quinta-feira, 11 de junho de 2020

A Eucaristia V


Nos últimos dois tópicos, vimos textos da Sagrada Escritura que tratam da Eucaristia. Agora, veremos alguns textos da Igreja antiga, que mostram bem o quanto a Comunidade cristã sempre celebrou e viveu o Sacramento do Corpo e do Sangue do Senhor.

 

Santo Inácio de Antioquia, mártir de Cristo, lá pelo final dos anos 90 do século I da era cristã, aconselhava aos Efésios: “Procurai, pois, reunir-vos com mais frequência, para dar a Deus a ação de graças (fazer a Eucaristia) e louvor. Porque quando vos congregais com frequência num mesmo  lugar, quebram-se as forças de Satanás”. Para o santo bispo de Antioquia, a Eucaristia, único Corpo do Senhor, é sacramento (isto é, sinal eficaz, operante, que torna presente e atuante o que é celebrado nos símbolos e ritos) da unidade da Igreja. Aos filadélfios, ele exortava: “Esforçai-vos, portanto, para usar uma só Eucaristia, pois uma só é a Carne de nosso Senhor Jesus Cristo e um só é o cálice que nos une no Seu Sangue, um só altar, como um só Bispo junto com o presbitério e com os diáconos”. É importante observar como a Eucaristia não é uma realidade privada, para simples piedade pessoal e íntima, mas é o Sacramento que nos une a Cristo, como membros do Seu Corpo e, assim, nos une reciprocamente no Senhor, fazendo-nos Igreja Corpo de Cristo. A Eucaristia gera a Igreja e dela é Sacramento! Sendo conduzido preso para Roma para ser jogado às feras por causa de Cristo, Santo Inácio assim escrevia aos romanos: “Não sinto prazer pela comida corruptível nem pelos deleites desta vida. Quero o pão de Deus, que é a Carne de Jesus Cristo e por bebida, quero o Sangue Dele, o qual é a caridade incorruptível”. Compreendamos: o sangue derramado, isto é, a vida entregue livremente por amor, é a máxima manifestação do amor-caridade do Senhor por nós, caridade incorruptível!

 

Um outro belo testemunho encontra-se na Didaqué, que é praticamente o primeiro catecismo da Igreja, escrito lá pelo final do século I. Com palavras que hoje emocionam qualquer católico, o autor, no início do cristianismo, orienta os cristãos sobre o modo de celebrar o Sacramento da Missa: “No que concerne à Eucaristia, celebrai-a da seguinte maneira: primeiro sobre o cálice, dizendo: ‘Nós Te damos graças (eucharistoumen = Te fazemos Eucaristia), nosso Pai, pela santa vinha de Davi, Teu Servo (a vinha é a Igreja, Davi é o Cristo, o Ungido do Pai), que Tu revelaste por Jesus, Teu Servo. A Ti a glória pelos séculos! Amém’. Sobre o pão a ser fracionado: ‘Nós Te agradecemos, nosso Pai, pela Vida e pelo conhecimento que nos revelaste por Jesus, Teu Servo. A Ti a glória pelos séculos. Amém. Ó Pai, da mesma maneira como este pão partido fora primeiro semeado sobre as colinas e depois recolhido para tornar-se um, assim, das extremidades da terra seja unida a Tua Igreja em Teu Reino!’ Ninguém coma nem beba de vossa Eucaristia, se não estiver batizado em Nome do Senhor. Pois a respeito dela o Senhor disse: ‘Não deis aos cães as coisas santas!’” Observemos como neste texto a Eucaristia aparece como ação de graças ao Pai por Jesus, o Messias, e como o Sacramento que reúne a Igreja na unidade. Insisto: a Eucaristia nunca foi concebida pelos cristãos simplesmente como comunhão da hóstia, desvinculada do contexto do Banquete sacrifical e nunca foi pensada como uma realidade a ser recebida para o deleite privado! Não: ela é Sacramento da própria Igreja, Corpo do Senhor! Nós dela participamos como membros desse Corpo e para a edificação e divinização do Corpo! É como membros do Corpo do Senhor, membros do Povo santo de Deus, Povo da nova e eterna Aliança, que participamos do Sacrifício eucarístico e comungamos no Corpo eucarístico para estarmos na comunhão do Corpo eclesial! Mais adiante, ainda na Didaqué, o autor recomenda: “Reuni-vos no Dia do Senhor (Domingo, Dies Domini) para a Fração do Pão e celebrai a Eucaristia, depois de haverdes confessado vossos pecados, para que vosso Sacrifício seja puro. Mas todo aquele que vive em discórdia com o outro, não se junte a vós antes de se ter reconciliado, a fim de que vosso Sacrifício não seja profanado. Com efeito, deste Sacrifício disse o Senhor: ‘Em todo o lugar e em todo o tempo se Me oferece um Sacrifício puro, porque sou um grande Rei – diz o Senhor – e o Meu Nome é admirável entre todos os povos!’” É emocionante ver um texto do primeiro século cristão que exprime a fé da Igreja apostólica e perceber que ainda hoje, dois mil anos depois, a Igreja de Cristo permanece fiel à fé de nossos antepassados: no Domingo, os cristãos participavam da Eucaristia, sabendo que ela é o Sacrifício do Senhor Jesus! Observa também, mais uma vez: não pode participar do Sacrifício do Corpo de Cristo quem vive na discórdia, na divisão em relação ao Corpo do Senhor! A Eucaristia é Sacramento da unidade do Corpo com Cristo Cabeça e entre os seus membros! Dá pena ver tantas e tantos grupos cristãos que, abandonando a fé católica, recebida desde o início, mutilaram tristemente a fé transmitida pelos Apóstolos!

 

Num outro texto desta série sobre a Eucaristia, já citei um belíssimo texto de São Justino, mártir, que lá pelo ano 155, explicava como se celebrava este Sacramento. Agora, cito ainda um texto seu. Vele a pena! “Este alimento é chamado entre nós de Eucaristia, do qual a nenhum outro é permitido participar, senão a quem crê que nossa doutrina é verdadeira e que foi purificado com o Batismo para o perdão dos pecados e para a regeneração e que vive como Cristo nos ensinou. Porque estas coisas, nós não as tomamos como pão comum nem bebida comum, mas assim como o Verbo de Deus, havendo-Se encarnado em Jesus Cristo, nosso Salvador, tomou carne e sangue para nossa salvação, assim também nos foi ensinado que o alimento eucaristizado mediante a palavra da oração que vem Dele... é a Carne e o Sangue daquele Jesus que Se encarnou!” Notemos como aparece claríssima a convicção de que o pão e o vinho eucaristizados (consagrados pelas palavras de ação de graças, isto é, a Oração Eucarística) são verdadeiramente Corpo e Sangue do Senhor!

 

Também Santo Irineu, o grande teólogo, Bispo de Lião, na Gália do século II, tem palavras belíssimas sobre a Eucaristia. Tomemos algumas. No primeiro texto, combatendo os hereges gnósticos, que negavam a ressurreição (avós dos reencarnacionistas atuais e de todos os ramos da Nova Era), ele usa a Eucaristia como prova de que os mortos ressuscitam carnalmente. Eis: “Como (os hereges) podem dizer que a carne se corrompe e não participa da Vida (não ressuscita), ela que é alimentada com o Corpo e Sangue do Senhor? Portanto (os hereges), ou mudem de opinião ou deixem de oferecer as ditas coisas (o pão e o vinho eucarístico, que eles ofereciam nas missas deles). Para nós, contudo, nossa crença concorda com a Eucaristia e a Eucaristia, por sua vez, confirma a nossa crença. Porque assim como o pão que é da terra, recebendo a invocação de Deus (quando o sacerdote impõe as mãos pedindo o Espírito Santo e pronunciando as palavras da consagração), já não é pão ordinário, mas sim Eucaristia, assim também nossos corpos, recebendo a Eucaristia, não são mais corruptíveis, mas possuem a esperança da ressurreição para sempre!” Este texto é de uma beleza e de uma profundidade impressionantes! Santo Irineu garante: nós ressuscitaremos e já recebemos a garantia da ressurreição, que é a Eucaristia. O pão, depois de consagrado, é o Corpo do Senhor, é pão de Vida divina, assim, nossa carne que recebe a Carne ressuscitada de Cristo, cheia do Espírito Santo, não permanecerá na morte, mas ressuscitará, exatamente como Jesus, nosso Senhor, prometera: “quem come a Minha Carne e bebe o Meu Sangue tem a Vida eterna e Eu o ressuscitarei no Último Dia!” (Jo 6,54). Observe também como, já no século II, o santo Bispo mostra que não pode comungar quem não crê na ressurreição. É o caso de todo reencarnacionista: de modo algum pode comungar o Corpo ressuscitado e ressuscitante do Salvador! Essa comunhão seria uma mentira, seria uma injúria ao Sacramento, pois seria receber o que se nega!

 

Ainda um texto de Santo Irineu, para deixar confuso qualquer um que negue que nossa carne ressuscitará: “Quando pois, o cálice misturado (com água) e o pão recebem o Verbo de Deus e se fazem Eucaristia, Corpo de Cristo, com o qual a substância de nossa carne aumenta e se faz, como podem dizer que nossa carne não é capaz do Dom de Deus, que é a Vida eterna, a carne alimentada com o Corpo e o Sangue do Senhor e feita membro Dele?” A questão colocada aqui por Santo Irineu é clara: como é que os hereges têm coragem de dizer que nossa carne, nosso corpo, não pode ressuscitar, não pode herdar a Vida eterna, divina, se ela é alimentada com a Eucaristia? A Eucaristia é, portanto, penhor de nossa ressurreição. É por isso que nossa Mãe católica tem tanto cuidado e pede tanto aos seus sacerdotes que assistam os doentes às portas da morte, para que eles recebam em viático a comunhão. Aí, o ministro sagrado diz ao que está morrendo: “O Corpo de Cristo te guarde para a Vida eterna!” Que coisa, que graça: morrer alimentando-se com a Vida que vence a morte; morrer unido – carne na Carne! – Àquele que destruiu a morte! Santa Eucaristia!


Ainda continuaremos...

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Caro Irmão, serão aceitos somente comentários que não sejam ofensivos ou desrespeitosos.
Nem sempre terei como responder ao que me perguntam, pois meu tempo é limitado e somente eu cuido deste Blog.
Seu comentário pode demorar um pouco a ser publicado... É questão de tempo...
Obrigado pela compreensão! Paz no Senhor!