segunda-feira, 31 de agosto de 2015

E os escândalos, hein?

Caro Leitor meu, gostaria de propor-lhe algumas reflexões sobre Lc 17,1-6. Tenha a paciência de ler. Penso que que possa lhe ser útil... Mas, aviso logo que não estou aqui pensando em alguma situação concreta; desejo apenas propor o que o Evangelho nos ensina como bússola para nossa vida de cristãos. Lá vai, portanto!

"Naquele tempo, Jesus disse a Seus discípulos: “É inevitável que aconteçam escândalos. Mas ai daquele que produz escândalos! Seria melhor para ele que lhe amarrassem uma pedra de moinho no pescoço e o jogassem no mar, do que escandalizar um desses pequeninos.
Prestai atenção: se o teu irmão pecar, repreende-o. Se ele se converter, perdoa-lhe. Se ele pecar contra ti sete vezes num só dia, e sete vezes vier a ti, dizendo: ‘Estou arrependido’, tu deves perdoá-lo”.
Os apóstolos disseram ao Senhor: “Aumenta a nossa fé!” O Senhor respondeu: “Se vós tivésseis fé, mesmo pequena como um grão de mostarda, poderíeis dizer a esta amoreira: ‘Arranca-te daqui e planta-te no mar’, e ela vos obedeceria”

Não lhe parece muito assunto neste texto do Evangelho, coisas diversas mal arranjadas na mistura? E, no entanto, veja como têm sentido!

1. Jesus nos avisa que na Sua Igreja sempre haverá escândalos: “É inevitável!” – diz Ele de modo surpreendente.
Em grego, “skandalon” seria uma pedra de tropeço, um empecilho que afasta alguém do caminho que pretendia seguir. Então, no contexto do Evangelho, escândalo seria toda atitude, todo comportamento que possa afastar os pequeninos (= fracos, imaturos) na fé. Desde o início da Igreja esses escândalos estão presentes. Basta pensar na fuga dos Doze, deixando Jesus sozinho, na negação do nosso primeiro Chefe, nas divisões entre cristãos judeus e gentios de que dão conta os Atos dos Apóstolos, nas divisões e imoralidades na Igreja de Corinto, nas brigas e cismas referidas nas epístolas de São João.
Pensemos nos escândalos de hoje, que tanto nos magoam e ferem a Igreja, sobretudo quando são provocados por membros do clero... O Senhor já prevenira: “É inevitável que haja escândalos”... Ainda que tenhamos o dever de evitá-los...

2. Mas Jesus chama atenção de modo grave para a responsabilidade de quem provoca tais escândalos: “Seria melhor para ele que lhe amarrassem uma pedra de moinho no pescoço e o jogassem no mar, do que escandalizar um desses pequeninos”. São palavras duríssimas!
É uma responsabilidade tremenda ser responsável pela queda e abandono da fé por parte de um irmão fraco, que se escandaliza com o escândalo. Todos nós, cristãos, devemos nos perguntar se nossas atitudes não têm provocado escândalo nos irmãos mais fracos... Fraco na fé é todo aquele que faz sua adesão ao Senhor e à Sua Igreja depender de pessoas. É tão triste quando ouvimos dizer que alguém se afastou ou se aproximou da Igreja por causa do Papa, de um Bispo, de um padre, de um irmão... Nossa adesão é a Cristo e não a pessoas quais sejam! Nossa rocha, nossa certeza, nossa esperança devem repousar unicamente no Senhor, com toda a Sua exigência é todo o Seu amor!

3. Por outro lado, Jesus deixa claro que mesmo aquele que escandaliza, arrependendo-se, deve ser perdoado – perdoado sempre!
A advertência do Senhor contra os escândalos e os que os provocam está longe da atitude hipócrita, do moralista chato do politicamente correto ou da falta de misericórdia. Qualquer um que se arrependa sinceramente deve ser perdoado e acolhido. A Igreja deve ser sempre lugar do perdão e da misericórdia. E misericórdia não no sentido da tolerância relativista do politicamente correto ao sabor do mundo e da moda, mas a misericórdia segundo o Evangelho, que exige sempre a conversão sincera e contínua!
Neste sentido, responderão a Deus aqueles que numa atitude farisaica, julgam-se melhores que aqueles que escandalizaram...

4. Diante dessa situação de escândalos, é interessante a atitude tão espontânea dos Apóstolos: “Aumenta a nossa fé!” Como é atual este grito, esta súplica!
Somente na fé podemos superar os escândalos, transformando-os em sereno e confiante abandono nas mãos do Senhor, que sabe tirar dos males o bem. “Aumenta a nossa fé” – devemos pedir ainda atualmente ao Senhor...
Que nossos olhos estejam fixos Nele, e nada nos abalará nem nos fará desviar do caminho! Jesus diz: “Se vós tivésseis fé, mesmo pequena como um grão de mostarda, poderíeis dizer a esta amoreira: ‘Arranca-te daqui e planta-te no mar’, e ela vos obedeceria”. Compreende? A fé madura e sólida, dá-nos capacidade de arrancar os escândalos, como quem joga fora uma amoreira! dito em breve: a fé arranca os escândalos, a fé madura, centrada em Cristo, único necessário e absoluto, não se escandaliza com escândalos!
Que Ele nos dê uma fé assim: ainda que pequenina como um grão de mostarda, para que joguemos longe de nós todas as amoreiras que ameaçarem nosso caminho para Ele, todos os escândalos que surgirem nesse mundo tão conturbado em que vivemos!

sábado, 29 de agosto de 2015

XXII Domingo Comum: A graça da Tua Lei

Dt 4,1-2.6-8
Sl 14
Tg 1,17-18.21b-22.27
Mc 7,1-8.14-15.21-23


A Palavra de Deus deste XXII Domingo chama atenção para o modo como o cristão deve viver sua prática religiosa: com sinceridade diante de Deus, humildade e amor para com os outros e não de forma legalista, fria e autossuficiente.

Com efeito, Jesus critica duramente os escribas e fariseus, que vieram de Jerusalém para observá-Lo e questioná-Lo.

Qual é o problema deles? Certamente eram homens piedosos e queriam seguir a Lei de Deus. O problema era o espírito com o qual faziam: extremamente legalistas, a ponto de fixarem-se em simples tradições humanas estabelecidas pelos rabinos judeus, perdendo de vista o essencial da santa Lei de Deus. Vejamos um pouco: 

A Lei de Deus (para os judeus, expressa na Torah) é santa: “Agora, Israel, ouve as leis e os decretos que eu vos ensino a cumprir... Nada acrescentareis, nada tirareis à palavra que vos digo, mas guardai os mandamentos do Senhor vosso Deus...” Ora, o zelo dos fariseus e dos escribas eram tais e com uma mentalidade de tanto apego à letra pela letra, que se tornaram extremamente legalistas. Eles diziam: “Façamos uma cerca em torno da Lei”, ou seja, criaram pouco a pouco um número enorme de preceitos para evitar qualquer desobediência, ao menos remota, à Lei. Preceitos humanos que foram obscurecendo a pureza da Lei de Deus e sua característica de ser sinal de amor. Por exemplo: (a) A Lei dizia que o castigo não poderia ultrapassar as quarenta varadas. Os mestres de Israel permitam somente trinta e nove, para evitar qualquer perigo de ultrapassar a conta da Lei. (b) A Lei proibia o trabalho no sábado. Os rabinos judeus desenvolveram um complicada e minuciosa casuística sobre o que se pode ou não fazer no sábado; insistiam que até carregar o instrumento de trabalho no sábado era já um pecado: assim, um alfaiate não poderia carregar sua agulha no sábado. (c) A Lei prescrevia abluções (banhos rituais para o culto) só para os sacerdotes. Os fariseus queriam impô-las a todo o povo. A intenção era boa, mas o resultado, não: tornava a religião algo pesado, legalista e apegado a tantos detalhes que faziam esquecer o essencial: o amor a Deus e ao próximo! Os preceitos humanos obscureciam a intenção divina! 

A Lei não fora dada para ser um fardo que tira a liberdade e entristece a vida, mas como sinal do amor de Deus, que orienta e indica o caminho com ternura: “Vós os guardareis... porque neles está a vossa sabedoria e inteligência... Ouve as leis que vos ensino a cumprir para que vivais e entreis na posse da terra prometido pelo Senhor Deus”.

A Lei e toda prática religiosa devem ser caminho de vida, e não um fardo insuportável e asfixiante, tornando a religião algo tristonho e pesado, como se fosse obra de um Deus ciumento e invejoso da nossa felicidade! Jesus critica os fariseus e os escribas por isso: tornaram a religião um fardo pesado e triste, ao invés de ser primeiramente um relacionamento com Deus, íntimo, feliz e amoroso! 

Jesus censura também os escribas e fariseus pela incapacidade de distinguir entre o essencial e o secundário; em discernir o que vem Deus e o que é meramente prática e tradição humanas, talvez boas e louváveis, mas não essenciais. Em matéria de religião, nem tudo tem igual valor, nem tudo tem a mesma importância. A medida de tudo é o amor: o amor é a plenitude da Lei (cf. Rm 13,10); só o amor dá sentido a todas as coisas! Exprimindo esta realidade, o Santo Bispo de Hipona, Agostinho, exortava: “Nas coisas necessárias, unidade; nas discutíveis, liberdade; em tudo, caridade!”

Outro motivo de crítica é que uma religião assim, apegada a preceitos exteriores, torna-se desatenta do coração, sem olhar a intenção com que se faz e se vive. Cai-se na hipocrisia (a palavra hipócrita vem de hypokrités = ator teatral): uma religião meramente exterior, sem aquelas atitudes interiores, que são as que importam realmente: “Este povo Me honra com os lábios, mas seu coração está longe de Mim. De nada adianta o culto que Me prestam!”. É sério: no hipócrita, a atitude exterior (lábios) não combina com o interior (coração)! As práticas externas valem quando são sinal de um compromisso interior de amor e conversão em relação a Deus. É importante observar que Jesus não condena as práticas exteriores, mas a sua supervalorização e a sua atuação sem sinceridade: “Importava praticar estas coisas, mas sem omitir aquelas” (Mt 23,23). 

Há também o perigo da autossuficiência: a pessoa sente-se segura de si mesma por causa de suas práticas: “Ah, eu vou à Missa todo domingo, rezo o terço e dou esmola! Estou em dia com Deus!” O homem nunca está em dia com Deus. Pensar assim, é deixar de perceber que tudo é graça e que jamais mereceremos o amor que Deus nos tem gratuitamente. Sem contar que tal atitude nos leva, muitas vezes, a nos julgar melhores que os outros, desprezando os que julgamos mais fracos ou imperfeitos! Era exatamente o que ocorria com os fariseus: “Este povo que não conhece a Lei são uns malditos!” (Jo 7,49); “Tu nasceste todo no pecado e nos ensinas?” (Jo 9,34); “Ó Deus, eu Te dou graças porque não sou como o resto dos homens, ladrões, injustos, adúlteros, nem como este publicano!” (Lc 18,11). É interessante comparar estas atitudes com as que São Paulo recomenda aos cristãos: “Eu peço a todos e a cada um de vós que não tenha de si mesmo um conceito mais elevado do que convém, mas uma justa estima, ditada pela sabedoria, de acordo com a medida da fé que Deus dispensou a cada um” (cf. Rm 12,3-13) .

Jesus convida a ir ao essencial: vigiar as intenções e atitudes do nosso coração, pois “o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior”. Com um coração puro, poderemos reconhecer que tudo de bom que temos é dom de Deus - “Todo dom precioso e toda dádiva perfeita vêm do alto; descem do Pai das luzes!” – e que, diante Dele, somos sempre pobres e pecadores, necessitados de Sua misericórdia. Isto nos abre de verdade para o amor aos outros e para a compaixão: somos todos pobres diante de Deus: “A religião pura e sem mancha diante de Deus Pai é esta: assistir os órfãos e as viúvas em suas tribulações e não se deixar contaminar pelo mundo”. 

Concluindo, podemos hoje nos perguntar diante do Senhor e da Sua santa Palavra: Como vai nossa prática religiosa, pessoal e comunitariamente? Buscamos um relacionamento amoroso, íntimo e pessoal com o Senhor ou nos contentamos com uma prática meramente exterior? Julgamo-nos melhores que os outros diante de Deus? Às vezes dizemos: “Eu não merecia este mal...” – julgando-nos credores de Deus! Dizemos também: “Há tanta gente pior que eu; por que aconteceu comigo?” – julgando-nos melhores que os outros!

O que é mais importante na nossa vida de fé? E na nossa vida de comunidade de discípulos do Senhor Jesus Cristo? O salmo de meditação da Missa de hoje dá ótimas pistas para um exame de consciência.

Ajude-nos o Senhor a viver realmente a nossa fé radicados no essencial! Amém.

domingo, 5 de julho de 2015

XIV Domingo Comum: Veio para o que era Seu e os Seus não O receberam

Ez 2,2-5
Sl 122
2Cor 12,7-10
Mc 6,1-6

O Evangelho deste Domingo apresenta-nos Jesus na Sua Nazaré. Ali mesmo, na Sua própria cidade, onde nascera e fora criado, os Seus O rejeitam: “’Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, de Joset, de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco?’ E ficaram escandalizados por causa Dele”. Assim, cumpre-se mais uma vez a Escritura: “Veio para o que era Seu e os Seus não O receberam” (Jo 1,11).
E a falta de fé foi tão grande, a dureza de coração, tão intensa, a teimosia, tão pertinaz, que São Marcos afirma, de modo surpreendente: “Ali não pôde fazer milagre algum!”, tão grande era a falta de fé daquele povo.

Meus caros, pensemos bem na advertência que esta Palavra de Deus nos faz!
O próprio Filho do Pai, em pessoa, esteve no meio do Seu povo, conviveu com ele, falou-lhe, sorriu-lhe, abraçou-o e, no entanto, não foi reconhecido pelos seus. E por quê? Pela dureza de coração, pela insistência teimosa em esperar um messias de encomenda, sob medida, a seu bel prazer...
Valia bem para Israel a censura da primeira leitura de hoje, na qual o Senhor Deus Se dirige a Seu servo: “Filho do homem, Eu te envio aos israelitas, nação de rebeldes, que se afastaram de Mim. A estes filhos de cabeça dura e coração de pedra, vou-te enviar, e tu lhes dirás: ‘Assim fala o Senhor Deus’. Quer escutem, quer não, ficarão sabendo que houve entre eles um profeta!”
Que coisa tremenda, meus caros: houve entre os israelitas um profeta, e mais que um profeta: o Filho de Deus, o Eterno, o Filho amado... E Israel o rejeitou!

Mas, deixemos Israel. E nós? Acolhemos o Senhor que nos vem? Escutamos com fé Sua Palavra, quando Ele Se dirige a nós na Escritura, aquecendo nosso coração? Acolhemo-Lo na obediência da fé, quando Ele Se nos dirige pela boca da Sua Igreja católica, ensinando-nos o caminho da Vida? Acolhemo-Lo, quando nos fala pela boca de Seus profetas?
Não tenhamos tanta certeza de que somos melhores que aqueles de Nazaré!
Aliás, é bom que nos perguntemos: por que os nazarenos não foram capazes de reconhecer Jesus como Messias? Já lhes disse: porque o Senhor não era um messias do jeito que eles esperavam: um simples fazedor de milagres, um resolvedor de problemas... Jesus, pobre, manso, humilde, era também exigente e pedia do povo a conversão de coração.
Mas, há também uma outra razão para os nazarenos rejeitarem Jesus: eles foram incapazes de ver além das aparências. De fato, enxergaram em Jesus somente o filho de José, aquele que correra e brincara nas suas praças, aquele ao qual eles haviam visto crescer. Assim, sem conseguir olhar com mais profundidade, empacaram na descrença.
Mas, nós, conseguimos olhar com profundidade? Somos capazes de escutar na voz dos ministros de Cristo a própria voz do Senhor? Somos sábios o bastante para ouvir na voz da Igreja a voz de Cristo?

É exatamente pela tendência nossa, tremenda, de sermos surdos ao Senhor, que Jesus tanto sofreu e que Paulo se queixava das dificuldades do seu ministério.
O Apóstolo fala de um anjo de Satanás que o esbofeteava. Que anjo era esse? Ele mesmo explica: suas “fraquezas, injúrias, necessidades, perseguições e angústias sofridas por amor de Cristo”. O drama de Paulo é uma forte exortação aos pregadores do Evangelho e a todos os cristãos. Aos pregadores do Evangelho essa palavra do Apóstolo recorda que o anúncio será sempre numa situação de pobreza humana, de apertos e contradições. A evangelização, caríssimos, não é um trabalho de marketing televisivo como vemos algumas vezes nos “missionários” dos meios de comunicação. O Evangelho do Cristo crucificado e ressuscitado, é proclamado não somente pela palavra do pregador, mas também pela carne de sua vida. Como proclamar a Palavra sem sofrer por ela? Como anunciar o Crucificado que ressuscitou sem participar da Sua cruz na esperança firme da Sua ressurreição? O Evangelho não é uma teoria, não é um sistema filosófico. O Evangelho é Cristo Jesus encarnado na nossa vida, de modo que possamos dizer como São Paulo: “Eu trago no meu corpo as marcas de Jesus” (Gl 6,17).
Triste do pregador que pensar em anunciar Jesus conservando-se para si mesmo. Um diácono, um padre, um bispo, que quisessem se poupar, que separasse a pregação do seu modo de viver, que fosse pregador de ocasião, tornar-se-ia um falso profeta, transformar-se-ia em marqueteiro do Evangelho, portanto, inútil e estéril. É toda a vida do pregador que deve ser envolvida na pregação: seu modo de viver, de agir, de vestir, de relacionar-se com os bens materiais, sua vida afetiva, seu modo de divertir-se, seu tipo de amizade... Tudo nele dever ser comprometido com o Senhor e para o Senhor!

Mas, essa palavra de São Paulo na Liturgia de hoje vale também para cada cristão. Hoje, somos minoria. O mundo não-crente, secularizado zomba de nós e já não crê no anúncio de Cristo que lhe fazemos. Sentimos isso na pele!

Pois bem, quando experimentarmos a frieza e a dura rejeição, quando em casa, no trabalho, nos círculos de amizades, formos ignorados ou ridicularizados por sermos de Cristo, recordemos do Evangelho de hoje, recordemo-nos dos sofrimentos dos apóstolos e retomemos a esperança: o caminho de Cristo é também o nosso; se sofrermos com Ele, com Ele reinaremos; se morrermos com Ele, com Ele viveremos (cf. 2Tm 2,11-12). Não tenhamos medo: nós somos as testemunhas, somos os profetas, os sinais de luz que Deus envia ao mundo de hoje! Sejamos fieis: o Senhor está conosco, hoje e sempre. Amém.

sábado, 20 de junho de 2015

XII Domingo Comum – Ano B: Teu mar é tão grande; meu barco é tão pequeno!

Jó 38,1.8-11
Sl 106
2Cor 5,14-17
Mc 4,35-41

Hoje, o Evangelho nos apresenta Jesus na barca, dormindo, cansado, ao anoitecer. Tão doce, essa imagem... Essa barca é a Igreja e pode ser considerada também como figura da nossa própria vida. Como quer que seja, o cenário é desolador mete medo: é noite, no meio do Mar da Galileia, e, de repente, levanta-se uma tempestade de vento muito forte, com as ondas lançando-se barco adentro.

Pensemos, caríssimos, que muitas vezes é assim que percebemos, seja a realidade da Igreja, seja a realidade de nossa própria existência.
Tanta vez é noite e nada podemos enxergar com clareza;
tanta vez as ondas parecem agitar tudo, e as torrentes ameaçam nossa pobre barquinha, de modo que nos sentimos pequenos e impotentes, como os navegadores descritos pelo Salmo de hoje: “Ele ordenou, e levantou-se o furacão, arremessando grandes ondas para o alto; aos céus subiam e desciam aos abismos, seus corações desfaleciam de pavor”.
Ai! Que tantas vezes encontramo-nos nessa situação, tantas vezes vemos a Igreja encontrar-se assim!
E o Senhor, como no Evangelho de hoje, parece dormir, parece alheio à nossa aflição, distante da nossa angústia, incapaz de nos salvar... Quantas vezes temos de dizer: “Senhor, por que dormes? Por que não respondes? Por que parece que não vês a dor e o sofrimento?”
Tempos do Senhor, modos do Senhor, que nos desorientam!

Não é ruim que gritemos ao Senhor, caríssimos, pois gritar-Lhe, pedir-Lhe e até queixar-se a Ele é sinal de fé. Só quem crê e considera realmente Deus como Alguém e não como uma ideia abstrata, é que reza realmente! Então, gritemos, então, rezemos, então supliquemos!
Só não o façamos com a atitude de descrença dos apóstolos! O mal deles não foi acordar o Senhor, não foi suplicar por socorro. Não! Seu mal foi duvidar do Seu amor! Vede, caros meus, como eles dizem: “Não Te importas que estejamos perecendo?” Duvidam da solicitude do Senhor, duvidam de Seu cuidado por eles, duvidam do Seu amor pela humanidade e por cada um de nós: “Não Te importas?” Chegam até a repreender o Senhor!

Aconteça o que acontecer conosco, meus caros, não temos o direito de duvidar do amor de Cristo, da Sua presença, do Seu cuidado para conosco.
Olhemos a cruz! Conhecemos o amor de Deus para conosco, sabemos o quando Cristo nos quer bem, o quanto é nosso amigo, pois que não há maior prova de amor que dar a vida pelos amigos” (Jo 15,13), e Ele deu a Sua vida por nós...
São Paulo nos recorda, na segunda leitura de hoje, que “um só morreu por todos, para que os vivos não vivam mais para si mesmos, mas para Aquele que por eles morreu e ressuscitou”.
E então, meus caros? Aquele que vai na nossa barca, na barca da Igreja e na barca da nossa vida, é o mesmo que Se deu todo a nós e todo por nós; Aquele que por nós morreu e ressuscitou!
Gritar por Ele, sim;
clamar por Ele, sim;
suspirar pelo socorro Dele, sim também;
mas duvidar e reclamar com soberba descrença, não!

Será que não cremos de verdade que Ele é o Senhor, que Ele está vivo?
Será que não sabemos com todo o nosso coração que Ele é o Deus que domina o orgulho das ondas do mar?
Vede como Ele impera, como ordena: “Silêncio, mar! Cala-te!” E, que diz o Evangelho? “O vento cessou e houve uma grande calmaria”.
E, então, Jesus perguntou aos Doze, e nos pergunta a nós: “Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?”
– Então, Senhor, por que tenho medo, se nada é impossível para Ti?
Por que me entristeço tanto, se nada é impossível para Ti?
Por que me sinto sozinho, abandonado na vida, inseguro, preso pelo destino, se podes tudo, se venceste a morte; se sei que nada é impossível para Ti?

Para a mentalidade bíblica, era muito claro que somente Deus pode domar o mar. E ainda hoje, o homem da tecnologia, tão prepotente e metido a autossuficiente, treme de medo diante da potência do oceano. Por isso, a pergunta assustada dos Doze: “Quem é Este, a Quem até o vento e o mar obedecem?” Pois bem, este é o próprio Deus!
Isso mesmo: Jesus é Deus, Jesus acalma o mar!
Hoje, caríssimos, temos a ilusão que podemos controlar nossa vida e nosso destino. É mentira, é ilusão, é soberba idolatria! A barquinha de nossa vida, que atravessa o mar borrascoso deste mundo, está nas mãos do Senhor. Então, entreguemo-nos a Ele, confiemo-nos em Suas mãos! E, se Ele parecer dormir, não temamos, porque estará sempre conosco e, se olharmos bem a Sua cruz, saberemos com toda certeza que, venha o que vier, Ele nos ama, Ele faz conta de nós, Ele não nos esquece!
Aliás, esta é a grande diferença entre quem crê e quem não crê: para aquele que de verdade acredita no Senhor e Nele coloca sua confiança, venha o que vier, ele espera e confia, ele sabe que está nas mãos de Alguém que nos ama.
Afinal, o que sabemos da vida?
Que sabemos do modo como Deus dirige o mundo e nossa existência?
Será que não percebemos que o Senhor está presente no silêncio tanto quanto está presente quando nos fala?
Será que não vemos que Ele está ao nosso lado no sorriso como também no pranto?
Será que esquecemos que mesmo a treva para Ele não é escura? Ele é a luz e, com ele, a própria noite resplandece como o dia! Pensemos ainda nas palavras do Salmista: “Gritaram ao Senhor na aflição, e Ele os libertou daquela angústia. Transformou a tempestade em bonança, e as ondas do oceano se calaram. Alegraram-se ao ver o mar tranquilo, e ao porto desejado os conduziu. Agradeçam ao Senhor por Seu amor e por Suas maravilhas entre os homens!”

– Senhor Jesus, perdoa porque ainda somos medrosos, ainda temos tantos temores!
Quantas vezes juramos confiança em Ti;
quantas vezes dizemos que Te amamos...
Mas, na tempestade e na treva do mar bravio e profundo, tememos e duvidamos e, ainda, raivosos, temos queixas de Ti e a Ti acusamos...
Perdoa nossa insensatez, perdoa nossa descrença, perdoa nossa cegueira!
Conduze, Tu mesmo, como bem quiseres, a barquinha da Igreja, o barco pequenino da nossa vida!

Dá-nos a confiança de que Tu és o fiel condutor e o porto bendito, no qual um Dia ancoraremos para sempre a pobre barca da nossa existência. Amém.

domingo, 14 de junho de 2015

XI Domingo: o Reino que vem, tão frágil le tão forte

Ez 17,22-24
Sl 91
2Cor 5,6-10
Mc 4,26-34

No Evangelho deste Domingo, o Senhor nosso Jesus Cristo fala-nos sobre o Reino de Deus que Ele mesmo veio inaugurar com Sua santa Encarnação, com Seu ministério público, com Sua Paixão, Morte e Ressurreição; Reino que Ele nos deu com o dom do Seu Espírito Santo!

Observai, Irmãos, que sempre que fala do Reino, Jesus nosso Senhor usa imagens, fala-nos em parábolas. É que o Reino não pode ser descrito, não pode ser resumido num conceito! Esse Reino bendito de Deus Pai é o próprio Senhor Deus de Israel reinando no nosso coração, na nossa vida e, através de nós, na vida do mundo. Esse Reino foi trazido pelo Senhor Jesus porque Nele, o Filho feito obediente por nós até a morte e morte de cruz, o Pai reinou totalmente, até ressuscitá-Lo na potência do Santo Espírito. Assim, em Jesus o Reinado do Pai manifesta-se de modo pleno, em Jesus Deus reinou totalmente; em Jesus aparece as dores do Reino, dores de cruz; em Jesus aparece a glória do Reino, glória de ressurreição; em Jesus aparece a fraqueza do Reino e a força do Reino! E tudo isto se dá na força do Santo Espírito que, dando-nos os sentimentos de Cristo, dá-nos a graça de deixar que o Reinado de Deus entre em nós nesta vida e nos faça dela herdeiros na Vida que há de vir, na plenitude do Reino, na Glória do Céu!

Caríssimos, o que diz o Senhor? Que parábolas nos conta para fazer-nos entrever algo do Seu Reino bendito?
Primeiro nos ensina que o “Reino de Deus é como quando alguém espalha a semente na terra. Ele vai dormir e acorda, noite e dia, e a semente vai germinando e crescendo, mas ele não sabe como isso acontece... Quando as espigas estão maduras, o homem mete logo a foice, porque o tempo da colheita chegou!”

Que significa isto, Irmãos? O Reino é semeado por Jesus e por todos aqueles que em Seu Nome pregam o Reinado de Deus. A nós compete pregar, como Jesus pregou; mas, atenção: a Palavra do Reino tem sua força própria! Não depende de nós! Como a semente, uma vez lançada à terra, cresce com seu próprio vigor, assim o Reino! Confiemos: ele tem a força vinda do próprio Espírito do Senhor Deus!
Às vezes, esse Reino parece tão frágil e nossa pregação e nosso esforço tão inúteis... Não, meus caros: o Reino tem seu próprio tempo, sua própria força, sua própria dinâmica! No tempo de Deus e no modo de Deus chegará o momento da colheita; então, todos e tudo seremos colocados diante do tremendo tribunal de Cristo, como nos diz o santo Apóstolo na segunda leitura de hoje!
A nós cabe acolher o Reino, a nós cabe testemunhá-lo, a nós cabe anunciá-lo onde quer que vivamos! Ao Senhor cabe o restante, Ele que é fiel, atuante e tudo pode! Somente recordemos: os tempos e modos do Senhor Deus não são os nossos! Ele é capaz de abater o soberbo e elevar os humildes e insignificantes, como faz com os cedros do Líbano na primeira leitura de hoje!

Depois, a outra parábola: “O Reino de Deus é como um grão de mostarda, menor de todas as sementes. Cresce e se torna maior que todas as hortaliças e os pássaros do céu podem abrigar-se à sua sombra”. Compreendeis? O Reino parece tão pequeno, tão insignificante, tão frágil... No entanto, anunciado, semeado, ele crescerá e a humanidade toda, as nações, representadas pelos pássaros dos céus, poderão abrigar-se nele!
Eis quão pequeno e quão grande é o Reino! Ei-lo, tão frágil e tão forte, tão dom de Deus e tão responsabilidade nossa como testemunhas, como anunciadores!

Um dia, meus caros, esse Reinado de Deus que deve por nós ser acolhido, acolhido na nossa existência, recebido em todos os aspectos da nossa vida, esse Reino será pleno em nós, no Dia de Cristo. Nossa vida neste mundo é caminho para a plenitude do Reino na Glória celeste.
Na segunda leitura deste Eucaristia sagrada, São Paulo recorda que “enquanto moramos no corpo, somos peregrinos, longe do Senhor”, caminhando na sombra do fé, não ainda na visão clara. Gostaríamos de ir morar logo com o Senhor, deixando a moradia deste corpo. A questão é que desejamos receber um corpo glorioso sem ter que passar pela desnudez da morte, quando este nosso corpo, separado da nossa alma, será destruído. Mas, não será assim: vamos ser desvestidos deste corpo e, no final dos tempos, receberemos um vestido de glória, este nosso corpo ressuscitado e glorioso! No Dia de Cristo, quer estejamos nus – isto é, já no Céu somente com nossa alma – ou vestidos – quer dizer, ainda aqui neste mundo, com este corpo -, todos nós seremos transfigurados, recebendo um corpo de Glória, um corpo pleno do mesmo Espírito Santo que ressuscitou Jesus dentre os mortos!

Então, caríssimos meus no Senhor, nosso compromisso com o Reino do Pai, que o Senhor veio nos trazer no Espírito Santo, nosso empenho em acolhê-lo, em testemunhá-lo, em difundi-lo, será o critério para o nosso destino quando estivermos no tremendo tribunal de Cristo!

Levemos a sério a advertência do Senhor! Não sejamos cristãos frios, descomprometidos, preguiçosos em relação ao que é do Senhor! Que lástima: quando se trata do trabalho do Reino tudo para nós é difícil, tudo é custoso! Que raça de cristãos somos nós, que deixamos Deus e o Seu Reino no último lugar! Atentos ao juízo do Senhor! Convertamo-nos! Na família, no trabalho, na vida social, na vida paroquial, no nosso grupo, em tudo quanto fizermos e onde estivermos, sejamos testemunhas e semeadores do Reino! E que o Senhor, por compaixão nos conceda dele participar em plenitude na Glória eterna. Amém.