pela Igreja diante do Pai

“Na verdade, ó Pai, é nosso dever dar-Vos graças,
é nossa salvação dar-Vos glória:
só Vós sois o Deus vivo e verdadeiro
que existis antes de todo o tempo
e permaneceis para sempre,
habitando em luz inacessível.

Mas, porque sois o Deus de bondade e a fonte da Vida,
fizestes todas as coisas para cobrir de bênçãos as vossas criaturas
e a muitos alegrar com a Vossa luz.

Eis, pois, diante de Vós todos os Anjos
que Vos servem e glorificam sem cessar,
contemplando a Vossa glória.

Com eles, também nós,
e, por nossa voz, tudo o que criastes,
celebramos o Vosso Nome, cantando a uma só voz:
Santo, Santo, Santo...

Nós proclamamos a Vossa grandeza, Pai santo,
a sabedoria e o amor com que fizestes todas as coisas:
criastes o homem e a mulher à Vossa imagem
e lhes confiastes todo o universo,
para que, servindo a Vós, seu Criador, dominassem toda criatura.
E quando pela desobediência perderam a Vossa amizade,
não os abandonastes ao poder da Morte, mas a todos socorrestes com bondade, para que, ao procurar-Vos, vos pudessem encontrar.

E, ainda mais, oferecestes muitas vezes aliança aos homens e às mulheres
e os instruístes pelos profetas na esperança da salvação.
E de tal modo, Pai santo, amastes o mundo
que, chegada a plenitude dos tempos,
nos enviastes Vosso próprio Filho para ser o nosso Salvador.

Verdadeiro homem, concebido do Espírito Santo e nascido da Virgem Maria,
viveu em tudo a condição humana, menos o pecado,
anunciou aos pobres a salvação,
aos oprimidos. a liberdade,
aos tristes, a alegria.
E para realizar o Vosso plano de amor,
entregou-Se à morte e, ressuscitando dos mortos,
venceu a morte e renovou a vida.

E, a fim de não mais vivermos para nós,
mas para Ele, que por nós morreu e ressuscitou,
enviou de Vós, ó Pai, o Espírito Santo, como primeiro Dom aos vossos fieis
para santificar todas as coisas, levando à plenitude a Sua obra” (Oração Eucarística IV).


Homilia para o XV Domingo Comum - ano B

Am 7,12-15
Sl 84
Ef 1,3-14
Mc 6,7-13

Hoje, a santa Palavra que Deus nos dirige nos fala de duas realidades: nossa missão de profetas e a mensagem de devemos comunicar.

Primeiro, a vocação de profeta. Escutamos na primeira leitura como Amós não poderia se calar. Ele mesmo reconhece: “Não sou profeta nem sou filho de profeta; sou pastor de gado e cultivo sicômoros. O Senhor chamou-me, quando eu tangia o rebanho, e o Senhor me disse: ‘Vai profetizar para Israel, Meu povo!’” Amós não era profeta profissional nem era de um grupo tradicional de profetas. E, no entanto, o Senhor o tirou de trás do rebanho, tirou-o da sua vida, e o mandou falar em Seu Nome ao Povo de Israel. No evangelho, vimos Jesus chamando os Doze e os mandando em missão: sem levar nada, confiando somente em Deus, correndo o risco de serem incompreendidos e rejeitados, eles deveriam ir, anunciando o Reino de Deus, que exige mudança de vida, conversão de pensamento, atitudes e modo de agir...

Meus caros, ainda hoje é assim; entre nós é assim! Deus continua falando, Deus continua escolhendo profetas, Deus continua dirigindo o Seu chamado ao mundo e a cada pessoa. Se escutarmos com atitude de fé a Palavra santa, se na oração nos abrirmos aos seus apelos, se estivermos atentos ao que Ele nos fala no nosso coração, descobriremos que o Senhor também nos envia! Isso mesmo: todo cristão, pelo Batismo e a Crisma, participa da missão do Cristo Jesus, a missão de anunciar o Reino de Deus, revelando a Face do Pai, que Jesus nos veio mostrar! É verdade que, na Igreja, há aqueles chamados para o ministério ordenado: Bispos, padres e diáconos que, em Nome de Cristo, apascentam o rebanho e anunciam o Evangelho. Eles são os primeiros responsáveis pelo anúncio da Palavra de Deus. Mas, todo o povo de Deus, todos os batizados e crismados, cada um de nós, tem a missão de falar em Nome do Senhor e, em Nome de Cristo, levar a luz nas trevas, a reta fé nas crenças a deformam, a verdade no erro, a paz nas tensões e angústias, a esperança no desespero, a vida nova nas situações de morte. Somos todos um povo de profetas, caríssimos e, se nos calarmos, se nos omitirmos, seremos culpados de escondermos e sufocarmos a Palavra do Senhor de que o mundo tanto necessita!

Aqui cabe um urgente exame de consciência. Quantas oportunidades temos de falar de Cristo, de anunciar a vontade e o plano de Deus, de dar testemunho do seu amor e da Sua presença – e nos calamos, nos omitimos, como se Cristo não fosse uma questão nossa! Quantas vezes somos cristãos cansados, cristãos omissos, cristãos comodistas! Os pais aqui presentes têm anunciado Jesus a seus filhos, têm sido seus primeiros evangelizadores e catequistas? Têm rezado com eles? Têm procurado lavá-los à Igreja? Marido e mulher, têm sido um para o outro um sinal de Deus, uma palavra e uma presença de Cristo? Têm procurado construir o lar como um sinal do Reino dos Céus? E os jovens cristãos, têm sido sinal de Nosso Senhor no mundo em que vivem? Têm feito e vivido as várias experiências da vida como discípulos de Cristo? Eis, meus caros irmãos! Não esqueçamos que nós somos os profetas, nós somos os enviados do Senhor! É esta a primeira lição que hoje a Palavra de Deus nos dá. No trabalho, no amor, no descanso, no estudo, nas relações sociais somos as testemunhas do Senhor nosso! Um dia, certamente seremos cobrados por isso; o Senhor nos pedirá contas!

Um segundo aspecto para nossa meditação é o que diz São Paulo na segunda leitura. Aí ele apresenta de modo maravilhoso aquilo que devemos comunicar ao mundo com a palavra e com a vida, isto é, o conteúdo da nossa fé cristã, o grande sonho de Deus para o mundo e para a humanidade. O que nos diz o Apóstolo? Diz-nos que antes da criação do mundo, o Pai sonhou conosco! As montanhas ainda não existiam, as estrelas ainda não brilhavam e o Pai, em Cristo, já sonhava em criar tudo, em nos criar – a mim e a você – e nos mandar o Seu Filho amado. Por Ele, o Pai criou tudo, por Ele, na força do Santo Espírito, o Pai, desde o princípio, cumulou de bênçãos a Sua criação. Seu maior sonho era nos mandar Jesus, o Filho feito um de nós, para que Ele nos levasse à plenitude da amizade com o Pai na potência do Espírito. E quando nós pecamos, quando a humanidade, desde o princípio, fechou-se para Deus e para o Seu sonho, o Pai nem assim desistiu do Seu amor: na plenitude dos tempos Ele enviou o Seu Cristo para que, morrendo na Cruz, Ele nos libertasse do nosso pecado de teimosia e fechamento e, enchendo-nos do Seu Espírito Santo, nos desse já o gostinho, as primícias da Vida eterna. Essa Vida, nós já a experimentamos aqui, em Jesus, ouvindo sua Palavra, convivendo com os irmãos como membros da santa Igreja e, sobretudo, participando dos santos sacramentos, de modo especial da Eucaristia, que é Pão do Céu, alimento que nos traz já o sabor da Vida de Deus.

Eis, caríssimos! Somos enviados por Jesus ao mundo para testemunhar o plano, o sonho de amor para toda a humanidade, que o Pai desde toda eternidade acalentou e realizou em Cristo Jesus, tornando-o presente para nós pelo ministério da Igreja! Estejamos certos de uma coisa: somos parte desse sonho, somos cooperadores desse sonho! Que nossa vida, nossas palavras, nosso compromisso, testemunhem tornem presente esse sonho lindo de Deus!

Olhemos a Cruz, consequência do nosso pecado, e tomemos consciência do quanto somos caros a Deus, do quanto somos preciosos, do quanto somos amados e do quanto somos chamados a amá-Lo e participar da obra de salvação do mundo!

É esta a mensagem deste Domingo, é este o apelo do Senhor! Não sejamos surdos, mas como Amós, como os Doze primeiros, sejamos sementes do Reino de Deus. Amém.

"Vai! Anuncia-Me!"

quinta-feira, 12 de julho de 2018

A tremenda aventura de crer

Crer não é compreender tudo. Os profetas, que falam em nome de Deus, nem mesmo eles compreendem totalmente o agir de Deus, e quantas vezes se angustiam e perguntam e choram: “Senhor, por que ages assim? Por que Teus caminhos nos escapam deste modo?”

A verdade é que a fé não é uma realidade quieta e pacífica! O próprio Jesus adverte que somente os violentos conquistam o Reino dos Céus (cf. Mt 11,12s); somente aqueles que lutam, que teimam em acreditar, às vezes contra toda esperança e evidência, como nosso pai Abraão!
A fé é uma realidade que sangra, sangra na dor de tantas perguntas sem resposta, sangra pelo sofrimento do inocente, pela vitória dos maus, pelo mal presente em tantas dimensões da nossa vida, pelas situações que nos parecem absurdas e para as quais não divisamos qualquer sentido; sangra nas orações aparentemente não ouvidas, sangra no tremendo silêncio de Deus, na Sua ausência que deixa a vida tão escura e fria como uma cortante noite de inverno... Sim! Deus parece calar-Se!
Um filósofo ateu do século passado chegou mesmo a dizer, escandalizado com o sofrimento no mundo: “Se Deus existe, o mundo é Sua reserva de caça!”
A Palavra Santa, no Livro de Jó, usou palavras parecidas: “Também hoje minha queixa é uma revolta, porque Sua mão agrava os meus gemidos. Ele cobriu-me o rosto com a escuridão (23,2.17). E, pesaroso, esse homem sofredor, triturado pelo Eterno, se queixa de Deus: “Clamo por Ti, e não me respondes; insisto, e não Te importas comigo. Tu Te tornaste o meu carrasco e me atacas com Teu braço musculoso!” (30,20s).

Por que, Senhor?
Por que Te calas?
Por que Teus caminhos nos são escondidos?
Por que parece que não Te importas conosco?
Por que, neste mundo, és o grande Ausente? Onde Te escondes? Onde a Tua Presença?
“Tu tratas o homem como peixes do mar,
como répteis que não têm dono!
Ele os tira a todos com o anzol,
Puxa-os com sua rede
E os recolhe em sua vasilha...” (Hab 1,14s)
– Eis a dor que sangra das feridas dos crentes:
Quantas vezes sentimo-nos sem dono, sem Alguém que vele por nós,
como os peixes do mar, como míseros répteis!

Deus é assim: nunca nos explica, mas nos convida sempre à confiança renovada, ao abandono nas Suas mãos; mãos Daquele mesmo que, por nós, entregou o Seu próprio Filho, o Amado.

É isto que é tão difícil para o homem de hoje, que tudo deseja enquadrar na sua razão e, quando não enquadra, se revolta e dá as costas a Deus e, assim, termina morrendo, porque viver sem Deus é a pior das mortes, o maior dos absurdos!

O justo vive da fé, vive na fé, vive abandonado nas mãos do Senhor (cf. Rm 1,17). Ele sabe que tudo está nas mãos do Eterno, Daquele que é amorosa providência: “Senhor, tudo está em Teu poder, e ninguém pode resistir à Tua vontade. Tu fizeste todas as coisas: o céu, a terra, e tudo o que eles contêm; és o Deus do universo!” (Est 13,9.10-11).

Nunca esqueçamos: Deus não nos explica Seu modo de agir! Se o compreendêssemos, compreenderíamos o próprio Deus e, aí, já não seria o Deus verdadeiro, mas apenas um idolozinho! "Ó abismo da riqueza, da sabedoria e da ciência de Deus! Como são insondáveis Seus juízos e impenetráveis Seus caminhos! Quem, com efeito, conheceu o pensamento do Senhor? Ou quem foi Seu conselheiro? Ou quem primeiro Lhe fez o dom para receber em troca? Porque tudo é Dele, por Ele e para Ele. A Ele a glória pelos séculos. Amém" (Rm 11,33-36).

Contudo, isso não significa que Deus não liga para nossa dor e para o nosso destino. Pelo contrário!
Ele veio a nós,
fez-Se um de nós,
viveu nossa vida,
suportou nossas dores,
experimentou nossa morte!
Deus próximo, Deus de amor, Deus solidário!
Por isso, podemos olhar para Ele e, suplicantes, estender-Lhe as mãos, como os discípulos do Evangelho, que pediam: “Aumenta a nossa fé!” E Jesus responde – a eles e a nós – “Se vós tivésseis fé (em Mim), mesmo pequena como um grão de mostarda, poderíeis dizer a esta amoreira: ‘Arranca-te daqui e planta-te no mar’ e ela vos obedeceria” (Lc 17,5ss). Ou seja: se crermos de verdade naquele Amor que se manifestou até a Cruz, se crermos – aconteça o que acontecer – que Deus nos ama a ponto de entregar o Seu Filho, teremos a força de enfrentar todas as noites com a Sua luz, todos os pecados com a Sua graça, todas as mortes com a Sua Vida!
Mas, se não crermos, pereceremos...

O que o Senhor espera dos Seus servos é esta fé total, incondicional, pobre e amorosa! É o que o Senhor espera de nós:
"A figueira não dará fruto,
e não haverá frutos nas vinhas.
Decepcionará o produto da oliveira,
e os campos não darão de comer,
as ovelhas desaparecerão do aprisco
e não haverá gado nos estábulos.
Eu, porém, me alegrarei no Senhor,
exultarei no Deus de minha salvação!
O Eterno, meu Senhor, é a minha força,
torna os meus pés semelhantes aos das gazelas,
e faz-me caminhar nas alturas" (Hab 3,17-19).

Só quem e pobre, só quem tem coração de criança crê assim, abandona-se assim, confia assim, espera assim, mesmo nas penúrias e nas noites da existência...