domingo, 15 de setembro de 2019

Árvore admirável, de Fruto divino!

Ontem, a Igreja celebrou a Festa da Exaltação da Santa Cruz.

“Anunciamos Cristo crucificado” (1Cor 1,23) – afirmava São Paulo na leitura das Vésperas.

Cristo crucificado, Cristo fracassado, frágil, impotente, segundo a humana lógica; Cristo esquecido por Deus e pela humanidade, deixado só, feito homem de dores... Cristo morto até a morte por Sua fidelidade ao Pai, por Seu compromisso não com as modas de Sua época, não com os bem pensantes de plantão, mas unicamente com o Pai e o Seu Reinado, que deveria vir não segundo os modos, os tempos e a lógica dos homens, mas somente segundo o critério misterioso e oculto de Deus...

“Pregamos Cristo crucificado!” – Palavras tremendas para a Igreja de todas as épocas, porque não há outro Cristo a ser pregado (qualquer outro é falso, não é o Cristo, mas um anti-Cristo, obra de Satanás...).

E a Liturgia da Festa da Exaltação continuava, tomando as palavras do santo Apóstolo: “Escândalo para os judeus, e tolice para os gentios”... Pense bem, meu caro Irmão, porque nada mudou!
Cristo, com Sua Cruz, com Sua lógica, continua escândalo, continua tolice desprezível que não deve ser levada a sério... Sua lógica não é o sucesso, o poder, as ideias da moda, as ideologias de plantão, o que aparece nos meios de comunicação e aí faz sucesso.
Na verdade, Ele não Se deixa aprisionar nem mesmo pela lógica dos Seus discípulos! Para compreendê-Lo é necessário mesmo olhar e contemplar e sentir a Cruz do Senhor. Só ali o mistério do Crucificado deixa de ser loucura, tolice e escândalo...

“Mas para nós, chamados, judeus ou gentios, é Cristo, força e sabedoria de Deus”. Deve ser assim; deveria ser assim!
A Cruz do Senhor e o Senhor da Cruz – deveríamos ver aí a sabedoria e o poder do nosso Deus, que com força divina destroça o pecado e a morte com Seu amor até a Cruz e com sabedoria surpreendente revela a insensatez da pura lógica humana... 
Nós, cristãos, deveríamos compreender a linguagem da Cruz, inscrita no coração do mundo, no coração da história, no coração da nossa própria vida... E, no entanto, também a nós, a Cruz escandaliza e também nós tanta vez não conseguimos compreender sua lógica salvadora!

A Cruz, a Cruz!

Lembra, caro Irmão, do Paraíso? Recorda-se das duas árvores plantadas pelo Senhor Deus?
A primeira era aquela que dava ao homem o poder de ser como Deus, senhor do bem e do mal. O homem poderia decidir não simplesmente fazer o bem e o mal, mas, muito mais ainda, decidir o que é bem e o que é mal, transformar o mal em bem e o bem em mal! É a nossa tentação fundamental – e tantas vezes fazemos isto na nossa vida, quando optamos pelo mal e, disfarçadamente, chamamo-lo bem! A outra árvore era a da Vida. Atenção para esta árvore; seu sentido é profundo!

Mesmo tendo criado o homem perfeito, Deus ainda lhe daria Sua plenitude dando-lhe a Vida divina, a plenitude de uma Vida de eterna e plena bem-aventurança, aquela Vida que ainda hoje é o desejo e a saudade do nosso coração. Mas, esta Vida – como tudo na nossa existência – seria dom de Deus, não simples conquista humana, que pensa poder estender a mão e tudo pegar... O homem receberia essa Vida gratuitamente, como dom, se não tivesse tentado tomar o lugar de Deus, querendo ser senhor do bem e do mal... Mas tentou, teimou, quis, quer ser como Deus... Resultado: ao invés da Vida, a morte, o coração ferido, a vida capenga, medrosa, frágil, que experimentamos na nossa existência...

Quanto à árvore da Vida, o caminho foi fechado para que o homem não pudesse, presunçosamente, comer seu fruto – Deus fechou o caminho... E o homem procura a Vida: vai à lua, a Marte, ao fundo do mar, ao coração da matéria, vasculha as galáxias, penetra no inconsciente e nas camadas mais profundas do psiquismo e não encontra esta árvore e não pode comer do seu fruto, que lhe daria a Vida plena, beata, feliz, divina, pela qual tanta anseia, mesmo quando insiste em dizer que não a deseja...

Mas, Deus (bendita seja a Sua bondade, o Seu amor, a Sua misericórdia), livremente nos abriu o caminho para esta árvore de Vida, gratuitamente nos ofereceu o seu fruto! Quem comer dele vive da Vida divina, quem provar dele vence a Morte, quem dele se alimentar tem a Vida eterna.

Que árvore? Que fruto?

Tu, Jesus, és o Fruto de Vida eterna: quem comer de Ti viverá! E a árvore da Vida, a árvore que dá esse Fruto bendito, é a Tua cruz!
Eis o mistério que adoramos na Exaltação da Santa Cruz: a árvore da Vida é a Tua Cruz, Senhor!
Em Ti, temos a Vida, em Ti, somos saciados de eternidade, em Ti, a morte é vencida de modo definitivo!
A Ti a glória para sempre, ó Poder de Deus, ó Sabedoria do Pai, que desmoraliza o escândalo dos judeus e a tolice dos gentios!


sábado, 14 de setembro de 2019

A árvore da Vida é a Tua Cruz, ó Senhor!

Hoje, a Igreja celebra a Festa da Exaltação da Santa Cruz.
Segundo antigas crônicas eclesiásticas a Imperatriz Santa Helena, mãe de Constantino Magno, encontrou a Cruz do Senhor em 14 de setembro de 320 nas escavações do Monte Calvário em Jerusalém. No dia 13 de setembro de 355 foi solenemente consagrada a Basílica do Santo Sepulcro e, no dia seguinte, 14 de setembro, a Cruz que fora encontrada anos antes foi solenemente exposta à veneração dos fiéis. Daí por diante, todas as igrejas que posteriormente foram adquirindo uma relíquia da Cruz, neste dia expunham-na solenemente. Daí a Festa da Exaltação da Santa Cruz. A Cruz do Cristo deve perenemente recorda-nos três coisas:

(1) Até onde o homem caiu no seu desejo de ser como Deus, na sua pretensão de autossuficiência: o homem é capaz de matar Deus! Matá-Lo no seu coração, matá-Lo na sua vida pessoal e social. Ao mesmo tempo, aquele Desfigurado da Cruz é como que uma imagem do homem desfigurado no seu pecado.

(2) Mas, a Cruz nos revela também até onde Deus está disposto a ir para nos encontrar. Até onde o Senhor é capaz de descer em busca de Sua ovelha perdida: Deus amou tanto o mundo a ponto de entregar o Seu próprio Filho, o Amado, o Único! Não há sofrimento ou escuridão que sejam maior que o amor de Deus por nós! Mesmo na treva, mesmo na dor, o Senhor estará sempre presente com Seu amor.

(3) A Cruz nos revela o modo de agir de Deus. Ela é a chave para se compreender como Deus pensa, como Deus faz; e nos assusta, porque a lógica do Senhor é totalmente diversa da nossa! Na Cruz aparece claro o quanto os pensamentos do Senhor são diversos dos nossos... Neste sentido, ela é sempre um forte apelo à conversão, a que mudemos nosso modo de compreender a vida e os acontecimentos! Na Cruz, quando dizemos: “É o fim!”, Deus está dizendo: “É um novo começo!”

Uma última palavra. Recorde-se, caro Irmão, do livro do Gênesis: no paraíso havia duas árvores: a do conhecimento do bem e do mal e a árvore da Vida. O homem comeu o fruto da primeira, querendo ser como Deus, senhor do bem e do mal; assim, perdeu o fruto da segunda: foi privado da Vida plena. Nunca mais a humanidade encontrou o caminho para a árvore da Vida. Pois bem, ei-la: a árvore da Vida é a Cruz do Senhor; Ele, Jesus, é o Fruto bendito desta árvore: quem Dele comer terá a Vida eterna, Vida em abundância! E este Fruto bendito é-nos dado em cada Eucaristia! Seja louvado o Senhor por Seus desígnios maravilhosos!


Homilia para o XXIV Domingo Comum - ano c

Ex 32,7-11.13-14
Sl 50
1Tm 1,12-17
Lc 15,1-32

Na Solenidade do santo Natal, na segunda leitura da Missa da Aurora, a Igreja, olhando o Presépio, faz-nos escutar as palavras de São Paulo a Tito: “Manifestou-se a bondade de Deus nosso Salvador, e o Seu amor pelos homens. Ele salvou-nos, não por causa dos atos de justiça que tivéssemos praticado, mas por Sua misericórdia...” (Tt 3,4s). O Menino que veio viver entre nós, Jesus, nosso Senhor, é a bondade de Deus, é a Sua salvação misericordiosa...
Estas palavras são maravilhosamente ilustradas pela liturgia deste Domingo. Hoje, o Cristo nos é apresentado como a própria bondade, a própria ternura misericordiosa do Pai dos Céus, do nosso Deus.
Aquilo que já fora prefigurado por Moisés, intercedendo pelo povo pecador, na primeira leitura; aquilo que, na segunda leitura, São Paulo pregou e experimentou na própria vida: “Cristo veio ao mundo para salvar os pecadores. E eu sou o primeiro deles!” – tudo isso nós tocamos nas três parábolas da misericórdia do capítulo XV do Evangelho de São Lucas.

Sigamos a narrativa. Por que Jesus contou essas parábolas? Porque “os publicanos e pecadores aproximavam-se Delepara O escutar. Os fariseus, porém, e os escribas criticavam Jesus: ‘Este homem acolhe os pecadores e faz refeição com eles’.”
Aqui está: Jesus nosso Senhor era um fio de esperança para aqueles considerados perdidos, metidos no pecado, sem jeito nem solução... Os publicanos, as prostitutas, os ignorantes, os pequenos e desprezados, gente sem preparo e sem cultura teológica estavam aproximando-se de Jesus para escutá-Lo; viam Nele a ternura e a misericórdia de Deus. Os escribas e fariseus – homens praticantes e doutores da Lei – criticavam Jesus por isso. Ele Se misturava com os impuros, Ele acolhia a gentalha e os pecadores. Pois bem, foi para esses doutores que Jesus contou as parábolas, para mostrar-lhes que o Coração do Pai é ternura, é amor, é vida, é amplo como uma casa grande... Ora, o agir do Senhor nosso nada mais era que um reflexo, um sacramento do amor do próprio Deus de Israel, a Quem Jesus chamava de Pai: “Quem Me vê, vê o Pai; Eu estou no Pai e o Pai está em Mim! O Pai, que permanece em Mim, realiza Suas obras. Crede-Me: Eu estou no Pai e o Pai está em Mim!” (Jo 14,9.10b-11)

O Pai Se alegra, porque Jesus, o Bom Pastor, era capaz de deixar noventa e nove ovelhas para ir atrás daquela que se perdera totalmente, até encontrá-la!
O convite que Jesus estava fazendo aos escribas e fariseus era claro: “Alegrai-vos Comigo! Encontrei a Minha ovelha que estava perdida!”Alegrai-vos, porque o Coração do Pai está feliz: Ele não quer a morte do pecador, mas que se converta e tenha a Vida!
Do mesmo modo, na parábola da dracma perdida: Deus é como aquela mulher que acende a lâmpada e varre cuidadosamente a casa até encontrar sua moedinha. E não descansa até encontrá-la! Quando a encontra, como Deus, quando encontra o pecador, ela exclama: “Alegrai-vos comigo! Encontrei a moeda que havia perdido!”
O Deus que Jesus nos revela, o Deus a quem Ele chamava de Pai é assim: bom, compassivo, misericordioso, preocupado conosco e com cada um de nós, persistente, teimoso, perseverante no Seu amor por nós! Ele somente é glorificado quando estamos de pé, quando estamos bem, quando somos felizes. Mas, não há felicidade verdadeira para nós, a não ser juntinho Dele, que é o Pai de Jesus e nosso Pai. É isso que Jesus inculca com a terceira parábola, a mais bela de todas: o Pai e os dois filhos.

“Um homem tinha dois filhos”. Este homem é o Pai dos Céus. “O filho mais novo disse ao pai: ‘Dá-me a parte da herança que me cabe’”. Esse moço quer ser feliz, deseja ser livre, autônomo e imagina que somente vai sê-lo longe do olhar do pai. Assim, sem juízo, como que mata o pai, pedindo-lhe logo a herança. “e partiu para um lugar distante”. Quanto mais longe do pai, melhor, mais livre! E aí, dissipa tudo, numa terra pagã, longe do pai, longe de Deus. E termina na miséria, tendo esbanjado a vida, a felicidade, o futuro, o amor e o sexo... Vai pedir trabalho e dão-lhe o mais vergonhoso para um judeu: cuidar de porcos, animais impuros. E ele queria comer a lavagem dos porcos e não lha davam!
Em que deu o sonho de autonomia, de liberdade, de felicidade longe do pai! Tudo não passara de ilusão!
Mas, apesar de louco, o jovem era sincero: caiu em si, reconheceu que pecara. Não colocou a culpa no pai, nos outros, no mundo, no destino. Reconheceu-se culpado e recordou e confiou no amor do pai: “Vou voltar para meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti!” E volta! O jovem era corajoso, generoso, era sincero!
O que ele não sabia é o pai nunca o esquecera; esperava-o todos os dias, olhando ao longo do caminho. De longe, o avistou e o reconheceu, apesar da miséria e da fome e das roupas maltrapilhas. E, cheio de compaixão – como o Coração do Pai de Jesus – correu ao encontro do filho, cobriu-o de beijos e de vida, e restituiu-lhe a dignidade de filial. E deu uma festa!
O Pai é assim: não quer ninguém fora de Sua casa, de Seu coração, da festa do Seu amor, do banquete de Sua Eucaristia!

Mas, havia ainda o filho mais velho. Este, como os escribas e os fariseus, jamais havia desobedecido ao pai; cumprira todos os seus preceitos, os mandamentos da Lei. Por isso, ficou com raiva e não quis entrar na festa do pai: “O pai, saindo, insistia com ele...”
Notai que o mesmo pai que saíra ao encontro do filho mais novo, saiu agora ao encontro do mais velho, que estava perdido no seu egoísmo, na sua raiva, fora da festa e do aconchego do pai!
E o mais velho passou-lhe na cara: “Eu trabalho para ti há tantos anos e tu nunca me deste um cabrito para eu festejar com meus amigos...” O pai respondeu: “Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu...”
É que aquele filho nunca amara o pai de verdade: cumpria tudo, de tudo fazendo conta e, um dia, iria pedir o pagamento, a recompensa por tudo... Por isso nunca se sentira íntimo do pai, por isso não sentira que tudo quanto era do pai era dele também! Atenção, irmãos, que se pode estar junto do pai e nunca o conhecê-lo de verdade! Não era esta a situação daqueles escribas e fariseus?
Interessante que Jesus não diz se o filho entrou na festa do pai e na alegria do irmão ou se, ao contrário, ficou fora, onde somente há choro e ranger de dentes.

Pois bem, o Senhor nos convida hoje a acolher no Cristo Jesus a misericórdia incansável de Deus para conosco, um Deus que não sossega até nos encontrar... Mas, nos convida também a ser misericordioso para com os outros.
É triste quando experimentamos que somos pecadores, experimentamos a bondade acolhedora de Deus para com nossos pecados e, depois, somos duros, insensíveis e exigentes em relação aos irmãos.
Que o Senhor nos dê um coração como o Coração de Cristo, imagem fidelíssima, sacramental, do Coração do Pai, capaz de acolher o perdão e a misericórdia de Deus e transbordar esse perdão e essa misericórdia para com os outros. Amém.


sexta-feira, 13 de setembro de 2019

O grande Mistério da Piedade

São Paulo Apóstolo, falando do Cristo Jesus, nosso único Senhor e Salvador:

"Grande é o Mistério da piedade:

Ele foi manifestado na carne,
(isto é, fez-Se homem)

justificado no Espírito,
(isto é, ressuscitado pelo Pai na potência do Espírito Santo)

aparecido aos anjos,
(isto é, os anjos, certamente maravilhados, contemplaram, surpresos, o tremendo Mistério: o Filho feito homem, agora crucificado e, como homem, ressuscitado em Glória)

proclamado às nações,
(isto é, o que os anjos contemplaram e acolhendo, humildemente, foram salvos, agora deverá ser proclamado e anunciado a todos os povos; a Igreja não poderá sossegar enquanto não anunciar a todos os homens o Evangelho da salvação e da graça)

crido no mundo,
(isto é, acolhido já pelo Resto de Israel, que é a Igreja, será também acolhido por todos aqueles inscritos no Livro da Vida),

exaltado na Glória,”
(isto é, o homem Jesus, feito Cristo, não somente ressuscitou glorioso, mas tornou-Se Senhor de todas as coisas no Céu e na terra e de toda a humanidade. Ele tem toda a autoridade sobre toda criatura, sobre vivos e mortos, sobre todas as coisas (1Tm 3,16).

Irmão, Irmã,
esta é a nossa fé!
Disto nunca duvidemos,
mais que isto jamais desejemos,
menos que isto em hipótese alguma aceitemos!

Esta é a fé que recebemos!
É este o Evangelho,
é esta a Verdade,
é nisto que tudo o mais deve ser lido, avaliado, julgado, interpretado, discernido como bom ou mal, verdadeiro ou falso, caminho de salvação ou de condenação!

Nesta fé perseveremos,
por esta fé demos a vida
e nesta fé seremos salvos neste mundo e no Mundo que há de vir! Amém.


quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Um Ocidente sem Deus

Basta olhar com atenção... Os sintomas estão em toda parte: o mundo ocidental não aceita o cristianismo; tornou-se uma civilização ateia, que julga a religião como fonte de alienação e atraso. Para os bem-pensantes da atualidade, é inaceitável que o homem precise de Deus para organizar sua vida e discernir o que é certo ou errado, bem ou mal. Valem, para esse pessoal, as palavras de Nietzsche: “Deus morreu! Deus está morto! E nós é que O matamos! Tudo o que havia de mais sagrado e de mais poderoso no mundo esvai-se em sangue sob o peso do nosso punhal... Não vos parece grande demais essa ação? Não deveríamos nós mesmos nos tornar deuses, para pelo menos nos tornar dignos dela?” E, no entanto, muito mais que o filósofo prepotente, vale-nos a sabedoria da Palavra de Deus: "Os pensamentos dos mortais são tímidos e falíveis os nossos raciocínios. A custo conjecturamos o terrestre, com trabalho encontramos o que está à mão: mas quem rastreará o que há nos Céus?" (Sb 9,14.16)

Eis: a civilização ocidental, nascida no regaço da Mãe católica, alimentada com o leite do cristianismo, agora renega o Cristo e Sua Igreja. Pagará caro: o desprezo por sua matriz levará o Velho Continente à velhice cultural, à falta de identidade, à perda de tantas conquistas inspiradas também no cristianismo, como o respeito pela pessoa, o apreço à liberdade, o profundo sentido de solidariedade, a democracia, tudo isto, cedo ou tarde, desmoronará. A nossa civilização está se matando na loucura do imanentismo que renega toda Transcendência e na hipocrisia do politicamente correto, a serviço de uma ideologia sem Deus. Mas, quando o homem mata Deus, ele se mata também!

Os cristãos não devem ter medo de professar sua fé, de proclamar a moral e as exigências do Evangelho. Não devemos ter medo da pecha de obscurantistas, intolerantes ou anacrônicos...
Nosso critério é Cristo,
nossa Verdade é Cristo,
nossa Esperança é Cristo,
nossa Certeza é Cristo
e Cristo tal qual é crido, adorado, anunciado e testemunhado pela Igreja católica nestes vinte e um séculos, século após século, sem interrupção.
Não reconhecemos outro e de outro não queremos saber!

O diálogo com o mundo tem um só nome: amor! Amar é dizer a verdade, anunciar a verdade, sem meios termos nem meias medidas, com respeito, com compreensão, mas sem medos nem complexos.
A Verdade é Cristo e Cristo total, que nos convida à conversão. “Se não vos converterdes, perecereis todos!” (Lc 13,3.5). Não podemos converter Cristo ao homem. É o homem quem deve converter-se ao Senhor.
Que se converta a Cristo nosso Deus a sociedade atual, o homem do século XXI.


terça-feira, 3 de setembro de 2019

Homilia para o XXIII Domingo Comum - ano c

Sb 9,13-18
Sl 89
Fm 9b-10.12-17
Lc 14,25-33


O “naquele tempo” do Evangelho que escutamos, prolonga-se neste tempo que se chama hoje. “Naquele tempo, grandes multidões acompanhavam Jesus”. Eram muitos os que O admiravam, muitos os que O escutavam, como hoje.
Mas, Jesus voltando-Se, lhes disse – e diz aos que O querem acompanhar hoje -, com toda franqueza, quais as condições para serem aceitos como Seus discípulos: “Se alguém vem a Mim, mas não se desapega e seu pai e sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas irmãs e até da sua própria vida, não pode ser Meu discípulo. Quem não carrega sua cruz e não caminha atrás de Mim, não pode ser Meu discípulo”. É impressionante a sinceridade do Senhor nosso! 
É tão escandaloso para os ouvidos politicamente corretos e almofadinhas do mundo atual, mas, olhemos bem que não são todos os que podem ser discípulos do Cristo Jesus! É certo que todos são chamados, pois “o desejo de Deus é que todos se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” (1Tm 2,4), mas também é certo que nem todos estão dispostos a escutar de verdade o convite do Senhor e a aceitar Suas exigências. E Jesus, nosso Senhor, é claríssimo: Ele somente aceita como discípulo – somente pode ser Seu discípulo – quem se dispõe, com sinceridade, a caminhar atrás Dele, seguindo os Seus passos no caminho! É Ele quem dá as cartas, é Ele quem dita as normas, é Ele quem mostra o caminho e quem diz o que é certo e o que é errado! Que palavra tão difícil para cada um de nós, para o mundo atual, que se julga maduro e sábio o bastante para fazer seu próprio caminho e até para julgar os caminhos de Deus! Quem assim age, permanecendo fechado em si mesmo - diz Jesus, o nosso Deus Salvador -, “não pode ser Meu discípulo!”

E o que é ser discípulo? É colocar-se no caminho Dele, é renunciar a decidir por si mesmo que rumo dar à sua vida, para seguir o caminho do Mestre, colocando os pés nos Seus passos; ser discípulo é se renunciar a si próprio para ser em Jesus, pensando como Ele, vivendo como Ele, agindo como Ele... Ser discípulo é fazer de Jesus Cristo o tudo, o fundamento da própria existência: “Qualquer um de vós, se não renunciar a tudo que tem,a tudo que é, à sua própria segurança, ao seu próprio modo de pensar,não pode ser Meu discípulo!”

É preciso que compreendamos que esta exigência tão radical do Senhor não é por capricho, não é arbitrária, não é humilhante ou desumana para nós. O Senhor é tão exigente porque nos quer libertar de nós mesmos, de nosso horizonte fechado e limitado à nossa própria razão, ao nosso próprio modo de ver e pensar as coisas e o mundo. O Senhor nos quer libertar da ilusão de que somos autossuficientes e sábios, de que somos deuses! Como têm razão, as palavras do Livro da Sabedoria: “Qual é o homem que pode conhecer os desígnios de Deus? Ou quem pode imaginar o desígnio do Senhor? Quem, portanto, investigará o que há nos céus?” O homem, sozinho, é incapaz de compreender o mistério da vida, que somente é conhecido pelo Coração de Deus! Isto valia para ontem, e continua valendo para hoje e valerá ainda para amanhã, mesmo com todo o desenvolvimento da ciência, com toda a pressão do politicamente correto e com toda a ilusão de que nos bastamos a nós mesmos e podemos por nós mesmos decidir o que é certo e o que é errado. O homem, fechado em si mesmo, jamais poderá compreender de verdade o mistério de sua existência e o sentido profundo da realidade. É preciso ter a coragem de abrir-se, de ser discípulo, de seguir aquele que veio do Pai para ser nosso Caminho, nossa Verdade e nossa Vida! “Na verdade, os pensamentos dos mortais são tímidos e nossas reflexões, incertas... Mal podemos conhecer o que há na terra e, com muito custo compreendemos o que está ao alcance de nossas mãos”. É por isso que o Salmista hoje nos faz pedir com humildade: “Ensinai-nos a contar os nossos dias, e dai ao nosso coração sabedoria!”

Só quando nos renunciarmos, só quando colocarmos o Senhor como o centro de nossa vida, do nosso modo de pensar e de agir, somente quando Ele for realmente o nosso Tudo, seremos discípulos de verdade. Então mudaremos de vida, de valores, de modo de agir. É o que São Paulo propõe a Filêmon, cristão, proprietário do escravo Onésimo. O Apóstolo recorda ao rico Filêmon que ser discípulo de Cristo comporta exigências e mudança de mentalidade: o escravo deve agora ser tratado como irmão no Senhor. Não podemos ser cristãos, apegados à nossa lógica e às coisas próprias do homem velho! Não podemos ser cristãos fazendo política como o mundo faz, tendo uma vida sexual como o mundo tem, pensando em questões como a homossexualidade, o divórcio, o aborto, o adultério como o mundo pensa, não podemos ser cristãos comportando-nos como o mundo se comporta e fazendo o que o mundo faz! Querer seguir o Senhor sem deixar-se, sem colocá-Lo como eixo e prumo da vida, é como construir uma torre sem dinheiro: não se chegará ao fim; é como ir para uma guerra sem exército suficiente: seremos derrotados! “Do mesmo modo, portanto, qualquer um de vós, se não renunciar a tudo que tem, não pode ser Meu discípulo!”

Que o mundo não compreenda esta linguagem, é de se esperar... Afinal, o homem psíquico – homem entregue somente à sua própria razão – não pode mesmo compreender as coisas do Espírito de Deus (cf. 1Cor 2,14). O triste mesmo é que os cristãos, isto é, nós, tenhamos a pretensão de ser discípulos sem procurar sinceramente nos renunciar, mortificando nossas tendências desordenadas, educando nossos instintos desatinados e deixando que a luz do Evangelho ilumine nossa razão e nosso modo de pensar... Triste mesmo é ver tantos cristãos na ilusão de que podemos ser de Cristo procurando aplausos e compreensão e elogio do mundo! Nada feito: “A linguagem da Cruz é loucura para aqueles que se perdem, mas para aqueles que se salvam, para nós, é poder de Deus” (1Cor 1,18). Esta sentença não tem apelo! 

Cuidemos bem, para que, no fim de tudo, o nosso cristianismo não seja inacabado, tão inútil quanto uma torre deixada pela metade ou uma guerra na qual a derrota é certa. Que nos valha a misericórdia de nosso Senhor e nos ajude a viver da sua Palavra, porque, como disse hoje o Autor sagrado, dirigindo-se a Deus, “só assim se tornaram retos os caminhos dos que estão na terra e os homens aprenderam o que Te agrada, e pela Sabedoria foram salvos”. Que nos salve o Cristo, Sabedoria de Deus e Poder de Deus (cf. 1Cor 1,24). Amém.


domingo, 1 de setembro de 2019

Crise de fé, resposta na fé

Crise de fé. Dela se fala tanto hoje, sobretudo no interior da Igreja.

Sejamos sinceros: com a secularização generalizada e globalizada, com a intrusão das ideologias no âmago mesmo da fé cristã, com a fartura invasiva e tentadora dos bens de consumo que cegam nosso coração para o Infinito, para o que não se vê, para o Eterno, com a ilusão de que o homem se basta a si mesmo e sua cultura e sua subjetividade são o critério do certo e do errado, do bem de do mal – velha tentação da antiga Serpente, que é o Diabo e Satanás -, torna-se cada vez mais difícil crer de verdade, de modo límpido, simples, transparente, também dentro da Igreja, no meio dos cristãos.
Parece que, para muitos, dentro mesmo da Igreja, o critério já não é o Cristo, mas o mundo, já não é o Evangelho, mas as ideologias, já não é a Tradição apostólica, mas as opiniões humanas...

Ora, crer cristãmente não é professar teoricamente o cristianismo, mas primeiro que tudo, ser encontrado existencialmente por Jesus, nosso Senhor, ter Dele uma experiência viva, amorosa, transformadora, contagiante. Não falo primeiramente em contagiante no sentido de contagiar outros, mas primeiramente contagiante no sentido de contagiar todos os aspectos da nossa própria vida: tudo é colocado debaixo do senhorio de Cristo, tudo é vivido Nele e por Ele, de modo que Ele seja o critério do certo e do errado, do bem e do mal, do luminoso e do tenebroso, da vida e da morte. Só alguém contagiado assim pode contagiar outros, pode convencer, arrastar outros, porque se torna uma testemunha viva de Jesus, o Cristo.

E aqui, precisamente, está o problema, o nascedouro da crise de fé: tantos e tantos na Igreja já não creem de verdade! Professam uma fé como ideologia, falam o tempo todo num tal de “reino”, nuns “valores do reino” que, na verdade, são os ditames do politicamente correto e de certos modismos ideológicos do mundo de hoje. Chega desse “reino”, chega desses “valores”!

Crer é aderir a Jesus nosso Senhor, Aquele anunciado e testemunhado no Novo Testamento, Aquele pelo qual os Apóstolos deram a vida, Aquele que os santos de todos os tempos amaram profundamente e Dele fizeram o sentido de suas vidas; crer de verdade no Senhor Jesus Cristo é amá-Lo, servi-Lo, adorá-Lo, permanecer encantado por Ele, na escuta de Sua santa Palavra e do palpitar do Seu Coração. Quando vivemos assim, então, experimentamos em nós, no íntimo da nossa vida e das nossas atitudes e atividades, o Reino (com R maiúsculo) que Ele trouxe na Sua santa Pessoa, o Reinado do Pai, que é amor, justiça, verdade, paz, doação, comunhão, vida e ressurreição...
O Reino de Deus é o Pai de Jesus Cristo reinando em nós, em mim, como reinou em Jesus e por Jesus; o Reino somente vem a nós na potência do Espírito Santo do Cristo Jesus, pois sem Ele ninguém jamais conseguirá deixar efetivamente que Deus reine nas nossas estruturas pessoais ou nas estruturas da sociedade, âmbito da nossa convivência e das nossas relações.

Ora, crer, então, é deixar que Deus reine na nossa vida! É o diametralmente oposto a dizer e pensar que a vida é minha e eu faço dela o que quero! Deixar o Reino acontecer é dizer, como Santa Teresa, por amor de Jesus e ardendo nele: “Vossa sou, por Vós nasci; que quereis fazer de mim?”

Acolher, viver, testemunhar e anunciar o Reino é missão perene da Igreja. Mas, atenção: acolhe-se o Reino acolhendo-se Jesus Cristo como único e suficiente e total e absoluto Salvador da humanidade e de toda a criação, vive-se o Reino vivendo-se Jesus nosso Senhor, testemunha-se o Reino testemunhando-se Jesus como único Caminho, Verdade e Vida do mundo, anuncia-se o Reino anunciando-se Jesus, o Cristo de Deus, o Redentor do universo. Mais uma vez: o Reino é Jesus Cristo presente em nós e no mundo pela bendita potência do Seu Santo Espírito; tanto que uma antiga variante do Pai-Nosso segundo Lucas, pedia, no lugar do tradicional “Venha o Teu Reino”, “Venha o Teu Espírito”! Não tenha dúvida, meu Leitor: os dois pedidos se equivalem plenamente! Deus reina onde há abertura ao Espírito que Jesus Cristo nos dá; sem o Espírito não há nem pode haver manifestação do Reino de Deus!

Senhor Jesus Cristo,
Tu és a Imagem plena e definitiva do Deus invisível!
Tu és a única Salvação da humanidade,
Só Tu és o Santo, só Tu és o Senhor, só Tu és o Altíssimo!

Tu és o único Caminho de salvação para a humanidade
E todos aqueles que vieram, vêm e virão fora de Ti “são ladrões e assaltantes” (Jo 10,8)!

Senhor Jesus Cristo, Filho de Deu, somente em Ti cremos,
Somente em Ti esperamos,
Somente na Tua luz colocamos os nossos passos!

Nosso compromisso não é com ideias ou ideologias,
Mas somente Contigo, com a Tua adorável e bendita Pessoa!
Tu és o nosso Deus, Tu és o nosso Salvador,
A Ti aderimos com toda a nossa existência e de todo o nosso coração nesta vida e por toda a eternidade,
Ó nosso Deus, bendito e eterno com o Pai e o Santo Espírito
Pelos séculos dos séculos. Amém.