Is 50,5-9a
Sl 114
Tg 2,14-18
Mc 8,27-35
O Evangelho que acabamos de ouvir apresenta-nos, caríssimos, alguns dos aspectos mais essenciais da nossa fé cristã, aspectos que jamais poderemos esquecer se quisermos ser realmente fiéis a Nosso Senhor. Vejamo-los um a um:
Primeiro. A pergunta de Jesus: “Quem dizem os homens que Eu sou?”
Notai bem que as respostas são muitas: umas erradas, outras imprecisas, nenhuma satisfatória. Estejamos atentos a este fato: somente a razão humana, entregue às suas próprias forças, jamais alcançará verdadeiramente o mistério de Cristo.
A verdade sobre o Senhor, Sua realidade mais profunda, Sua obra salvífica, o mistério de Sua Pessoa e de Sua missão, Sua absoluta necessidade para que o mundo encontre salvação, vida e paz somente podem ser compreendidos à luz da fé, isto é, daquela humilde atitude de abertura para o Senhor que nos vem ao encontro e nos fala.
O homem fechado em si mesmo, preso no estreito orgulho da sua razão, jamais poderá de verdade penetrar no mistério de Cristo e experimentar a doçura de Sua salvação.
Quanto já se disse de Jesus; quanto se diz hoje ainda: já tentaram descrevê-Lo como um simples sábio, como um homem bom e justo, como uma espécie de pacifista, como um pregador de uma moral humanista, como um revolucionário, o primeiro comunista, como um hippie, etc. Nós, cristãos, não devemos nos iludir nem nos deixar levar por tais visões do nosso Divino Salvador. Jesus é e será sempre aquilo que a Igreja sempre experimentou, testemunhou e ensinou sobre Ele: o Filho eterno do Pai, Deus com o Pai e como o Pai, o Messias, o único Salvador da humanidade, através de Quem e para Quem tudo foi criado no céu e na terra. Qualquer afirmação sobre Jesus que seja menos que isso, não é cristã e deve ser rejeitada claramente pelos cristãos, no mínimo como insatisfatória!
Segundo. Ante as opiniões do mundo, o Senhor dirige a pergunta a nós, Seus discípulos: “E vós, quem dizeis que Eu sou?”
Em cada geração, todos nós e cada um de nós devemos responder quem é Jesus. Não se trata de uma resposta somente teórica, teológica, digamos assim. Trata-se de uma resposta que deve ter sérias repercussões na nossa vida. A resposta deve ser dada, então, com a palavra da proclamação e as atitudes, as obras, que atestam a verdade do que cremos! Como nos adverte São Tiago, a fé, a proclamação com os lábios e o coração, sem as obras, sem as atitudes concretas na escolhas da existência e no modo de viver, é uma fé inútil, morta, ineficaz; tão ineficaz como dizer a um faminto e maltrapilho: “Irmão, vai em paz; Deus te abençoe: come à vontade”, sem lhe dar nada: nem roupa, nem alimento, nem dinheiro! Para que serviriam essas palavras ocas? Palavra não mata a fome, não veste... Assim, do mesmo modo dizer: “Eu creio em Jesus! Jesus é o meu Senhor! Ele é o Messias de Deus!” E, no entanto, depois, viver do meu modo, sem compromisso com Sua palavra, com Suas exigências, com Seu Evangelho... Palavras, palavras, sentimentos bonitos... Vento, somente vento e vazio!
Então: quem é Jesus para mim? Que papel desempenha na minha vida? Como me relaciono com Ele? Amo-O? Procuro-O na oração, procuro de todo o meu coração viver na Sua Palavra? Estou disposto a construir minha existência de acordo com a Sua verdade? Deixo-me julgar por Ele ou eu mesmo, discretamente, procuro julgá-Lo e adequá-Lo e mim e meus desejos?
São perguntas muito atuais, caríssimos, sobretudo hoje, quando nossa sociedade ocidental vira as costas para o Cristo, julgando-O anacrônico, exigente demais e ultrapassado. Agora que a nossa cultura já não considera mais Jesus como Aquele que é o Caminho, a Verdade e a Vida, mas julga que a própria razão humana, com seus humores e pretensões, é que é a verdade e a luz, é, mais que nunca, essencial que nós proclamemos com a vida, com a palavra e com os costumes que Jesus é realmente o nosso Senhor, o nosso critério, a nossa única Verdade!
Terceiro. Pedro respondeu quem é Jesus: “Tu és o Messias!”, isto é, “Tu és o Cristo, o Esperado de Israel, Aquele que Deus prometera aos nossos Pais!”
Recordai, meus caros, que na mesma passagem, em São Mateus, Jesus declara claramente: “Não foi carne nem sangue que te revelaram isto, mas o Meu Pai que está nos céus” (Mt 16,15). Insisto: somente o Pai, na potência do Santo Espírito que habita em nós e na Igreja como um todo, é que pode revelar-nos quem é Jesus. A fé não é uma experiência acadêmica, não é fruto de estudos, não se resume a uma especulação teológica. Para um cristão, crer é entrar na experiência que há dois mil anos a Igreja vem fazendo na Palavra, nos sacramentos, na vida de cada dia: a experiência do Cristo Senhor, que foi morto pelos nossos pecados e ressuscitou para nossa vida e justificação.
Quem se coloca fora dessa fé, da fé da Igreja, já não é realmente cristão! Aqui é muito importante compreender que a nossa fé é pessoal, mas nunca individual: cremos na fé da Igreja, cremos no Cristo da Igreja, cremos como Igreja e com a Igreja de hoje e de todos os tempos, pois a fé da Igreja não é somente a fé dos cristãos atuais, mas dos católicos de todos os tempos, da geração apostólica a hoje, avançando pelo amanhã adentro! Uma outra fé, um outro Cristo seriam triste ilusão!
Quarto. O Evangelho nos surpreende com uma afirmação: “Jesus proibiu-lhes severamente de falar a alguém a Seu respeito”. Por quê? Porque havia o perigo de pensar Nele como um messias glorioso, um messias como os sonhos dos judeus haviam fabricado: o messias do sucesso, das curas, dos shows da fé, dos palanques políticos, das libertações sócio-econômicas, etc.
Jesus somente afirmará de modo público que é o Messias quando estiver preso, amarrado, diante do Sumo Sacerdote. Aí já não haverá ocasião para engano.
Mas, aqui a dura questão: Também nós, muitas vezes, não temos a tentação de querer um Cristo do nosso modo, sob a nossa medida, para nosso consumo? Amamos o Cristo como Ele é ou O renegamos quando não faz como gostaríamos? Estamos realmente dispostos a ir com Ele até o fim, crendo Nele e Nele nos abandonando ou, disfarçadamente, pensamos em dar jeitinhos para escamotear a verdade e a exigência límpida e direta do Senhor que nos fere com Sua Palavra amorosa e verdadeira?
Quinto. Exatamente para deixar claro que tipo de Messias Ele é, Jesus começa a dizer “que o Filho do Homem devia sofrer muito, ser rejeitado; devia ser morto e ressuscitar depois de três dias. Ele dizia isso abertamente”. Eis, caríssimos, o tipo de Messias, o tipo de Salvador, o tipo de Deus que Jesus é! Ele é o Messias Servo, aquele Sofredor anunciado por Isaías na primeira leitura de hoje, aquele que deverá dolorosamente tomar sobre Si os pecados nossos e do mundo inteiro para, humilhado e morto, ressuscitar, sendo motivo de salvação para a humanidade. Será que nos interessa? Estamos nós dispostos a seguir um Mestre assim?
Sexto. Pedro aventura-se a corrigir Jesus, a fazê-Lo mais racional, mais de acordo com as expectativas humanas... Não será a nossa a mesma atitude de Simão, que repreende Jesus, que desejaria um mestre mais razoável, mais palatável, menos radical? Não é essa a maior tentação nossa: um Cristo sem cruz, um cristianismo sem renúncia, uma vida cristã que não nos custe nada? Um seguimento de Cristo à moda do mundo? O Senhor deixa claro a Pedro que ele também é discípulo! Ainda que seja o que em nome de todos anuncia a fé da Igreja – Tu és o Messias!” – ele, diante do único Mestre, do único Guia, do único Senhor, é discípulo: seu lugar é atrás, segundo o Senhor, o único que indica o traçado do caminho!
Sétimo. A resposta de Jesus, portanto, é clara, curta e dirigida perenemente a todos nós: “Se alguém Me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e Me siga. Pois quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; mas quem quiser perder a sua vida por causa de Mim e do Evangelho, vai salva-la!” O caminho é este, sem máscara, sem acordos, sem jeitinhos! Nosso Senhor nunca nos enganou; sempre disse claramente quais as condições para segui-Lo...
Caríssimos, saiamos hoje daqui com estas palavras que nos incomodam, nos provocam e nos desafiam. Que Ele, o Senhor, nosso Salvador, Messias do Pai, nos conceda a graça de reconhecê-Lo como nosso único Senhor, de segui-Lo como nossa única Verdade e de Nele viver como nossa única Vida, Ele que é bendito pelos séculos dos séculos. Amém.
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