Estamos
às portas do Santo Natal. Eis o que vamos contemplar nos ritos, palavras e
gestos da sagrada liturgia: o Verbo eterno do Pai, o Filho imenso, infinito, existente
antes dos séculos, fez-Se homem, fez-Se criatura, fez-Se pequeno e veio habitar
entre nós. Sua vinda ao mundo salvou o mundo, elevou toda a natureza, toda a
criação. Mas, atenção: a Palavra de Deus hoje nos diz que este acontecimento
imenso, fundamental para a humanidade e para toda a criação, passou pela vida
simples e humilde de um jovem carpinteiro e de uma pobre menina-moça prometida
em casamento numa aldeia perdida e pobre das montanhas da Galileia. O Deus
infinito dobrou-Se, inclinou-Se amorosamente sobre a pequena e pobre realidade
humana para aí fazer irromper o Seu plano de amor! Acompanhemos piedosamente o
Evangelho deste Quarto Domingo do Advento.
São
Mateus diz que a Mãe de Jesus “estava
prometida em casamento a José, e, antes de viverem juntos ela ficou grávida
pela ação do Espírito Santo”. As palavras usadas pelo Evangelista são
simples, mas escondem uma realidade imensa, misteriosa, inaudita. Pensemos em
José e Maria, ainda jovens. Eles certamente se amavam; como todo casal piedoso
daquela época pensavam em ter filhos – os filhos eram considerados uma bênção
de Deus. Mas, eis que antes de viverem juntos, a Virgem se acha grávida por
obra do Espírito Santo! Deus entra silenciosamente na vida daquele casalzinho.
Nós sabemos, pelo Evangelho de São Lucas, que Maria disse “sim”, que Maria
acreditou, que Maria deixou que Deus fosse Deus em sua vida: “Eu sou a serva do Senhor! Faça-se em mim
segundo a tua palavra!” (Lc 1,38) De repente, eis que uma vida de família,
que tinha tudo para ser pacata e serena, viu-se agitada por uma tempestade! Por
um lado, a Virgem diz “sim” a Deus e, sem saber o que explicar ou como explicar
ao noivo, cala-se, abandonando-se confiantemente nas mãos do Senhor. Por outro
lado, José sabe que o aquele filho não é seu; não compreende como Maria poderia
ter feito tal coisa com ele: ser-lhe infiel... E, no entanto, não ousa difamar
a noiva. Resolve deixá-la secretamente. Quanta dor, quanta dúvida, quanto
silêncio: silêncio de Maria, que não tem o que dizer nem como explicar;
silêncio de José que, na dor, não sabe o que perguntar à noiva; silêncio de
Deus que, pacientemente, vai tecendo a Sua história de salvação na nossa pobre
história humana. E, então, como fizera antes com a Virgem, Deus agora dirige Sua
palavra a José: “José, filho de Davi, não
tenhas medo de receber Maria como tua esposa, porque ela concebeu pela ação do
Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, e tu Lhe darás o nome de Jesus, pois
Ele vai salvar o Seu povo de seus pecados”. Atenção aos detalhes! O Anjo
chama José de “filho de Davi”. É pelo humilde carpinteiro que Jesus será
descendente de Davi. Se José dissesse “não”, Jesus não poderia ser o Messias,
Filho de Davi! Note-se que é José quem deve dar o nome ao Menino,
reconhecendo-o como seu filho. Note-se ainda o nome do Menino: Jesus, isto é,
“o Senhor salva”! Deus, humildemente, revela Seu plano a José e, depois de
pedir o “sim” de Maria, suplica e espera o “sim” de José. E, como Maria, José
crê, José se abre para Deus em sua vida, José mostra-se disposto a abandonar
seus planos para abraçar os de Deus, José diz “sim”: “Quando acordou, José fez conforme o Anjo do Senhor havia mandado, e
aceitou sua esposa!”
Eis!
Adeus, para aquele casal, ao sonho de uma vida tranquila! Adeus aos filhos
nascidos da união dos dois! Agora, iriam viver somente para Aquele Presente que
o Senhor lhes havia dado, para a Missão que lhes tinha confiado... O plano de
Deus passa pela vida humilde daquele casal. Para que São Paulo pudesse dizer
hoje na Epístola aos Romanos que é “apóstolo
por vocação, escolhido para o Evangelho... que diz respeito ao Filho de
Deus, descendente de Davi segundo a
carne”, foi necessária a coragem generosa da Virgem Maria e o sim pobre e
cheio de solicitude do jovem José. Para que a profecia de Isaías, que ouvimos
na primeira leitura, fosse concretizada, foi necessário que aquele jovem casal
enxergasse Deus e seu plano de amor nas vicissitudes de sua vida humilde e
pobre!
Também
conosco é assim! O Senhor está presente no mundo. O que veio pela Sua bendita
Encarnação, nunca mais nos deixou. Na potência do Seu Espírito Santo, Ele Se
faz presente nos irmãos, nos acontecimentos, na Sua Palavra e, sobretudo nos sacramentos.
Sabemos reconhecê-Lo? Abrimo-nos aos Seus apelos? E na nossa vida: essa vida
miúda, como a de José e Maria, será que reconhecemos que ela é cheia da
presença e dos apelos do Senhor? No Advento, a Igreja não se cansa de repetir o
apelo de Isaías profeta: “Céus, deixai
cair o orvalho; nuvens, chovei o Justo; abra-se a terra e brote a Salvador!”
(Is 45,8). É interessante este apelo: a salvação choverá do céu, vem de
Deus, é dom, é graça... Mas, por outro lado, ela brota da terra, da terra deste
mundo ferido e cansado, da terra da nossa vida miúda e, por vezes, ressequida e
sem graça...
Supliquemos
à Virgem Maria e a São José que intercedam por nós, para que sejamos atentos em
reconhecer o Senhor nas estradas de nossa existência e generosos em
corresponder aos Seus apelos, como o sagrado casal de Nazaré. Assim fazendo e
assim vivendo, experimentaremos aquilo que o Carpinteiro e sua santa Esposa
experimentaram: a presença de Jesus no dia-a-dia humilde de nossa vida.
Bom dia Dom Henrique...
ResponderExcluir"Eis! Adeus, para aquele casal, ao sonho de uma vida tranquila! Adeus aos filhos nascidos da união dos dois! Agora, iriam viver somente para Aquele Presente que o Senhor lhes havia dado, para a Missão que lhes tinha confiado... O plano de Deus passa pela vida humilde daquele casal. Para que São Paulo pudesse dizer hoje na Epístola aos Romanos que é “apóstolo por vocação, escolhido para o Evangelho... que diz respeito ao Filho de Deus, descendente de Davi segundo a carne”, foi necessária a coragem generosa da Virgem Maria e o sim pobre e cheio de solicitude do jovem José".
"De repente, eis que uma vida de família, que tinha tudo para ser pacata e serena, viu-se agitada por uma tempestade!"
Responsabilidade que ambos aceitaram, cumpriram, com muita dignidade...
Nem preciso dizer que chorei mesmo lendo estas palavras aqui repetidas por mim no corpo do comentário... É tão tão tão absurdamente difícil entender os desígnios de Deus...
Que o Sim humilde de Maria, o Sim silencioso de José, nos inspire nesse Natal.
Pax hominibus bonae voluntatis
=)