Caríssimos irmãos, há dois nascimentos em Cristo, e tanto um como o outro são a expressão de um poder divino que nos ultrapassa absolutamente. Por um lado, Deus gera o Seu Filho a partir de Si mesmo; por outro, Ele é concebido por uma Virgem por intervenção de Deus. Por um lado, Ele nasce para criar a vida; por outro, para eliminar a morte. Ali, nasce de Seu Pai; aqui, é trazido ao mundo pelos homens. Por ter sido gerado pelo Pai, está na origem do homem; por ter nascido humanamente, liberta o homem. Uma e outra formas de nascimento são propriamente inexprimíveis e ao mesmo tempo inseparáveis. |
Quando ensinamos que há dois nascimentos em Cristo, não queremos com isto dizer que o Filho de Deus nasça duas vezes; mas afirmamos a dualidade de natureza num só e mesmo Filho de Deus. Por um lado, nasceu Aquele que já existia; por outro, foi produzido Aquele que ainda não existia. O bem-aventurado evangelista João afirma isto mesmo com as seguintes palavras: "No princípio era o Verbo; o Verbo estava em Deus; e o Verbo era Deus” e ainda: “E o Verbo Se fez carne”. |
Assim, pois, Deus, que estava junto de Deus, saiu Dele, e a carne de Deus, que não estava Nele, saiu de uma mulher. O Verbo fez-Se carne, não de maneira que Deus Se diluísse no homem, mas para que o homem fosse gloriosamente elevado em Deus. É por isso que Deus não nasce duas vezes; mas, por estes dois gêneros de nascimento – a saber, o de Deus e o do homem –, o Filho único do Pai quis ser, a um tempo, Deus e homem na mesma Pessoa: “E quem poderá contar o Seu nascimento?” (Is 53, 8 Vulg)
“A Vida Se manifestou!”
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Temas relacionados à fé católica. Opiniões e análises sempre a partir de uma perspectiva de visão cristã.
segunda-feira, 31 de dezembro de 2018
O nascimento do Verbo, por São Máximo de Turim (séc. V)
quinta-feira, 27 de dezembro de 2018
Homilia para a Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus
Nm 6,22-27
Sl 66
Gl 4,4-7
Lc 2,16-21
Hoje é a Oitava do Santo Natal. É um antiquíssimo costume da Igreja de Roma, voltar seu coração e sua mente, neste dia, para Aquela de quem nasceu o Salvador do mundo. O Evangelho de São Mateus afirma que os magos, ao entrarem onde estava a Sagrada Família, “viram o Menino com Maria, Sua Mãe e, prostrando-se, O homenagearam” (2,11).
Trata-se da homenagem solene e ritual prestada aos reis orientais. E, no Oriente, a Mãe do rei, chamada gebirah, exercia um papel importantíssimo. Pois, eis aqui, na cena do Evangelho, o Rei dos judeus, o Rei-Messias, o Rei que é Deus, e Sua Rainha-Mãe, sua gebirah, a Virgem Maria! Agradecida pelo seu “sim” ao plano de Deus, a Igreja chama-a, desde os primórdios da fé cristã, de “Mãe de Deus”, isto é, “Mãe de Deus-Filho feito homem”! Com isto, nós confessamos que o Menino nascido da Virgem é Deus verdadeiro e perfeito, uma Pessoa divina com a natureza divina completa e uma verdadeira natureza humana. Ele, Filho do eterno Pai, fez-Se realmente, como homem, filho de Maria Virgem, sem deixar de ser Deus! Na Virgem Santíssima, que trouxe em seu seio a segunda Pessoa da Trindade Santa, o divino e o humano se encontraram para sempre, os Céus e a terra se abraçaram para nunca mais se deixarem!
Ao recordar a Maternidade Divina de Nossa Senhora, a Igreja recorda também as condições maravilhosas dessa maternidade: ela aconteceu de modo virginal! Com efeito, a Mãe do Senhor concebeu virginalmente, virginalmente deu à luz e virgem permaneceu para sempre! A Virgem não somente concebeu, mas também virginalmente deu à luz um Filho – eis a profecia de Isaías (cf. 7,14). A Igreja canta esse mistério com palavras admiráveis: “Na sarça que Moisés via arder sem se consumir, admiramos o sinal da vossa incomparável virgindade, ó Mãe de Deus!” e ainda, pensando na porta selada, pela qual somente o Senhor passaria, como profetizou Ezequiel (cf. 44,2), a Igreja exclama: “A porta eterna do Templo eternamente fechado feliz e pronta se abre somente ao Rei esperado!”.
Aqui silencia a imaginação humana, pois que pertence ao segredo de Deus o modo como, Virgem, Nossa Senhora concebeu e ainda como, virginalmente, deu à luz! Uma coisa é certa: sua virgindade perpétua quer nos mostrar o quanto esse Menino todo vindo de Deus é um novo começo, um novo início para toda a criação e toda a humanidade! Além do mais, revela o quanto Maria Virgem foi integralmente de Deus, de corpo e alma. Num mundo que endeusa o sexo e exalta de modo abusivo a sensualidade, a Santíssima Virgem nos aponta outros valores e revela a beleza da virgindade e da castidade como expressão do ser humano vivendo livre, debaixo do senhorio de Cristo, no seu corpo, no seu afeto e na sua alma! Quanto mais alguém vive totalmente para o Senhor, mais fecundo se torna em sua vida e mais traz Jesus ao mundo, como testemunha do Reino dos Céus. Por isso a saudação que a Igreja hoje dirige à Virgem Maria: “Salve, ó Santa Mãe de Deus, vós destes à luz o Rei que governa o céu e a terra pelos séculos eternos!”
Hoje também, oitavo dia do nascimento do Fruto do ventre da Virgem, a Igreja recorda a circuncisão do Menino. Ele, circuncidado, passou a fazer parte do Povo de Israel. Assim, cumpriu-se a promessa que Deus fizera a Abraão, nosso Pai. Da sua descendência o Senhor fizera surgir um Salvador para todas as nações: “Quando se completou o tempo previsto, Deus enviou o Seu filho, nascido de uma Mulher, nascido sob a Lei!”. Circuncidado, o Menino recebeu o nome de Jesus, que significa “o Senhor salva”. Seu nome revela Sua identidade, Sua missão e a causa da nossa alegria! Ele é a salvação que Deus nos concede, Ele é a nossa Paz, pois nos reconcilia com Deus e nos abre as portas do céu. Por isso mesmo, os cristãos hoje, juntamente com toda a humanidade, celebram o Dia da Paz. Para nós, essa Paz tem um nome, tem um rosto, tem um sorriso. Podemos encontrar tudo isso Naquele que veio de Maria, a Virgem! Somente abrindo-se para Ele, o mundo encontrará a verdadeira paz!
Confiemos, pois, os dias do novo Ano civil que está começando, a este Menino, o Príncipe da Paz. Que o Seu Nome repouse sobre nós, como uma bênção! Certamente, neste 2019 choraremos e sorriremos, venceremos e fracassaremos, cairemos e nos ergueremos... Não importa! Importa, sim, que estejamos com o Senhor, Ele, que estará sempre conosco. Ele foi apelidado – não esqueçamos – de Emanuel, Deus-conosco! Que este ano seja, como se colocavam nos antigos documentos, “Ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo!”
Hoje, também tomaram posse os novos governantes da nossa Pátria e dos Estados da Federação brasileira. Como nos manda as Escrituras, rezemos pelos nossos governantes, para que nos dirijam com sabedoria, com prudência, com honestidade, com preocupação sincera pelo bem comum. Que nossos líderes não sejam corruptos, que se preocupem com os mais necessitados e promovam lealmente os verdadeiros valores humanos e cristãos que forjaram a nossa sociedade.
Coloquemos, pois, os dias de nossa vida nas mãos do Salvador. E, como penhor de que nossas preces serão ouvidas, supliquemos à Mãe de Deus toda Santa: “À vossa proteção recorremos, ó Santa Mãe de Deus! Protegei os pobres, ajudai os fracos, consolai os tristes, rogai pela Igreja, protegei o clero, ajudai-nos todos, sede nossa salvação! Santa Maria, sois a Mãe dos homens, sois a Mãe do Cristo que nos fez irmãos! Rogai pela Igreja, pela humanidade e fazei que, enfim, tenhamos paz e salvação!” Amém.
Homilia para a Festa da Sagrada Família - ano c
“Vieram apressados os pastores, e encontraram Maria com José e o Menino deitado no presépio” (Lc 2,16).
Como é eloquente esta afirmação do Evangelho! O Menino que nasceu para nós, tão humano, encontrado com Seu pai e Sua Mãe, no seio - tão normal, tão nosso - de uma família! É o sentido da festa deste Domingo dentro da Oitava do santo Natal.
Compreendamos: a Festa do Natal não se resume a um dia; trata-se, antes de um tempo, no qual a Igreja celebra o mistério da Manifestação do Senhor na nossa humanidade. Ele assumiu tudo quanto é nosso, encheu tudo quanto é nosso com a Sua bendita divindade, para nos fazer participar da Sua Vida eterna. Em outras palavras: assumiu a nossa humanidade para encher-nos com a Sua divindade! Pois bem: Jesus, o Filho eterno do Pai, assumiu realmente uma família humana! Poderia ter simplesmente aparecido na terra... Mas, não: nasceu de uma Mãe, precisou de um pai, de um lar, de uma vida familiar. E isto tem implicações seríssimas para a nossa fé cristã. Vejamos:
Antes de mais nada, a festa deste hoje deixa claro que a família é sagrada. Para nós, cristãos, ela não é somente uma realidade cultural, social, antropológica; é, acima de tudo, uma realidade teológica, isto é, ela pertence ao plano de Deus para a humanidade. Desde a criação, o Senhor pensou a humanidade como homem e mulher (cf. Gn 1,27) e determinou que o homem não estivesse sozinho (cf. Gn 2,18); desde o princípio, a primeira palavra do homem foi uma declaração de amor à mulher: “Esta sim, é osso de meus ossos e carne de minha carne” (Gn 2,23).Ora, o Cristo que veio para levar à plenitude tudo quanto o Pai sonhou deste o princípio, assumiu e santificou a família, de modo que, se ela já era santa porque faz parte do plano de Deus, mais santa ainda tornou-se, porque assumida e santificada pelo Cristo Jesus e feita por Ele sinal da Igreja e do Reino de Deus. É o que recorda o Evangelho de hoje, mostrando o Senhor Jesus no seio familiar, como qualquer criança, submisso aos Seus pais no dia-a-dia; é o que nos mostra, de modo muito terno e comovedor, a Carta aos Colossenses – a família como uma pequena Igreja, a Igreja da casa, a Igreja doméstica: “Irmãos, vós sois amados por Deus, sois Seus santos eleitos: revesti-vos de sincera misericórdia, humildade, mansidão e paciência, suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos mutuamente, se um tiver queixa contra o outro. Que a paz de Cristo reine em vossos corações, à qual fostes chamados como membros de um só corpo. Que a palavra de Cristo habite em vós. Tudo que fizerdes, seja feito em Nome do Senhor Jesus Cristo. Por meio Dele dai graças a Deus, o Pai”.
Notem que a família aqui é vista e pensada em Cristo, como uma pequena comunidade de irmãos em Cristo. Jamais, para um cristão, a vida familiar é simplesmente natural! Jamais um cristão poderá aceitar que seja chamado propriamente família quaisquer uniões, que não a união de um esposo com uma esposa e os filhos nascidos do amor deles ou pelo amor deles acolhidos! Com todo o respeito que os pares homossexuais merecem, e com todo respeito pelo pensamento de muitos juristas e juízes de família ou de sabichões arrogantes e vaidosos togados do Supremo Tribunal Federal, jamais será lícito a um cristão aceitar um conceito de família diferente daquele que a Palavra de Deus nos apresenta!
E que não venham dizer que a Igreja é desumana ou quadrada! Trata-se, aqui, de fidelidade à Palavra de Deus! E num tema decisivo para a humanidade! Destruir e desvirtuar a família, é colocar em perigo a própria humanidade, o próprio tecido social! Olhem o mundo atual, pensem na situação de nossos jovens, sem religião, descristianizados por falta de uma família realmente cristã, e vocês darão razão ao que digo!
No desígnio de Deus, a família não é somente uma pequena Igreja, mas é também lugar de humanização e realização humana. Basta recordar as palavras comoventes do Eclesiástico e do Salmo da Missa de hoje! É no seio familiar que se aprende a ser gente, aprende-se o amor, a solidariedade, o diálogo, o respeito de uns pelos outros, a vida comum, o valor do trabalho honesto, o valor da verdade, da piedade e da paz. Na família, aprende-se ou deve-se aprender a rezar e a amar a Deus com terno carinho. Na família também, nós fazemos as nossas primeiras experiências da Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, pois é aí que choramos pela primeira vez, aí enfrentamos as primeiras crises e os primeiros sofrimentos, como a família de Nazaré, no Evangelho de hoje! É aí, na família cristã, que aprendemos que o sofrimento, quando vivido na fé e em união com Cristo, torna-se fecundo, amadurece-nos, faz-nos crescer e nos dá a graça de participar da Paixão redentora do Senhor.
Infelizmente, uma sociedade como a nossa, paganizada, terra-terra, incapaz de sonhar ideais altos, já não mais compreende esta linguagem! A família é vista simplesmente sob um prisma humano, sem nenhuma referência ao plano de Deus, como se fora um mero ajuntamento de pessoas, uma mera “comunidade afetiva”, dizem os tolos sabichões do Direito de Família! Secularizada, a família cai no faça-você-mesmo, sendo destruída e desmoralizada! A televisão prega todos os dias o seu fim, as novelas desmoralizam-na, os astros e estrelas dos meios de comunicação defendem o divórcio, o aborto, a infidelidade conjugal, paterna e filial, a permissividade, a destruição dos gêneros masculino e feminino como Deus quis e criou, a desrespeito entre pais e filhos... Os resultados estão aí, patentes e trágicos! Que o digam os filhos que já não têm o direito de terem um pai e uma mãe vivendo juntos; que o digam os jovenzinhos que só sabem “ficar”, e isto com doze, treze anos de idade; que o digam as mães e pais solteiros de quatorze, quinze anos de idade; que o digam os tantos desquitados e divorciados e descasados de nossa sociedade, que o digam tantos jovem confusos em sua identidade sexual e marcados negativamente de modo traumático por experiências negativas e destrutivas que poderiam ter evitado...
Nós, cristãos, temos o dever sagrado de resgatar o plano de Deus para a família. Respeitando a opinião dos outros, dos pagãos – vários dos quais se dizem cristãos! – é preciso deixar claro qual o sonho de Deus para a realidade familiar humana! É preciso deixar patente que não aceitamos profanar algo que nasce de um sacramento e foi abençoado por Deus desde o princípio e santificado pelo Senhor Jesus! Aqui, não se trata de ser aberto ou não, moderno ou não, mas de ser fiel ou não, de ser cristão ou não, de levar a sério o Evangelho ou não! Não é permitido a ninguém – muito menos à Igreja! – adulterar e perverter o sagrado desígnio de Deus nosso Senhor!
Cristãos, que nossas famílias sejam cristãs! O Senhor pedir-nos-á contas de nossa vida de família! Que sejam nossos lares lugar de convivência pacífica e respeitosa, lugar de partilha de sonhos, problemas, esperanças, alegrias e tristezas; que sejam nossas famílias lugar onde se vive a fé, onde se reza diariamente, onde, aos domingos, o Senhor tenha um lugar especial; que sejam lugar de humanização, de crescimento nas virtudes humanas e cristãs! Lugar de diálogo, de perdão, de compreensão, de diálogo, e mútua ajuda e de paz! Que os pais aprendem a dialogar com os filhos, a ouvi-los, a falar-lhes, a corrigi-los, a incentivá-los, a perdoá-los. Que os filhos aprendam a respeitar seus pais, a escutá-los, a levar em consideração a experiência de vida que eles têm, a pensar com seriedade nos conselhos que dão! Que os filhos rejuveneçam os pais com seus sonhos; que os pais amadureçam os filhos com sua experiência! Que pais a filhos vivam debaixo do amor de Deus e do Evangelho de Cristo!
E que intercedam por nós a Virgem Maria e seu esposo, São José! Que tenha misericórdia de nós o Cristo Jesus, feito obediente a Seus pais no coração da casa de Nazaré. E que todos nos esforcemos sinceramente para construir em nossa casa um ambiente realmente de Igreja doméstica, que seja já agora um pedacinho do céu, daquele céu que esperamos, um dia, onde, com Maria sempre Virgem e com São José, contemplaremos eternamente o Cristo por nós nascido, que é Deus, com o Pai e o Espírito Santo. Amém.
terça-feira, 25 de dezembro de 2018
Homilia para a Missa do Dia do Natal do Senhor
Mais uma vez, caríssimos, a volta do ano trouxe-nos a santa Celebração do Natal do Senhor nosso Jesus Cristo. Historicamente, o natalício do Cristo nosso Deus ocorreu há dois mil anos atrás; no entanto, na potência do Santo Espírito, o Natal acontece hoje misticamente, nos santos mistérios que celebramos com piedade e unção. Cada um de nós, que participa desta Celebração sagrada, conserve no coração esta certeza: nos gestos, nas palavras, nos ritos da Santa Liturgia, a graça do santo Natal do Senhor faz-se realmente presente e verdadeiramente inunda a nossa vida! Para nós, aqui reunidos, o Natal é hoje, o Natal é agora!
Assim, podemos, cheios de admiração, escutar o Evangelho que nos anuncia: “O Verbo Se fez carne e habitou entre nós!” Em outras palavras: o Filho eterno do Pai, Luz gerada da Luz, Deus verdadeiro gerado eternamente do Deus verdadeiro, para salvar o mundo com a Sua piedosa vinda, hoje nasceu homem verdadeiro, homem entre os homens, de Maria, a Virgem!
Caríssimos, quem poderia imaginar tal mistério, tal surpresa de Deus, nosso Senhor?
A Liturgia oriental exclama, admirada: “Vinde, regozijemo-nos no Senhor, explicando o mistério deste Dia. A Imagem idêntica do Pai, o Vestígio de Sua eternidade, toma forma de escravo, nascendo de uma mãe que não conheceu o casamento, e sem mesmo sofrer mudança! O que Ele era, permaneceu: Deus verdadeiro; o que não era, Ele assumiu: tendo-Se feito homem por amor dos homens” (Grandes Vésperas do Natal).
Eis o mistério: o Menino que nos nasceu para nós, o filho que nos foi dado, é Deus perfeito, é o Filho eterno, através de Quem e para Quem tudo foi criado no céu e na terra. Ele não é uma pessoa humana; é uma Pessoa divina, a segunda da Trindade. Este Menininho é adorável: deve receber toda nossa adoração, todo nossa louvor, todo nosso afeto. No entanto, sendo Deus perfeito, hoje, Ele saiu do seio da Sempre Virgem Maria, como verdadeiro homem, homem perfeito, com um corpo igual ao nosso, com uma alma igual à nossa, com uma vida para viver igual à nossa pobre existência! Quanto amor, quanta bondade, quanta humildade!
Caríssimos, neste Deus hoje nascido da Virgem, a nossa humanidade foi unida ao próprio Deus.
Hoje a força do pecado começou a ser quebrada,
hoje a doença da nossa natureza humana, tão propensa ao pecado, ganhou seu verdadeiro remédio,
hoje, fazendo-Se homem mortal, o Salvador nosso veio trazer a medicina que cura a nossa morte!
Bendita seja a Sua gloriosa vinda, o Seu virginal nascimento! Adoremo-Lo! Afirmemos com a Igreja, na sua santa Liturgia:
“Foi depositado num estábulo Aquele que contém o universo.
Ele descansa numa manjedoura e reina nos Céus.
É o Salvador dos séculos, o Rei dos Anjos, Aquele mesmo que a Virgem amamentava (Liturgia romana).
Caríssimos, por tudo isso, nunca percamos de vista a graça que recebemos pelo dom da fé! Vivemos num mundo confuso, de mentiras, de idolatrias, de confusão. O homem pensa poder fazer sozinho a sua vida, encontrar do seu modo a felicidade, fazer de seu jeito a sua própria existência. A Solenidade de hoje nos recorda que a humanidade precisa de um Salvador – e esse Salvador é Jesus, nosso Senhor!
Ele é a nossa única Verdade,
Ele, o nosso único Caminho,
Ele, a verdadeira Vida!
Não queremos outros mestres, não admitiremos outros senhores, não buscaremos outras verdades. Mais que nunca, nesta quadra tão difícil da história, quando o cristianismo e a Igreja de Cristo são ameaçados externa e internamente, tão caluniados e perseguidos, quando a verdadeira fé é tão denegrida de tantos modos e os que a defendem são ridicularizados e vilipendiados...
Hoje, quando ser cristão tem se tornado motivo de chacota e gozação, queremos, uma vez mais, e com todas as nossas forças, proclamar nossa total e incondicional adesão ao nosso Deus e Senhor Jesus Cristo! Por isso, amados nos Senhor, o Filho de Deus fez-Se homem: para que o homem possa ver e ouvir claramente o que é ser homem, o que é viver de modo verdadeiramente digno, livre, maduro e feliz!
O mundo nos propõe uma liberdade torpe, fundada nos caprichos, na loucura de fazer aquilo que se quer;
o mundo nos tenta convencer que cada um é a sua própria medida, é o dono de sua própria vida;
o mundo atual nos ensina a viver entregue às próprias paixões, aos próprios desejos...
Aí estão: famílias destruídas, filhos sem pais, um rio de abortos e infelicidade, jovens sem esperança, uma sociedade sem valores nem critérios verdadeiramente dignos do homem criado à imagem de Deus...
Mas, outro é o caminho que o Salvador hoje nascido nos aponta. Aprendamos com Ele, o homem perfeito; sigamo-Lo sem medo, coloquemos aos Seus pés a nossa vida e a nossa liberdade, os nossos desejos e os nossos afetos. Deixemos que Sua santa lei de amor e graça inunde nosso coração, penetre nas nossas famílias, modele o nosso modo de viver! Então, seremos realmente humanos, seremos realmente livres, seremos realmente felizes!
Alegremo-nos, caríssimos, pela hodierna Solenidade!
“Que desapareça toda enfermidade: hoje, o Salvador apareceu.
Não haja guerra, cale-se a discórdia: hoje, a verdadeira paz desceu dos Céus.
Desapareça toda amargura: hoje por todo o universo os Céus destilam mel.
Fuja a morte, pois hoje a vida nos é dada dos Céus...
Hoje, os cegos recobram a vista, os surdos ouvem, os coxos e os leprosos são curados, aqueles que estavam na tristeza estão na alegria, os enfermos encontram a saúde, os mortos ressuscitam.
Somente o Diabo e seus demônios – e o mundo que os serve – tremem de cólera, pois sua derrota é a restauração do gênero humano.
Hoje, o Cristo nos apareceu como Salvador” (Homilia de um Anônimo do século V).
Eis, pois, quantos motivos para nossa alegria, quantos, para nosso júbilo! Que pessoalmente e em família, celebremos de modo santo e devoto a Vinda do Nosso grande Deus e Salvador Jesus Cristo, a Quem seja dada a glória com o Pai e o Espírito Santo pelos séculos dos séculos. Amém.
segunda-feira, 24 de dezembro de 2018
Homilia para a Missa da Noite do Natal do Senhor
“A Graça de Deus Se manifestou trazendo salvação para todos os homens!” Esta palavra da segunda leitura desta Noite santíssima exprime de modo admirável o sentido da hodierna Solenidade.
Vinde, caríssimos, aproximemo-nos do Presépio!
Para nossa surpresa, encontraremos, envolto em faixas, reclinado na manjedoura, Aquele que é a Graça de Deus feita carne, feita gente, feita humilde criança, feita um de nós; a Graça de Deus com rosto humano, com humano choramingar, com sorriso humano!
Que Mistério tão grande e tão doce!
Andávamos todos perdidos, como tantos ainda hoje – cada vez mais, ainda hoje! Não tínhamos um sentido para a vida; éramos presos por nossas paixões, escravos de nossos desejos desencontrados, entregues aos nossos próprios pensamentos, que levam ao nada.
Orgulhosos, seguíamos, cada um de nós, suas próprias ideias. Como os pagãos de hoje, pensávamos que éramos livres por fazermos o que queríamos, por seguir nossa tênue e obscura luz...
E, no entanto, éramos escravos de nós mesmos e de um mundo cego e perverso... Não sabíamos o que fazer com a vida, com a dor, com nossos instintos e tendências, com as feridas da existência; não compreendíamos o sentido do nosso caminho, não conseguíamos vislumbrar a estrada para a verdadeira felicidade e a verdadeira paz. Andávamos nas trevas, irmãos! E tão nas trevas, que nem sabíamos que nelas estávamos metidos, nelas miseravelmente mergulhados!
É que o homem sozinho não consegue se vencer, não consegue se superar, não consegue se libertar, não consegue enxergar com clareza o sentido...
Nossa vida parecia, como a dos pagãos de hoje, uma fiada de futilidades vazias de verdadeira alegria e nosso destino seria a morte, vazia e sem sentido. Ainda hoje, tantos pagãos, nossos amigos e familiares, nossos distantes e nossos próximos, vivem assim! Ainda hoje, há tantas lâmpadas na nossa cidade e tão pouca luz!
Mas, para nós, nesta Noite mil vezes abençoada, “a Graça de Deus Se manifestou”!
Nós vimos a Luz, Aquela que é capaz de iluminar a nossa existência! Jesus – eis o mais doce dos nomes; eis o nome dessa Graça bendita, Graça com jeito, choro, e sorriso de recém-nascido!
Vinde, vinde contemplá-Lo! Ele veio para nossa salvação! Veio para nos arrancar de nós mesmos, de nosso horizonte fechado e estreito; veio para abrir nosso pensamento, nosso sentimento, nossa vida, abri-los à dimensão do Coração de Deus, fazendo-nos felizes e verdadeiramente humanos! Não seremos nós mesmos, não seremos realizados, não seremos livres, a não ser abrindo-nos para Ele!
Acolhamos a graça e vivamos uma vida nova: “Ela nos ensina a abandonar a impiedade e as paixões mundanas e a viver neste mundo, com equilíbrio, justiça e piedade!” Ele veio, irmãos, porque, sozinhos, não conseguimos encontrar a verdade de nossa vida... Ele é a nossa Verdade, Ele é a nossa Vida!
Caríssimos, cada vez mais o mundo cai na treva, no paganismo, na cegueira. Tocamos, mais que nunca, a descristianização, a dissolução da família, a propagação do mal, a desmoralização de toda moral, de toda dignidade, de todo valor verdadeiro, a difusão de um pensamento anticristão e contrário aos perenes e santos ensinamentos da Igreja de Cristo ao longo dos séculos.
Nesta Noite sacratíssima, quantos estão se embriagando, quantos adulterando, quantos, pelas emissoras de rádio e televisão, pela internet, esbaldando-se em uma programação mundana; quantos, nesta Noite esplendorosa e doce, nem sabem que existe uma esperança, um sentido, uma mão de Deus estendida para toda a humanidade! Quantos, amados irmãos, dizendo-se ainda cristãos, vivem no pecado, aplaudem o que condenável pela santa Palavra de Deus, o que é vil aos olhos do Senhor; quantos há que se dizem cristãos e pensam e sentem e vivem como o mundo que não viu nem conheceu a Graça de Deus que hoje nos apareceu! Quantos, ainda que pareçam de Cristo, advogam e promovem um cristianismo mundano, relativista, vazio, à procura somente da compreensão e dos aplausos do mundo!
Eis que a Graça de Deus, hoje nascida do ventre da Sempre Virgem, convida-nos à conversão, convida-nos a uma séria mudança de modo de viver. Não seremos cegos, se vivermos na Sua luz; não seremos perdidos, se seguirmos Seus passos; não viveremos na morte, se nos abrirmos para Sua Vida!
Num de seus sermões para esta Festa solene, Santo Agostinho de Hipona assim exclamava: “Expergiscere, homo: quia pro te Deus factus est homo” - “Desperta, ó homem, porque por ti Deus Se fez homem!”! E o santo Bispo de Hipona continuava: "Desperta, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos e sobre ti Cristo resplandecerá! Por tua causa, repito, Deus Se fez homem. Estarias morto para sempre, se Ele não tivesse nascido no tempo. Jamais te libertarias da carne do pecado, se Ele não tivesse assumido uma carne semelhante à do pecado. Estarias condenado a uma eterna miséria, se não fosse a Sua misericórdia. Não voltarias à Vida, se Ele não tivesse vindo ao encontro da tua morte. Terias perecido, se Ele não te socorresse. Estarias perdido, se Ele não viesse salvar-te".
Caríssimos, tomemos consciência de tão grande graça! Nesse Menino que repousa no presépio foi-nos dada a força para sair do sono miserável de uma vida medíocre e vazia, de uma existência morna e sem elã.
Desperta, ó cristão, porque hoje brilhou para ti a Luz! Por ti, o Filho eterno fez-Se um de ti! Até onde Deus está disposto a te mostrar o Seu amor, a tirar-te de tua vida vazia!
Como exclamava a Liturgia medieval na Noite de hoje:
“Aquele que deu forma a todas as coisas recebe a forma de escravo;
Aquele que era Deus é gerado na carne;
eis que Ele é envolvido em panos, Aquele que era adorado no firmamento;
e eis que repousa numa manjedoura Aquele que reinava no Céu”.
Despertemos, caríssimos!
Que nossa alegria desta Noite, que a paz que inunda o nosso coração, transborde numa vida mais comprometida com o Cristo Jesus!
Que nossa existência seja realmente conforme a santidade e a liberdade Daquele que hoje nasceu da Virgem Santíssima!
“Porque nasceu para nós um Menino, foi-nos dado um Filho; Ele traz nos ombros a marca da realeza; o Nome que Lhe foi dado é: Conselheiro admirável, Deus forte, Pai dos tempos futuros, Príncipe da paz”.
A Ele a glória, pelos séculos dos séculos. Amém.
sábado, 22 de dezembro de 2018
Homilia para o IV Domingo do Advento - ano c
Mq 5,1-4a
Sl 79
Hb 10,5-10
Lc 1,39-45
Estamos no último Domingo do Advento e a Palavra de Deus, na ânsia de bem nos preparar para o santo Natal, apresenta-nos o Mistério de modo estupendo.
Irmãos, quando o Mistério é grande, antes, infinito, como é difícil falar dele!
Comecemos nossa meditação com a Epístola aos Hebreus que, de modo impressionante, nos desvela os sentimentos do Filho eterno do Pai no momento da Sua Encarnação: Pai, “Tu não quiseste vítima nem oferenda”, aquelas do Templo, aquelas vítimas simplesmente rituais, “mas formaste-Me um corpo”, Tu Me fizeste humano, deste-Me uma natureza humana! Não foram do Teu agrado os sacrifícios de animais irracionais, os ritos meramente formais, “por isso Eu disse: ‘Eis que Eu venho! Eu vim, ó Deus, para fazer a Tua vontade’”.
Eis o primeiro aspecto que nos é dado hoje meditar! O Filho eterno, igual ao Pai, Deus igual a Deus, Deus vindo de Deus, Luz gerada pela Luz, por puro amor, por pura obediência ao Pai que tanto nos amou, dignou-Se fazer-Se homem! Sem deixar de ser Deus verdadeiro, Ele realmente Se tornou homem verdadeiro, em tudo igual a nós, menos no pecado.
Mas, como pode? Como é possível?
Aquele que é a Luz, assumiu a escuridão humilde do seio materno;
Aquele que abarca o universo, foi abarcado pelo útero de uma Virgem;
Aquele que é a Palavra eterna do Pai, passou nove meses no silêncio da gestação!
Como pode ser?
Num mundo que se contenta com mentirinhas, com fábulas, mitos e lendas, eis uma realidade que nos deixa maravilhados! E tudo isso por amor – puro amor –, tudo isso por nós, para nossa salvação, para nos elevar!
Ele veio viver em tudo nossa aventura humana, em tudo, nossas angústias, em tudo, nossas procuras, em tudo, nosso sonho de ser felizes!
“É graças a esta vontade que somos santificados pela oferenda do corpo de Jesus Cristo, realizada uma vez por todas!”. O Filho eterno, fazendo-Se um de nós, assumindo nosso corpo, isto é, nossa humanidade, nossa história, nossas limitações, foi homem perfeito, perfeitamente dedicado ao Pai, perfeitamente obediente, perfeitamente abandonado nas mãos do Pai, e, assim, nos salvou, mereceu-nos o perdão para a humanidade que o pecado do velho Adão havia estragado!
Ó Cristo Deus, ó Cristo homem!
Bendito sejas, porque Te fizeste um de nós!
Bendito sejas, porque em tudo viveste como nós, para encher de novo sentido a nossa pobre vida, para iluminar nossas trevas, para nos mostrar o caminho, para em nosso nome seres totalmente obediente ao Pai e, assim, nos fazer também a nós, obedientes como Tu!
Bendito sejas, hoje e sempre, pelo Teu Advento, pelo mistério da Tua Encarnação!
Tu és a razão da nossa esperança,
Tu és o fundamento do nosso sorriso,
Tu és o nosso consolo,
Tu és a nossa paz!
Em Ti, Santo Emanuel, cumpriu-se a profecia de Miqueias: “Tu, Belém de Éfrata, pequenina entre os mil povoados de Judá, de ti sairá Aquele que dominará em Israel; Sua origem vem de tempos remotos, desde os dias da eternidade. Ele não recuará, apascentará com a força do Senhor e com a majestade do Nome do Senhor Seu Deus… Ele estenderá o poder até aos confins da terra, e Ele mesmo será a Paz!”
Ó Santo Messias, nossa paz, rei eterno! Bendito sejas para sempre porque vieste!
Mas, há mais, no Mistério deste IV Domingo! Além do “sim” eterno e divino do Filho que disse “ó Pai, eis que Eu venho para fazer Tua vontade”, nas montanhas da Galileia, em Nazaré, um outro “sim” ecoou: o sim de uma criaturazinha frágil, o sim apaixonado e total à proposta inaudita de Deus: “Gabriel, vai dizer Àquele que te enviou que eu sou a Serva, que se faça conforme a tua palavra!” Que mistério tão impenetrável, que inteligência alguma humana poderá compreender plenamente! O sim do Filho eterno somente realizou-se no nosso mundo graças ao sim de uma pobre Virgem de Nazaré!
Como pode o Criador depender da criatura? Que mistério tão grande o plano eterno de Deus depender de nós! A Virgem disse sim: sim total, sim sem condições, sim absoluto, sim sem reservas, sim de corpo e alma! E, depois do sim, ela correu para a região montanhosa de Judá, para ver o sinal que o anjo havia dado: a parenta idosa e estéril havia concebido!
Como a arca da aliança, contendo as tábuas da Lei, foi transportada para a região montanhosa de Judá (cf. 2Sm 6,1-8), também Maria Virgem, contendo em si Aquele que é a nova Lei, foi pressurosa para a região de Judá;
como Davi admirou-se e exclamou: “Donde me vem que a arca do meu Senhor fique em minha casa?” (2Sm 6,9),Isabel também derramou-se em júbilo admirado: “Donde me vem que a Mãe do meu Senhor venha visitar-me?”
Como a arca ficou três meses na casa de Obed-Edom (cf. 2Sm 6,11), a Virgem ficou três meses na casa de Isabel!
Que projeto admirável de Deus, que sim tão bonito da Virgem! Quanta generosidade, quanta fé, quanta entrega, quanto abandono!
Ó Virgem toda santa e toda pura! Verdadeira Arca da Aliança, dourada pelo Espírito do Senhor Deus!
Obrigado pelo teu sim, obrigado pelo sim que é eco no tempo do sim que o Filho pronunciou na eternidade!
Como poderíamos te saudar, ó Toda Santa?
Saudamos-te como a Escritura nos ensina:
saudamos-te Cheia de Graça,
saudamos-te Bendita entre as mulheres,
saudamos-te Arca da Aliança,
saudamos-te Mãe do Senhor,
saudamos-te portadora do Salvador,
saudamos-te Causa da nossa alegria,
saudamos-te Esposa do Espírito,
saudamos-te Bendita por ter acreditado!
Saudamos-te assim, Mãe de Jesus,
e toda a saudação do mundo ainda seria pouca para exprimir a grandeza do teu sim
e nossa gratidão pela tua disponibilidade!
Ensina-nos, Virgem Maria, a dizer o sim como tu disseste;
ensina-nos a tornar nossa vida disponível ao plano do Senhor;
ensina-nos a viver em nós a obediência do Filho, como tu viveste!
Mas, há ainda um terceiro aspecto do Mistério, que é necessário ponderar. É da Belém pequenina entre os mil povoados de Judá que sairia o Dominador de Israel; é de uma Virgem pobre, frágil e humilde que viria o Salvador, aquele que “estenderá o poder até aos confins da terra”. Deus é assim: onde não há vida, onde não há esperança, onde não há grandeza aos olhos do mundo, Ele faz a vida brotar, a esperança surgir, a grandeza aparecer! Não é esta uma das maiores lições do Natal? Um Deus que escolhe o caminho da fraqueza, da pobreza, da humildade, da debilidade?
Convertamo-nos ao modo de agir de Deus, tão distante dos nossos modos magalomaníacos, dos nossos projetos grandiloquentes! Para nossa vergonha e confusão, para nossa conversão, é preciso dizer sem medo:
Deus não está primeiro no que é forte, mas no que é fraco;
Deus não está antes no que é potente, mas no que não pode nada;
Deus não está na riqueza, mas na pobreza;
Deus não está em cima, mas embaixo;
Deus não está com os vencedores, mas com os vencidos;
Deus não está com os que riem pelas glórias do mundo, mas com os que choram porque se sentem sós, pisados, humilhados e triturados pela vida!
Ó Santo Messias, converte-nos pela graça do teu bendito Advento!
Converte-nos com as lições do Teu Natal!
Ajuda-nos a cantar, com a Tua Mãe Santíssima, que enches os pobres de bens, que dispersas sem nada os ricos, que exaltas os humilhados e humilhas os soberbos!
Ó Santo Messias, pelas preces da Toda Santa e de São José, seu castíssimo esposo, pelas preces de todos os santos pobres e humildes do mundo, dá-nos a graça do Teu Natal, a certeza da Tua presença e a Vida eterna. Amém.
sábado, 15 de dezembro de 2018
Homilia para o Terceiro Domingo do Advento - ano c
Sf 3,14-18a
Is 12
Fl 4,4-7
Lc 3,10-18
“Gaudete in Domino semper: iterum dico vobis, gaudete. Dominus enim prope est”. O tom da liturgia deste terceiro Domingo do Advento é a alegria. A cor rosácea, mistura do roxo do Advento com o branco do Natal, usada como opção ao roxo, sinaliza para esta exultação que perpassa toda a liturgia hodierna. “Alegrai-vos!”– diz São Paulo na segunda leitura; “Canta de alegria, rejubila, alegra-te e exulta de todo o coração” - convida o Profeta Sofonias na primeira; “Exultai cantando alegres” – exorta o Salmo de meditação.
Mas, qual o motivo de tamanha alegria?
Para um cristão, para alguém responsável, e realmente consciente, é possível alegrar-se, quando há tanta dor no mundo, tanto fracasso, tristeza, solidão e morte?
Alegrar-se num mundo assim, confuso, lânguido, demente de fé, de valores, de esperança, não seria uma insuportável falta de solidariedade, uma falta de compaixão para com quem sofre e geme?
E, no entanto, a Palavra santa insiste: Alegrai-vos! Mas, “alegrai-vos sempre no Senhor!” Eis o modo de alegrar-se, no Senhor, porque Ele pode sustentar nossa existência, Ele pode dar sentido às nossas dores e nos consolar depois da pena! E a Palavra santa prossegue: “Alegrai-vos: o Senhor está perto”. O motivo da nossa alegria é a certeza que Deus não nos abandonou, a convicção que Ele é um Deus presente e que no Seu Filho Jesus, Ele veio pessoalmente ao nosso encontro.
Então, irmãos, alegrai-vos, pois ainda que haja tantas realidades dolorosas e sombrias, o Senhor está perto com Seu amor, perto com Sua misericórdia, perto com Sua salvação. E o nome dessa salvação é Jesus!
Já no Antigo Testamento, Deus consolava o Seu Povo, sustentava-lhe a esperança, prometia-lhe uma bênção no futuro. Ele mesmo haveria de ser essa bênção, um Deus no meio de Sua gente, um Deus próximo: “O rei de Israel é o Senhor, Ele está no meio de ti, nunca mais temerás o mal. O Senhor, teu Deus, está no meio de ti, o valente guerreiro que te salva!” Israel nunca poderia imaginar que essas palavras haveriam de cumprir-se ao pé da letra. Como Deus poderia vir habitar pessoalmente no meio do Seu Povo, se Ele é o Infinito, Santo e abarca tudo quanto existe no céu e na terra? Para nós, cristãos, no entanto, de modo maravilhoso, esta promessa cumpriu-se em Jesus: Ele é o Deus-conosco, Deus entre nós, Deus para nós, Deus como nós: com nosso semblante e com nossos gestos! Ninguém poderia imaginar algo assim! A surpresa foi tanta, é tanta, que Santo Irineu exclamava, a respeito de Cristo: “Ele trouxe toda a novidade quando Se trouxe a Si mesmo!” Por isso São Paulo nos convida a que nos alegremos no Senhor; não em qualquer alegria! Somente no Senhor que Se dá a nós, a nossa alegria pode ser autêntica, porque brota da certeza que não estamos sós, que o pecado e a morte foram vencidos!
Alegrai-vos, pois, mas na alegria de saber que, mesmo com tanta dor e sofrimento no mundo, o amor e a graça de Deus triunfam em Jesus Cristo. Alegremo-nos porque o Senhor está próximo: Ele está próximo o Seu Natal, Ele está próximo no nosso cotidiano, Ele está próximo na Sua Vinda final, próximo, porque é urgente que nos decidamos por Ele, que O acolhamos, que Lhe abramos as portas do coração!
Por isso, ao lado da alegria, o Evangelho de hoje, ao apresentar-nos o ministério de João Batista, coloca-nos uma questão fundamental: “Que devemos fazer?” – é a questão de levar a sério o Cristo que vem; a questão de abrir espaço para Ele na nossa vida, a questão de decidir-se realmente por Ele! Como devemos viver para acolher Sua vinda no dia-a-dia, para bem celebrar o Seu Natal, para estar diante Dele quando vier na Sua Glória? Que devemos fazer? A resposta somente pode ser uma: convertei-vos, abri vosso coração para que o Rei da Glória possa entrar! Entrar no vosso modo de viver, entrar nas vossas opções, entrar no vosso coração, entrar em todas as dimensões da vossa existência! Não recebais em vão a graça de Deus, o dom do Cristo que nos vem sempre! Não torneis inútil a salvação que Cristo vos concedeu.
É importante observar o apelo de João, o Batista, precursor do Messias. A cada grupo de pessoas que perguntavam o que fazer, o Batista responde de modo muito concreto, indicando uma direção a partir do modo de vida e da atividade de quem perguntava e sempre relacionando com o respeito e o amor aos outros: “Quem tiver duas túnicas, dê uma a quem não tem; quem tiver comida, faça o mesmo; não cobreis mais que o estabelecido; não tomeis à força dinheiro de ninguém; não façais falsa acusação”.
Ainda hoje este é o critério para acolher Jesus: um coração em disposto à conversão. e uma conversão que passe pelo relacionamento com os irmãos, sobretudo os mais necessitados.
Pois bem: “Alegrai-vos no Senhor!” Que vossa alegria no Senhor que vem, vos faça bondosos para com todos, sem excluir ninguém, pois o Senhor a todos nos acolheu! Que vossa alegria no Senhor vos faça serenos ante os problemas e desafios do mundo e da vida! Que vossa alegria no Senhor guarde vossos corações e pensamentos em Cristo Jesus!
É isto que nos é pedido neste santo Advento! É esta a condição para um Natal verdadeiramente cristão, verdadeiramente no Senhor!
Ó Santo Emanuel, Tu que assumiste nossa humana condição, Tu que não Te envergonhaste de ser um de nós, um como nós, um conosco, acolhe nossa súplica, alegra o nosso coração com a alegria da tua chegada, a mesma que alegrou a Virgem, a José, a João no ventre materno, a mesma que fez Isabel exultar e Zacarias cantar, a mesma que alegrou os pastores e o magos...
Santo Emanuel, que nossa alegria esteja numa vida vivida na Tua presença, fazendo a Tua vontade, cumprindo o Teu mandamento!
Vem, Senhor Jesus, que precisamos de Ti! Vem e renova o nosso coração e o coração do mundo, até a Tua Vinda definitiva e final na Glória. Amém.
sábado, 8 de dezembro de 2018
Homilia para o II Domingo do Advento - ano c
Br 5,1-9
Sl 125
Fl 1,4-6.8-11
Estamos no Domingo II do Advento. Este é um tempo de espera. Um tempo a nos recordar que a humanidade toda espera, mesmo sem saber: neste mudo cansado e ferido, o coração humano espera um sentido pra vida, espera a paz, espera o amor, espera a plenitude... Para usar a linguagem da Bíblia: espera a salvação! A humanidade esperou e espera...
Também o povo de Israel esperou. Nos momentos de escuridão da sua história, Israel levantou-se e continuou o caminho, porque alicerçado na promessa do seu Deus. A primeira leitura da Missa de hoje apresenta-nos esta realidade de modo comovente: quando o Povo estava na maior escuridão do exílio de Babilônia, Deus lhe falou de esperança. Estas palavras ainda hoje nos tocam e comovem, ainda hoje são para nós: “Depõe a veste de luto, e reveste, para sempre, os adornos da glória vinda de Deus! Cobre-te com o manto da justiça que vem de Deus e põe na cabeça o diadema da glória do Eterno!” Deus promete ao Seu Povo a felicidade, a bênção, a glória – não quaisquer umas, mas aquelas que vêm de Deus! Nosso Deus foi e sempre será o Deus da promessa, o Deus que nos aponta para um futuro de bênção, que nos enche de esperança, que faz nosso coração palpitar, sonhando com a paz que ele dará!
Ora, esta esperança, esta bênção, esta paz, esta plenitude, este futuro, têm e terá sempre um nome: Jesus Cristo! Tudo se cumpre Nele, tudo se resume Nele; Nele, tudo é pleno e duradouro: Ele é o Sim de Deus para Israel e para toda a humanidade!
A salvação que a humanidade esperou e os profetas prometeram a Israel, no Evangelho deste Domingo aparece tão próxima: ela entra na história humana; não fica lá em cima, no céu; entra nas coordenadas dos nossos pobres dias: “No décimo quinto ano do império de Tibério César, quando Pôncio Pilatos era governador da Judeia, Herodes administrava a Galileia, seu irmão Filipe, as regiões da Itureia e Traconítide, e Lisânias a Abilene; quando Anás e Caifás eram sumos sacerdotes...” Nossa fé não é um mito, nossa esperança não é uma quimera: ela veio, entrou no nosso mundo, no nosso tempo, no nosso espaço, na nossa pobre vida, nos nossos dias tão pequenos: “... foi então que a Palavra de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto”. Como é belo o Advento! João anuncia que chegou o tempo, que com Aquele que vem, o próprio Deus, em pessoa, faz-Se presente: tempo de salvação, tempo decisão, tempo de acolher o convite para o Reino! Deus cumpriu e cumprirá Sua promessa, ao enviar Jesus; Deus satisfez o sonho que Ele mesmo colocara no coração humano, no nosso coração, ao nos dar Jesus. Deus é fiel!
Nunca esqueçamos: este Jesus que veio – e estamos nos preparando para celebrar o Seu santo Natal -, é o mesmo que ainda esperamos para consumar a Sua obra no Dia final. Na Epístola aos Filipenses, segunda leitura da Missa de hoje, São Paulo nos fala do Dia de Cristo – aquele Dia que começou em Belém, brilhou na Ressurreição e será pleno na Vinda final do Senhor. Deus nos prometeu este Dia bendito, no qual todas as esperanças humanas serão realizadas! O cristão vive os dias deste mundo na esperança deste bendito e eterno Dia. Por isso, o Apóstolo deseja que permaneçamos puros e sem defeito “para o Dia de Cristo, cheios do fruto da justiça que nos vem por Jesus Cristo, para a glória e louvor de Deus”. Ele confia que, no que depender do Pai celeste, nós cresceremos na obra de Deus até“à perfeição até ao Dia do Cristo Jesus”.
O Advento, portanto, é tempo de esperança, de espera, de sonho... Mas é também tempo de compromisso em nos preparar para o Senhor que vem e vem vindo sempre. É tempo de preparar os caminhos do Senhor, endireitar Suas veredas! Que todo vale de nossos pecados e baixezas seja aterrado; que as colinas do nosso orgulho, da nossa autossuficiência e prepotência sejam aplainados. Que, numa vida de conversão, vejamos a salvação de Deus... E os outros, os de fora, vejam em nós a obra desta salvação!
Não percamos tempo! A oração da Missa pedia a Deus que nenhuma atividade terrena nos impedisse de correr ao encontro do Filho que vem. Por favor, em Nome de Cristo: levantemos os olhos de nossa mediocridade, de nossas preocupações pequenas e mesquinhas! Levantai a cabeça: a vossa Salvação se aproxima! Não sejamos desatentos, a ponto de não perceber e não acolher Aquele que veio, vem vindo e virá na Glória!
Terminemos esta meditação com as palavras de um poeta pagão, mas que exprimem bem o que a Palavra de Deus, que ouvimos hoje, nos quer dizer. É um poema de Tagore:
Não ouvistes os passos silenciosos?
Ele vem vindo, vem vindo, vem vindo sempre!
A cada momento e a cada estação,
a cada dia e a cada noite,
Ele vem vindo, vem vindo, vem vindo sempre!
Várias cantigas cantei,
em vários disposições de espírito,
mas as suas notas sempre proclamaram:
Ele vem vindo, vem vindo, vem vindo sempre!
Nos dias perfumados de abril luminoso,
pelo caminho do bosque
Ele vem vindo, vem vindo, vem vindo sempre!
Na sombra chuvosa das noites de junho,
na carruagem trovejante das nuvens,
Ele vem vindo, vem vindo, vem vindo sempre!
De tristeza em tristeza,
são os Seus passos que pisam o meu coração!
E é o contato de ouro de Seus pés
que faz brilhar minha alegria!
Pois bem! Vem, Senhor Jesus, vem sempre!
Vem nas alegrias, mas vem também nas tristezas da vida!
Que saibamos discernir as Tuas vindas e os rastros de ouro que Teus pés benditos deixam na nossa vida!
Vem, Senhor, porque somos frágeis!
Vem, Senhor, porque somos pobres!
Vem, Senhor, porque muitas vezes o peso da vida é grande demais!
Vem, Senhor, porque temos medo da noite!
Vem, vem com Tua luz, ó Senhor Jesus!
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