Tantas vezes já escutamos falar do sangue de Jesus e do seu poder salvador!
A Primeira Epístola de São João afirma claramente que “o sangue de Jesus nos purifica de todo pecado” (1,7) e a Primeira Epístola de São Pedro ensina, cheia de convicção, que “fostes resgatados da vida fútil que herdastes dos vossos pais pelo sangue de Cristo, com de um cordeiro sem defeitos” (1,19). Em suma, é doutrina do Novo Testamento todo, é fé da Igreja que pelo sangue de Cristo fomos salvos e libertos. Saudando o Cristo morto e ressuscitado, o Apocalipse assim se exprime: “Foste imolado e, por Teu sangue, resgataste para Deus homens de toda tribo, língua, povo e nação” (5,9).
Mas, por que esta verdadeira fixação no sangue? Por que a sua importância? Não parece algo mágico, que um líquido biológico possa salvar, dando vida à humanidade? Não estamos diante de algo repulsivo à razão humana, algo meio ridículo e primitivo, próprio de uma religião tribal, inaceitável e incompreensível para nós hoje? Não estaríamos ainda às voltas com a imagem de um deus sádico, mau, vingativo, que provoca o sofrimento e somente se compraz e se sacia com sangue, com vingança?
São perguntas sérias, que podem colocar em xeque a seriedade do cristianismo...
Para compreendermos tudo isto, é necessário primeiro entender o que significa o sangue na Sagrada Escritura, de modo particular no Antigo Testamento. O Pentateuco explica: “A vida da carne está no sangue. E este sangue Eu vo-lo tenho dado para fazer o rito de expiação sobre o altar, pelas vossas vidas; pois é o sangue que faz expiação pela vida” (Lv 17,11). Compreendamos: Deus é vida e a vida do homem é estar em comunhão com Deus, aberto a Ele, amando-O e buscando na vida concreta a Sua santa vontade. Quando o homem peca, rebela-se contra Deus, fecha-se para Ele. Na raiz de todo pecado está a ilusão de que a vida é nossa e podemos fazer dela aquilo que bem quisermos. Ora, quando o homem peca, afastando-se de Deus, ele perde o sentido da vida, perde a Vida, cai numa situação de morte. Claro que, aqui, não se trata de uma morte física, mas da morte da alma, morte porque a vida perde o sentido e, passando pela morte física, pode resultar na Morte eterna, que é a perda de Deus para sempre, ou seja, o inferno.
Por isso mesmo, nos ritos do antigo Israel, o pecado somente poderia ser remido com um sacrifício no qual o sangue (a vida) da vítima fosse derramado: “Segundo a Lei, quase todas as coisas se purificam com sangue; e sem efusão de sangue não há remissão” (Hb 9,22). E o autor sagrado afirma também: “Nem mesmo a primeira aliança foi inaugurada sem efusão de sangue” (Hb 9,18). Quando o pecador oferecia um animal como vítima pelo pecado, estava reconhecendo (1) o seu pecado, (2) o senhorio absoluto de Deus sobre toda a sua vida, (3) e que seu pecado leva a uma situação de morte, representada na morte da vítima, que tinha seu sangue derramado. É como se a vítima substituísse o pecador que, pecando, afastou-se do Deus vivo e vivificante, e aproximou-se da morte. Podemos afirmar, então, que o sangue derramado significa a vida doada, a vida perdida, a vida tirada... Não esqueçamos: “A vida da carne (a vida de todo ser vivente) está no sangue” (Lv 17,11): perder este é perder aquela!
Mas, há um problema sério com esses sacrifícios: os animais oferecidos como vítimas não tinham nenhuma consciência do que estava acontecendo, não podiam oferecer sua própria vida como um ato livre de amor e louvor a Deus. Eles apenas representavam o pecador e eram oferecidos no lugar dele. Por isso, a Escritura constata que “é impossível que o sangue de touros e bodes elimine os pecados” (Hb 10,4).
Agora, vamos a Jesus. Toda a Sua vida, desde momento da Encarnação, foi um ato de amor e obediência ao Pai em nosso favor: “Tu não quiseste sacrifício e oferenda. Tu, porém, formaste-Me um corpo. Holocausto e sacrifício pelo pecado não foram do Teu agrado. Por isso Eu digo: Eis-Me aqui! Eu vim, ó Deus, para fazer a Tua vontade!” (Hb 10,5-7).
O Filho eterno fez-Se homem para gastar toda a Sua vida fazendo a vontade do Pai. E esta vontade é salvar a humanidade, dando-lhe a Vida eterna (cf. Jo 6,37-39). Assim, Jesus nosso Senhor foi derramando a Sua vida, num amor infinito ao Pai por nós: na pobreza de Belém, na vida miúda de Nazaré, nas andanças pelas estradas da Galileia, nas curas, ensinamentos, nas contradições, nas noites inteiras em oração ao Pai... Jesus foi Se dando, Se gastando, como uma vida vivida para Deus em benefício da humanidade. Esta doação de toda uma existência, chegou ao máximo na Cruz. O sangue que Ele iria derramar até a morte nada mais é que o símbolo de uma vida – a vida do Filho de Deus feito homem – entregue em favor da humanidade! O sangue derramado significa, então, a vida dada amorosamente em nosso favor, como vítima de reparação pelo nosso pecado. Porque o homem pecou e caiu numa triste situação de perdição, de desencontro, desaprumo e morte, o Filho de Deus deu Sua vida até a morte para da morte nos arrancar: Isto é o Meu sangue, o sangue da Aliança, que é derramado por muitos para a remissão dos pecados” (Mt 26,28).
Cristo Jesus, dando a Sua vida em total obediência amorosa ao Pai por nós, apaga o nosso pecado, restitui-nos a Vida e faz de nós um povo nascido de uma nova Aliança com Deus no Seu sangue. Dizer que o sangue de Cristo nos salva é dizer que Sua vida dada em obediência amorosa ao Pai nos alcançou a salvação: “Eis que Eu vim, ó Deus, para fazer a Tua vontade. – é graças a esta vontade que nós somos santificados pela oferenda do corpo de Jesus Cristo” (Hb 10,8.10).
Olhar o sangue de Jesus, ser banhado no sangue de Jesus, beber o sangue de Jesus, significa unir-se a Jesus, fazendo da nossa vida uma participação na Sua entrega de toda a existência ao Pai. Por isso mesmo são Pedro que nós participamos da “bênção da aspersão do Seu sangue” (1Pd 1,2).
Então, olhemos o Cristo que Se gastou, que Se derramou amorosamente a vida toda até a Cruz; sejamos-Lhe gratos porque Seu sangue, Sua vida derramado por amor nos salvou.
Como cristãos, somos unidos a Ele pelo Batismo e a Eucaristia, para fazer de nossa vida uma entrega com Ele, por Ele e como Ele. Assim viveremos uma vida nova já agora, vida liberta da morte e que será ressurreição para a Vida eterna. “Àquele que nos ama, e que nos lavou de nossos pecados com o Seu sangue, e fez de nós uma Realeza e Sacerdotes para Deus, Seu Pai, a Ele pertencem a glória e o domínio pelos séculos dos séculos. Amém. (Ap 1,5s).
Que beleza! Que lindo ser de Cristo! Que lindo ser católico!
ResponderExcluirExcelente reflexão
ResponderExcluirExcelente essa leitura,nos transmite paz e nos faz refletir sobre nossos pecados , amei
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