“Houve um homem enviado por Deus. Seu nome era João. Ele não era a Luz, mas veio para dar testemunho da Luz” (Jo 1,6.8). Assim o Quarto Evangelho apresenta João Batista, João o Batizador, que hoje a Igreja celebra. É notável como tão poucas palavras dizem tudo desse impressionante profeta de Deus.
“Houve um homem enviado por Deus”. - João não veio por si mesmo, não veio de si mesmo. Foi enviado, é fruto de um sonho de Deus, tem uma missão neste mundo. Assim João, assim cada um de nós. Para quem não crê, o homem é fruto do acaso e a vida de uma pessoa não tem sentido transcendente. Mas, quem crê em Deus, quem vê o tempo à luz da Eternidade, sabe com serena admiração que cada pessoa que vem a este mundo é fruto de um pensamento de Deus que não se repete jamais. Cada pessoa tem uma dignidade inalienável, desde o primeiro momento da concepção, cada pessoa tem uma missão neste mundo. João teve a sua: preparar a vinda do Messias esperado por Israel. Sua missão fora anunciada cerca de quatrocentos anos antes de seu nascimento pelo profeta Malaquias: “Eis que vou enviar o Meu mensageiro para que prepare um caminho diante de Mim. Então, de repente, entrará em Seu Templo o Senhor que vós procurais, o Anjo da Aliança, que vós desejais. Eis que vos enviarei Elias, o profeta, antes que chegue o Dia do Senhor, grande e terrível. Ele fará voltar o coração dos pais para os filhos e o coração dos filhos para os pais” (3,1.23).
Foi também um homem do Absoluto, um homem de Deus, alguém que só de olhar para ele, fazia recordar, com saudade, as coisas do Céu. João viveu em função de Deus, viveu no deserto. Não era “João do carneirinho”, não era “bonzinho”. Era um homem duro como pedra, alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre, vestia-se com pelos de camelo e um cinturão de couro (cf. Mt 3,4). Era um homem que arriscou acreditar em Deus, escutar o Seu chamado, dizer “sim” à missão que o Senhor lhe confiara e viver só para esse Deus. Certa vez, Jesus fez-lhe um elogio rasgado: “Quem fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? Mas que fostes ver? Um homem vestido de roupas finas? Mas os que vestem roupas finas vivem nos palácios dos reis. Então, que fostes ver? Um profeta? Eu vos afirmo que sim, e mais que um profeta... Em verdade vos digo que, entre os nascidos de mulher, não surgiu nenhum maior do que João, o Batista” (Mt 11,7-11). Sua missão foi preparar a chegada do Messias, despertando e agitando o coração de Israel. Ele era um novo Elias: como Elias, impulsionado pelo Espírito de Deus; como Elias, viveu no deserto; como Elias, fora enviado para sacudir o coração do povo; como Elias enfrentou Acab, João enfrentou Herodes, como Elias foi perseguido por Jezabel, assim João, por Herodíades. Ambos, homens de Deus, ambos profetas gigantes, ambos, homens de fogo, incoformados com a mediocridade de uma religião arrumadinha!
“Seu nome era João”. - Iohanah, em hebraico, que significa “Deus dá a graça”. Nas Escrituras santas, o nome diz tudo, diz a sina, a missão. “João” é o menino cujo nascimento hoje celebramos. Efetivamente, toda a sua vida foi testemunhar a graça que Deus nos deu, a graça que é Jesus, o Messias. O nome, a vida, a palavra, a morte de João, tudo foi um, foi inteiro, coerente; tudo foi anúncio do Cristo que viria como graça invencível e definitiva de Deus para o mundo. Portanto, João foi seu nome, João sua vida, João sua pregação, João, sua morte. Bendito João!
“Ele não era a Luz, mas veio para dar testemunho da Luz”. - Aqui o aspecto mais característico e comovente de João: sua humildade, sua profunda consciência de quem não era e de quem era. O Batista sabia que não era o Cristo, mas Seu Precursor; sabia que não era a Palavra, mas somente a voz que clama no deserto. De modo maduro e tranquilo aceitou viver toda a vida em função de um Outro, daquele que é o Filho amado, o Ungido de Deus; humildemente, aceitou diminuir para que Jesus crescesse e confessou não ser digno de desatar-Lhe a correia das sandálias. Não! Definitivamente, não foi fácil a sua missão! E, no entanto, com que fidelidade ele a levou a termo! Serenamente, João tinha consciência de que somente Jesus é a Luz do mundo, Aquela que ilumina a todos, que a todos desvela o verdadeiro e definitivo sentido da existência. Assim, esse santo profeta de Deus não foi somente homem do Absoluto; foi também homem relativo, homem que soube relativizar-se. Fazia sucesso; muitos viam escutá-lo e receber o seu batismo. Ele avisava, realista: “Eu não sou o Messias, sou apenas a voz que clama no deserto: preparai o caminho do Senhor!” (cf. Jo 1,19-30).
Quando Jesus começou a pregar e os discípulos do Batista encheram-se de ciúme, nosso João disse, tranquilamente, a respeito de Jesus: “É necessário que Ele cresça e eu diminua” (cf. Jo 3,22-30). O anúncio do seu nascimento preparou o anúncio do nascimento de Jesus; sua natividade, precedeu o Natal de Jesus, sua pregação abriu caminho para a de Jesus e, finalmente, sua morte anunciou a de Jesus. João foi sempre relativo, preparou sempre um Outro! Só alguém muito livre e maduro poderia viver tal missão em paz. João viveu assim. Ser homem do Absoluto, que levou a sério o seu Deus, e ser homem totalmente relativo, a serviço do anúncio do Messias, levaram João a maus bocados. Ele denunciou o pecado de Herodes; seu mau exemplo, sua infidelidade ao Deus de Israel: Herodes vivia com sua cunhada. João gritou, em nome de Deus: “Não te é lícito!” (cf. Mc 6,18). O profeta tem sempre a incômoda missão de recordar às pessoas que o homem não é a medida de todas as coisas: nem tudo é lícito, nem tudo é permitido, nem tudo é de acordo com a vontade de Deus. O Batista tinha repreendido os soldados pela violência, os publicanos pela ganância e o povo todo pela preguiça em buscar sinceramente a vontade de Deus (cf. Mt 3,712; Lc 3,7-14). Herodes mandou prender o profeta.
Foi, precisamente, da prisão, que João dera o mais belo e comovente testemunho a respeito de Jesus. Ele havia anunciado um Messias juiz, vingador de Deus, severo executor da vontade do Altíssimo. Por fidelidade ao anúncio do Messias, ele, o Batizador, estava preso numa masmorra. E, agora, ouvia as notícias sobre Jesus: o Profeta de Nazaré era manso, humilde, misericordioso... Não era bem o Messias como João havia imaginado! Então, ele chamou dois de seus discípulos e os enviou a Jesus com uma pergunta: “És Tu Aquele que deve vir, ou devemos ainda espera um outro?” E Jesus respondeu: “Dizei a João o que vistes e ouvistes: os coxos andam, os cegos recuperam a vista e os pobres são evangelizados” – Eram os sinais que os profetas atribuíram ao Messias... E Jesus completou: “Felizes os que não se escandalizam por Minha causa” (cf. Lc 7,18-23). João, também ele, teve que deixar sua própria visão de Deus e do Messias, para acolher Jesus como o Cristo. Foi sua última conversão, seu último testemunho, a conclusão de sua missão. Agora, podia morrer em paz. E morreu, vítima da fraqueza de um rei bêbado, da maldade de uma mulher maquiavélica e da leviandade de uma menina vulgar (cf. Mc 6,17-29).
Por tudo isto João é grande, João é exemplo, João viverá para sempre na memória e na gratidão da Igreja. Pelo que foi e pela missão cumprida e pelo exemplo que deu a Igreja louvará e adorará para sempre a Deus cantando os louvores do homem chamado João, o Batista.
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